"PSP encerra alojamento ilegal com imigrantes” é o título de diversas notícias que saíram nos jornais desde o início deste ano. Estas ações da Polícia de Segurança Pública (PSP) não são necessariamente com foco na habitação ilegal, mas sim, num “âmbito mais amplo”, nas quais são fiscalizados cidadãos estrangeiros, não só em Lisboa, como também noutras zonas do país. Do dia 01 janeiro até 30 abril deste ano, a PSP fiscalizou um total de 14.415 cidadãos estrangeiros em 1.206 operações, de acordo com dados enviados em exclusivo ao Diário de Notícias. Entre elas, estão algumas relacionadas com habitação ilegal e alojamentos sobrelotados, que sempre ganham atenção mediática, por estarem relacionadas com imigração. Segundo o superintendente Hugo Palma, a maior parte das últimas operações nestes locais foram motivadas por denúncias. “Eu não consigo dizer todas elas, mas grande parte delas decorre de denúncias”, começa por dizer ao DN o superintendente.Além das denúncias, por regra anónimas, há também recolha de informações nas próprias fiscalizações em diversos locais distintos. “São informações que recolhemos nas ações de fiscalização que realizamos. Surgem por vezes indicações de que determinado sítio, determinada garagem ou armazém pode estar a ser utilizado para alojar ilegalmente os cidadãos”, explica. Num dos casos, em Loures, 60 imigrantes com documentação viviam num armazém. Em Arroios, eram 30 no mesmo sítio, enquanto em Queluz, um pequeno escritório foi transformado num dormitório para 20 pessoas. Em comum têm o facto de que os moradores destes alojamentos eram imigrantes. O superintendente Hugo Palma sublinha que estes cidadãos “seguramente não estão a incorrer a nenhum crime”. Eles é que “são as vítimas”.Quem está a cometer um ou mais crimes são os arrendatários, que exploram a situação destas pessoas. “Há algumas destas situações, especialmente aquelas em que a situação é degradante e os valores que são cobrados, que nós conseguimos apurar, são extremamente elevados em alguns casos, o que nós fazemos, normalmente, é elaborar um auto de notícia”, destaca Hugo Palma. “Não nos limitamos a fazer a fiscalização. Depois há aqui outras questões que têm a ver com a salubridade, com a utilização para habitação de espaços que não estão licenciados para ter habitação, e isto depois resulta em processos camarários”, detalha.Mas garante: “a pessoa que está a ocupar esses locais garantidamente, não incorre em nenhum crime. Isso está completamente afastado”. Segundo Hugo Palma, as situações encontradas são de vulnerabilidade. “Esta pessoa está em uma situação de vulnerabilidade e tem que ser tratada assim”, argumenta.O superintendente lembra-se de um caso em específico. “Eu recordo-me de uma situação de fiscalização na Baixa de Lisboa, ao fiscalizar uma loja deparamo-nos com uns armazéns nos fundos, um espaço que algumas pessoas estavam a utilizar como zona de habitação. Portanto, isso foi uma situação nova”, lembra. Estas ações passaram a ser acompanhadas pelos apoios dos serviços sociais das câmaras ou até mesmo da Segurança Social. “Nós não podemos deixar aquelas pessoas ficarem ali naquelas situações. Às vezes é difícil conseguir uma solução de habitação para estas pessoas, ou mesmo que temporária, mas elas não ficam lá, nós não deixamos que aquela situação permaneça e levantamos os autos. E quando consideramos que há ali outras situações mais graves, inclusive fazemos auto de notícia da exploração daquelas pessoas”, exemplifica.Na visão do superintendente, habituado ao trabalho que envolve cidadãos imigrantes, estas situações diferem dos sem-abrigo, em geral, portugueses. “Temos muitos sem-abrigo a dormir em Lisboa que são portugueses, porque são pessoas que não têm trabalho. O que nós temos aqui, no caso dos cidadãos migrantes, são pessoas que se aproveitam dos estrangeiros que estão a trabalhar e que têm pouca, mas alguma, capacidade financeira e exploram-nos desta forma”, analisa. Segundo Hugo Palma, são “miseráveis” algumas das condições que já encontraram. “Estas pessoas estão a pagar por um sítio sem condições absolutamente nenhumas, condições absolutamente miseráveis”, conclui.“Duplamente vítimas”De acordo com o responsável da PSP, estes imigrantes são vítimas de muitos fatores. “Estes cidadãos são vítimas de estarem numa situação em que a regularização nunca mais chega, são vítimas porque pelos preços da habitação é impossível elas conseguirem contratos, são vítimas porque, infelizmente, há muitas pessoas que se ouvem a palavra imigrante ou de outro país qualquer e não arrendam casas” relata. “Estas pessoas são duplamente vítimas do preconceito e depois são vítimas daquelas pessoas que se aproveitam disto e retiram-lhes o pouco que elas ganham. E é isso que nós gostaríamos de combater cada vez mais e esse tem que ser o nosso foco”, pontua.Segundo o superintendente, a situação é mais dramática para cidadãos que não falam português e não são oriundas de países com cultura ocidental. “Mesmo para um brasileiro que tem ainda a facilidade da língua, tem a facilidade da cultura, às vezes é difícil, imagino pessoas que são vistas com uma cultura diferente, com uma religião diferente, quer dizer, esse preconceito, infelizmente, isso temos que reconhecer, ele existe na nossa sociedade”, alerta.Fiscalizações na restauraçãoDe janeiro a abril deste ano, a PSP efetuou 124 operações em estabelecimentos de restauração, área que emprega um grande número de imigrantes. Nestas ações foram fiscalizados 1.308 cidadãos estrangeiros. O superintendente argumenta que os imigrantes não são um alvo da PSP. “O que nós fazemos são ações regulares a áreas de atividade económicas que nós sabemos que utilizam mão de obra estrangeira. E é por isso que nós fixamos o nosso trabalho, não é ir à procura do estrangeiro em situação ilegal, é ir à procura daquelas empresas, daqueles locais que normalmente têm mão de obra estrangeira”, contextualiza.Nessas ações são realizadas verificação dos documentos. “Verificamos a situação das empresas que têm lá pessoas a trabalhar, ver se estas pessoas têm contrato de trabalho, se estas pessoas estão regularizadas. É claro que pelo meio nós acabamos por detectar situações de pessoas que estão em situação ilegal e aí temos que aplicar a lei”, afirma. Nos primeiros quatro meses deste ano foram identificados 13 casos de cidadãos que receberam a notificação para abandono voluntário do país - menos de 1% do total de imigrantes fiscalizados nestes locais. Outras localidades fiscalizadas são centros comerciais e hotéis, por exemplo. “Quanto mais ações nós fizermos a estes estabelecimentos, espaços comerciais, indústrias e a agricultura, conseguiremos responsabilizar as pessoas que estão por trás do aproveitamento dos estrangeiros e mais difícil será manter as situações de exploração”, defende..Nos primeiros quatro meses deste ano foram identificados 13 casos de cidadãos que receberam a notificação para abandono voluntário do país - menos de 1% do total de imigrantes fiscalizados nestes locais..Várias destas ações também ocorrem nos diversos tipos de transportes públicos. Foram 7.160 nos primeiros quatro meses de 2025, mas os objetivos são diferentes, explica o Hugo Palma. “Há aqui uma questão que tem a ver com redes que se deslocam. Não tem tanto a ver com o cidadão estrangeiro não Schengen, mas tem um bocado a ver com algumas organizações que se dedicam a algum tipo de criminalidade. Nomeadamente, carteiristas, pessoas ligadas a roubos, que se deslocam por toda a Europa e nós temos essa noção. Estamos a falar de europeus e até portugueses”, destaca. O oficial explica que os transportes rodoviários são mais utilizados por serem mais baratos e com menos controlo, na comparação com viagens de aviões, por exemplo.Unidade na PSPEstá para ser aprovada em votação final global na quarta-feira, 16 de julho, a criação da Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras (UNEF) na PSP. Em articulação com o Chega, o PSD já tem votos suficientes para aprovação.De acordo com o Governo, esta unidade vai”assegurar as competências de controlo de fronteiras aeroportuárias, de retorno e de fiscalização, na sua área de circunscrição, sobre a permanência de estrangeiros em território nacional”. Entre as atribuições desta nova unidade da PSP estarão “Fiscalizar a permanência de cidadãos estrangeiros em território nacional, na área de jurisdição da PSP”, “instruir os processos de contraordenação relativos às infrações em matérias que recaem sob a sua competência no âmbito do regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional” e “promover, na área de jurisdição da PSP, a realização de operações conjuntas com serviços ou forças de segurança congéneres, nacionais ou estrangeiros”, além de “gerir os centros de instalação temporária e os espaços equiparados”. A UNEF compreenderá, a nível nacional, quatro unidades centrais e terá “equipas multidisciplinares de combate aos fenómenos associados à migração ilegal e cooperação com outros atores no plano da integração”. A medida consta no Plano de Ação para as Migrações, lançado pelo Governo a 3 de junho do ano passado.amanda.lima@dn.pt.PSP e GNR expulsaram 64 polícias por crimes graves. Mas há 122 ainda ao serviço.Guia do que vai mudar com as restrições na imigração - para quem virá e para quem já está em Portugal