Não deixou de ser uma surpresa, quando, no início do ano, Pedro Pena Bastos, um dos mais mediáticos chefs portugueses, jurado do Master Chef e, à altura, responsável pelo estrelado restaurante Cura, anunciou a saída do trabalho no espaço do Ritz para participar de um novo projeto. De alguns meses para cá, o novo projeto foi semeado, regado e, desde setembro - com o perdão do trocadilho - transformou-se no restaurante Broto, situado no número 20A do Largo Rafael Bordalo Pinheiro, plena Baixa-Chiado, centro de Lisboa. "Broto surgiu da ambição de conseguirmos um nome que, no fundo, nos ajudasse a exprimir a minha cozinha da melhor forma, da forma mais genuína. Achámos que era uma palavra que está muito ligada à ideia de raízes e o Broto é um restaurante construído em cima das minhas raízes pessoais. É um nome muito associado ao campo e ao ato de fazer nascer algo, de criar algo novo", explica o chef, que recebeu a reportagem do DN para um jantar no seu recém-inaugurado restaurante.Desde seu anúncio da saída do Cura, poucos meses antes da Gala Michelin 2025, onde a casa que comandou por cinco anos renovou o estatuto de uma estrela na mais relevante distinção gastronómica, Pena Bastos adiantava que o novo restaurante seria mais acessível e democrático. Não mentiu: sem tentar implementar um menu fine-dining, o chef focou em algo "nos sabores da infância, os cheiros da casa e a simplicidade dos pratos intemporais", como apresenta o conceito do restaurante..A carta no Broto mistura este sabor nostálgico e caseiro com técnica elegante, mas sem a necessidade de um refino que aproxima das outras cozinhas que a dupla trabalhou, como a do próprio Cura. "Não é um fine dining, nem vai ter menus de degustação", diz o chef. "É um espaço onde a cozinha se liberta das amarras da formalidade, mas mantém o rigor e o respeito pela origem: pratos com alma, feitos com ingredientes escolhidos a dedo e tratados com simplicidade. A inspiração continua a vir do território português: dos pequenos produtores, das tradições, das estações. Mas num registo mais leve, mais direto e mais partilhável", prossegue. Na visita do DN ao restaurante, que tem como subchefe um dos seus pupilos dos tempos de Cura, o brasileiro Vitor Taiki, a refeição começou com suspeito que costuma ser bem tratado pelas mãos da dupla: o pão de malte, que, aqui, chega acompanhado de manteiga dos açores e azeite verde - o couvert fica a €4,50. Mesmo que a refeição seja bem composta, não é demais pedir uma dupla dose do pão, candidato a um dos melhores servidos em restaurantes da capital..Seguiram-se entradas, que no Broto dividem-se em duas. As primeiras, indicadas a serem desgutadas "à mão", tais como o Coscorão de mexilhões, pil-pil verde e escabeche de pimentos (€8), a Barriga de atum rabilho, bouquet de folhas do Quintal Urbano e tempurá de algas (€11) e a campeã de audiência, Patanisca de lula, pickle de couve e papada de porco alentejano - leia-se, o famigerado guanciale, queridinho dos italianos em massas à carbonara ou alla matriciniana - que sai por €8. Nas entradas "menores", o Bacalhau com batata ratte, escabeche de cenoura e alho negro (€15), o Peixe Curado com puré de brócolos grelhados, vinagrete de citrinos (€15) e o Picado de vaca de Pasto, gema curada, alcaparras fritas e tostas de cereais (€18), abrem o apetite para os principais. Nesta parte, protagonistas como o Borrego à colher com cuzcuz transmontanos, acelgas, pêra Rocha e hortelã e a Corvina com açorda de pão massa mãe, halófitas e molho de poejo (€23), o favorito deste repórter, brilham sobre as mesas do Broto. .Há ainda opções para partilha, nas quais encontram-se o Arroz malandrinho de tamboril e marisco do dia (€65) e a Vazia de vaca de Pasto com molho à Matarre (€75). Para finalizar, o Marmelo com massa folhada e queijo de cabra da Casa Pratas (€11) e umas engraçadas farturas com leite-creme e tomilho-limão (€12), embaladas num saco típico de festas populares, uma ideia de Vitor Taiki, chegam como opções de sobremesas. "O Broto é um restaurante que nos dá essa liberdade", diz Taiki, natural de São Paulo e em Lisboa desde a adolescência. "Estamos nos divertindo neste processo de mudança de conceito", continua o brasileiro..Elegante, diverso e democrático, como disse Pena Bastos no início desta empreitada, o Broto dá indícios de que, numa zona nobre da cidade, pode tornar-se uma referência de uma comida focada nos ingredientes sazonais, na memória afetiva e preços acessivos, sem abrir mão de certa sofisticação. Para já, repetir o feito no Cura, de obter uma estrela Michelin, não é a maior ambição da dupla. Mas claro que se aparecer, será motivo de orgulho para os dois. "Não pensámos o restaurante com essa ambição, até porque sabemos que, em Portugal, o Guia Michelin não tem distinguido com estrelas restaurantes mais democráticos, e que, por exemplo, não servem menus de degustação, mas também sei que o Guia vai estar atentos ao nosso trabalho. Se um dia virem no Broto um agente de mudança, no sentido de distinguirem um restaurante que pratica uma cozinha mais livre, será algo que nos deixará muito felizes e orgulhosos. Orgulhava-me de ter o restaurante Michelin mais barato de Portugal", finaliza Pena Bastos. nuno.tibirica@dn.pt.30 anos de Cafeína: um clássico que será sempre um clássico.Mona Verde renova carta e atmosfera em rooftop com vista privilegiada de Lisboa