Chernobyl. Um paraíso da vida selvagem, mas um paraíso radioativo
Em 2010, duas décadas e meia depois da explosão do reator número 4 da central nuclear de Chernobyl, e da criação da zona exclusão num perímetro de 30 quilómetros em redor da central, já se tinha tornado claro que, na ausência da presença humana, os animais estavam a ocupar todo aquele território. Hoje a vida selvagem prospera ali, mas não é claro qual é o real efeito da radiação naquelas populações de animais.
Logo após o acidente, a libertação intensa de radiação ao longo de muitos dias causou danos visíveis na região. O secretismo que era a norma do regime soviético impediu que as mais de 115 mil pessoas pessoas que viviam na cidade de Prypiat e nas aldeias em redor fossem evacuadas em tempo útil - isso só aconteceu um dia depois e, mesmo assim, sem que fosse dito às pessoas o que estava a acontecer. Nem os bombeiros e os chamados "liquidadores", os que foram de imediato enviados para central sem equipamento adequado, para extinguir o incêndio no reator, e lidar com os materiais contaminados, sabiam o perigo que corriam - muitos morreram, muitos outros ficaram com problemas de saúde graves para o resto da vida.
A natureza também não escapou à tragédia. A floresta de coníferas junto à central ficou vermelha de um dia para o outro e as árvores morreram. Lá estão, ainda de pé, Chamam-lhe "a floresta vermelha", e está envolta em silêncio - ali, os pássaros não fazem poiso.
Três décadas depois, no entanto, a vida selvagem voltou à região, instalou-se e prosperou, tanto mais confiante quanto não está ameaçada pela presença humana. A vida segue o seu curso.
Aparte a tendência recente dos circuitos que levam turistas ao interior da zona desabitada, para que estes possam apreciar a decadência da cidade abandonada de Prypiat (onde viviam as família dos trabalhadores da central), observar o que resta das aldeias mais próximas, onde a vegetação tomou as casas de assalto, e até ter um rápido vislumbre dos animais que repovoaram a região, quando eles se deixam ver, ninguém reside na zona de exclusão.
Hoje, todo aquele vasto território é dos linces e dos bufos-reais, das garças-brancas, dos cisnes, dos ursos, dos bisontes e dos alces, dos cavalos selvagens e dos lobos. Estes, sem o seu predador natural, formaram matilhas. A cadeia alimentar restabeleceu-se e a natureza reconquistou o seu ritmo normal, mesmo se os solos e a vegetação, que também floresceu, estão contaminados.
Biólogos que têm estudado nos últimos anos este fenómeno da renaturalização da zona desconhecem, porém, o real estado de saúde destes animais.
É verdade que as populações das diferentes espécies mantêm números altos, mas os biólogos desconhecem o verdadeiro impacto nos animais da taxa de mutações genéticas, que é duas a dez vezes mais alta em algumas das espécies de pássaros e mamíferos, em relação às suas congéneres noutras partes do mundo.
"Vemos efeitos negativos da radiação nos diferentes organismos", desde os insetos aos mamíferos, explicou à Wired Anders Møller, ecologista e investigador da Universidade de Paris, que tem avaliado nos últimos anos a vida selvagem naquela zona. Mas falta uma visão global do problema, sublinha o biólogo. "Estas populações são, ou não, compostas por indivíduos saudáveis? Os animais têm, ou não, doenças e malformações com impacto na sua saúde?", questiona-se. Os estudos realizados ainda não permitiram dar uma resposta conclusiva a estas questões, sublinha.
J. Beasley, um biólogo da Universidade da Georgia, nos Estados Unidos, de uma equipa internacional que fez uma investigação em 2015 sobre a questão, é da opinião que, qualquer que seja o impacto da radiação na saúde destes animais, isso não se repercute de forma negativa nas populações das diferentes espécies. E explica porquê: as contagens feitas pela sua equipa mostram que os números são idênticos aos de outras populações congéneres, noutras regiões sem o problema da radiação.
"A maioria dos animais", diz J. Beasley, "morrem durante os primeiros meses de vida, e "os que atingem a idade adulta nunca vivem muitos anos", sendo que "o cancro é muitas vezes uma doença que ocorre em idades mais tardias". No entanto, isso não parece repercutir-se na dimensão populacional.