Quando se fala no Peru talvez pense das ruínas incas de Machu Picchu, num ceviche da sua aclamada culinária ou em beber um pisco sour. E quando falamos em café talvez os primeiros países sul-americanos em que pense sejam Colômbia ou Brasil. Mas sabia que o Peru é o maior exportador do mundo de café orgânico? O que torna os cafés deste país, com uma enorme diversidade de culturas, de cores e geografias, tão especiais? “O que diferencia os cafés peruanos, assim como os cafés colombianos ou os da Cordilheira dos Andes, é a altitude”, contou ao DN a coffee hunter Blanca Elena Avendaño, a colombiana por trás da Nena Selected Coffee. “Um café que é plantado a 1700 ou 1800 metros acima do nível do mar é um café exposto a um sol mais saudável, a muito mais oxigénio e a menos contaminação em termos dos bichos que atacam as plantas do café”, referiu. “No Peru facilmente podemos chegar a 2200 metros acima do nível do mar e isso definitivamente torna os cafés diferentes e especiais, cafés que apelidamos de especialidade”, explicou.Blanca foi a responsável por preparar dois desses cafés de especialidade num evento em final de novembro na residência oficial do embaixador do Peru em Portugal, Carlos Gil de Montes, com representantes das principais marcas de café em Portugal. Pode ser colombiana, mas quando se trata de bom café - a sua paixão - não há traição à pátria em falar do que de melhor se produz no Peru.“O café de especialidade começa na apanha que é feita à mão, grão a grão. Essa parte já é sustentabilidade e é o que sempre defendi”, conta Blanca ao DN. “Uma sustentabilidade que não é só do planeta, mas também do ser humano. Um café de especialidade, apanhado grão a grão, já vai sustentar uma família, essa família já vai querer cuidar desse campo, que por sua vez já tem outros produtos fruto da biodiversidade local, que vão depois dar um sabor próprio à terra e ao café”, explicou.Quando Blanca prepara um café não se limita a carregar num botão numa máquina de cápsulas. Antes da prova já houve o trabalho de torra dos grãos, que desta vez ficou a cargo de Inês Costa, engenheira alimentar e Q-Grader (como são conhecidos os sommeliers do café) por trás dos centenários Cafés Negrita. “A torra é ela própria uma ciência”, contou Blanca. Com os grãos já torrados e moídos para fazer um café coado (nem muito fino, nem muito grosso), é preciso primeiro “lavar o filtro” e depois “acordar o café”. A água não pode estar a ferver, está a cerca de 93 graus, e é sempre despejada em movimentos circulares. Tudo é feito em cima de uma balança precisa, porque para 32 gramas de café é preciso pôr 520 mililitros de água.A primeira prova foi de um geisha da Cooperativa Aprysa, de Chirimoto, na Província de Rodríguez de Mendoza, no Departamento do Amazonas, cultivado a 1930 metros de altitude. É uma variedade rara de café arábica. Tinha um aroma a cacau, floral, deixando um travo a chá no final. A segunda prova foi de uma mistura entre as variedades caturra e villasachy, da Cooperativa Aroma Campocafé, de Camporredondo, da Província de Luya, também no Amazonas, que parecia ter um toque de frutos secos. Apenas dois exemplos de vários tipos de café das pequenas explorações peruanas, muitas vezes familiares. “Uma história por trás de cada taça de café”, lembrou o embaixador peruano, explicando que o café é mais uma das exportações do setor agrícola que tem vindo a crescer (por curiosidade, sabia que o Peru é o maior exportador do mundo de mirtilos e de uva de mesa?). O café foi o quinto produto mais exportado do cabaz agrícola peruano em 2024. Foram 256,3 mil toneladas que renderam 1137 milhões de dólares em exportações (mais 37% que no ano anterior), com um aumento médio do preço de 11% para os 4,44 dólares por quilo. Os principais destinos do café peruano são os EUA (28%), a Alemanha (19%) e a Bélgica (11%).