Polémica sobre residências universitárias: PS exige retratação de Fernando Alexandre. Ministro diz ter sido descontextualizado
PAULO NOVAIS/LUSA

Polémica sobre residências universitárias: PS exige retratação de Fernando Alexandre. Ministro diz ter sido descontextualizado

As declarações do ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, sobre a degradação das residências universitárias caso sejam ocupadas exclusivamente por estudantes mais desfavorecidos desencadearam uma forte reação. O PS acusa o governante de discriminação e preconceito, mas ministro diz que socialistas têm obrigação de ouvir até ao fim.
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“Ouçam até ao fim o que eu disse", pede Fernando Alexandre, depois da controvérsia em torno de declarações por ele proferidas esta terça-feira, 16 de dezembro. O ministro afirmou que as residências públicas devem acolher estudantes de vários estratos sociais, alertando que, se derem prioridade apenas aos bolseiros, “irão degradar-se mais rapidamente”. Durante a apresentação do novo modelo de ação social para o ensino superior, em Lisboa, afirmou: “Vamos ter residências todas renovadas, que daqui a cinco anos vão estar todas degradadas”.

O governante acrescentou que “o que vai acontecer às residências depende das universidades e politécnicos, mas também depende dos estudantes”, defendendo que é por “colocar na residência universitária os estudantes dos meios mais desfavorecidos que se degradam”. Mais tarde, em declarações aos jornalistas, esclareceu que a associação feita se relaciona com “a qualidade dos serviços públicos” e da gestão que deles é feita e não por quem deles se serve.

“Nós temos que manter as famílias de todos os rendimentos a terem como prioridade o Serviço Nacional de Saúde e a Escola Pública. Quando isso deixa de acontecer, conduz muitas vezes a uma deterioração dos serviços”, afirmou Fernando Alexandre.

À Antena 1, e mais tarde, em comunicado oficial, o ministro nega ter associado a degradação das residências universitárias à classe social dos estudantes e sim ao desleixo dos serviços. No entanto, as declarações como emitidas inicialmente motivaram duras críticas do PS. O líder parlamentar socialista, Eurico Brilhante Dias, exigiu uma retratação por parte do ministro, considerando as palavras inaceitáveis: “Se o senhor ministro não retificar o que disse, se não reconhecer que cometeu um erro grave, discriminatório, preconceituoso face às famílias com rendimentos mais baixos, deixou de ter condições de ser ministro da Educação. Portugal merece ter um ministro da Educação para todos os portugueses”, declarou.

Também a CDU reagiu, anunciando que irá chamar Fernando Alexandre à Assembleia da República para prestar esclarecimentos sobre o tema.

"O ministro limitou-se a ser social-democrata"

Em defesa do ministro saiu o economista Luís Aguiar-Conraria, colega de Fernando Alexandre na Universidade do Minho. “O ministro limitou-se a ser social-democrata”, disse ao DN. Para o economista, quando “os serviços públicos são apenas dirigidos às classes mais desfavorecidas e deixam de ser universais, irão seguramente degradar-se a longo prazo”. E questiona: “Porquê? Porque estas classes não têm capacidade reivindicativa. E os serviços desleixam-se”.

Aguiar-Conraria sublinha que “não se trata de achar que os menos favorecidos têm menos cuidado. Não, os serviços é que passam a ter menos cuidado”. O professor reforçou ainda “uma preocupação” mais ampla: “Esse é um dos problemas da escola pública. O facto de as classes média e alta terem abandonado, em grande parte, a escola pública, preferindo as privadas, contribuiu para a degradação daquela”. E acrescentou: “Se os filhos dos presidentes de câmara, dos empresários, estivessem sem aulas de inglês na escola, iriam seguramente reivindicar”.

No mesmo dia, Fernando Alexandre revelou que apresentou, no início do mês, uma proposta aos reitores, presidentes dos politécnicos e associações de estudantes que previa a atribuição do mesmo valor de apoio ao alojamento a todos os estudantes deslocados numa mesma cidade, dando-lhes liberdade para escolher entre uma residência pública ou o arrendamento no setor privado. “As residências académicas devem ser espaços de integração, de bem-estar e de promoção do sucesso escolar, e não, como são atualmente, e foram sempre em Portugal, espaços onde são colocados os alunos de rendimentos mais baixos”, defendeu.

O ministro reconheceu, no entanto, que a proposta enfrentou resistência por parte das instituições de ensino superior, que temeram ficar com “quartos desocupados nas residências”, levando o Governo a recuar. Ainda assim, afirmou que “se chegássemos a uma situação em que tivéssemos quartos desocupados nas residências, seria bom sinal: teríamos acabado com o problema da habitação em Portugal”, acrescentando que no próximo ano estarão disponíveis mais 11 mil camas.

Perante a oposição dos responsáveis académicos, a tutela decidiu manter valores diferenciados no cálculo das bolsas, consoante o estudante consiga vaga numa residência pública ou tenha de recorrer ao mercado privado. Os bolseiros terão sempre de concorrer às residências e só quando não existirem vagas poderão aceder ao apoio para um quarto particular.

Na mesma sessão, o ministério apresentou alterações ao regulamento das bolsas de estudo, incluindo um apoio extra anual de 1045 euros para estudantes que, no ensino secundário, beneficiavam do escalão A do abono de família. A secretária de Estado do Ensino Superior, Cláudia Sarrico, explicou que a nova fórmula de cálculo será “mais justa”, tendo em conta o custo real de estudar em diferentes concelhos, a condição de estudante deslocado e o rendimento familiar. Segundo Fernando Alexandre, a bolsa máxima deverá passar para 8177 euros anuais, com as novas regras a entrarem em vigor no próximo ano letivo.

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