O combate ao crime organizado através do fisco não é uma novidade. Há anos que vários países já perceberam que esta é uma tática que pode funcionar, principalmente se houver uma articulação entre as finanças e as polícias. E como ir além? Como Brasil e Portugal podem agir em conjunto? Como aliar a tecnologia neste combate? Este será um dos principais painéis do O Futuro da Tributação, que decorre etsa quinta, 02 de outubro e sexta, 03 de outubro, em Lisboa. O encontro, promovido pelo Fórum de Integração Brasil Europa (FIBE), reunirá 80 especialistas de várias áreas e de diversos países, como Brasil, Portugal, Espanha, Alemanha, Estados Unidos, mas com a tributação como tema comum..“Autoridade de Branqueamento de Capitais Europeia é um divisor de águas”, diz advogada. O evento, na sua segunda edição no país (a primeira foi em Coimbra no ano de 2023) está a ser planeado há meses, sendo a tributação do crime organizado um dos grandes temas. A discussão coincide com uma grande operação policial realizada recentemente que mostrou a influência do Primeiro Comando da Capital (PCC) em grandes corporações, bancos e outras empresas para lavagem de dinheiro. “Os criminosos ‘arrefecem’ o dinheiro hoje em dia com ar de legalidade, por isso é importante o trabalho conjunto entre o fisco e a polícia”, diz ao DN o economista José Roberto Afonso, vice-presidente do FIBE.A mesa que discutirá este assunto terá a presença de profissionais do Brasil que lidam diretamente com o assunto: Andrea Costa Chaves, auditora-Fiscal da Receita Federal do Brasil, Andrei Rodrigues, diretor-geral da Polícia Federal (PF), Eduardo Vergara, do Banco Interamericano de Desenvolvimento e Paulo Gonet, Procurador-Geral da República (PGR) brasileira. Andrea Costa Chaves, por exemplo, foi quem comandou esta mais recente operação contra o PCC pelo lado da Receita Federal, homóloga das Finanças em Portugal. O esquema utilizava fundos de investimentos e empresas financeiras que operavam na avenida Faria Lima (principal centro financeiro de São Paulo) para gerar, lavar, ocultar e blindar recursos da atuação do Primeiro Comando da Capital (PCC) no tráfico de drogas e no setor de combustíveis. “É também uma oportunidade de Brasil e Portugal discutirem juntos o combate ao crime organizado, uma vez que os dois países possuem vários termos de cooperação e convénios, não pode ter tabu neste tema”, analisa José Roberto Afonso.Apesar de a escala ser diferente, por questões geográficas, ambos os países atuam no combate ao branqueamento de capitais e o crime organizado. No Brasil, a Receita Federal apresentou no início deste ano a nova estratégia do organismo no combate. “Esse posicionamento vem tendo impacto sobre o número de apreensões de mercadorias que são fruto de contrabando e descaminho, como cigarros e outros artigos electrónicos, além de combustíveis e drogas”, lê-se numa nota oficial. Na ocasião, o secretário especial da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, destacou que “infelizmente é por meio de transações internacionais que o crime organizado, muitas vezes, se financia”. Em 2024, o fisco brasileiro apreendeu , fruto do contrabando e descaminho, um montante de R$ 3,76 mil milhões de reais (o equivalente a 601,6 milhões de euros).Em Portugal, a primeira lei sobre o combate à criminalidade organizada é do ano de 2002, sendo aperfeiçoada ao longo do tempo. A última alteração é de 2024. De acordo com o Relatório Anual da Segurança Interna (RASI), no ano passado, a Autoridade Tributária (AT) “integrou operações internacionais visando o combate ao tráfico de drogas” e o Ministério da Justiça tem vindo a dar cada vez mais prioridade para “reforçar o Estado de direito e a luta contra a criminalidade organizada transnacional”. Nesta semana, por exemplo, a Polícia Judiciária (PJ), através da Diretoria do Norte, realizou uma operação de combate aos crimes de associação criminosa, branqueamento, fraude fiscal e falsificação de documentos. “Em causa está a atuação de uma organização de caráter transnacional, controlada por cidadãos estrangeiros, que utilizaria o sistema bancário nacional para sustentar o processo de branqueamento, alicerçado na criação sucessiva de sociedades - detidas e geridas por sujeitos munidos de identidades falsas - e contas bancárias tituladas pelas mesmas, por onde fluíam as vantagens na sua maioria provenientes da prática do modus operandi TBML (Trade Based Money Laundering)”, destaca a Judiciária.Ainda segundo o RASI, em 2024, houve um aumento de 18% no número de inquéritos abertos relacionados com branqueamento de capitais. Também foi registada uma subida de 50,4% do número de pessoas constituídas arguidas. Foram, no total, 1281 arguidos (68% homens) e 69 detidos (80% homens).Mas não é somente a PJ que se dedica a este combate. Em junho deste ano, a Guarda Nacional Republicana (GNR), através da Unidade de Acção Fiscal (UAF), participou numa operação policial de dimensão internacional, cumprindo mandados de detenção europeus a três suspeitos envolvidos na organização criminosa em investigação, na grande Lisboa. A operação foi liderada pela Procuradoria Europeia (EPPO). O esquema fraudulento assentava na criação de circuitos de faturação fictícia e simulação de negócios, com vista à evasão e fraude ao IVA, num montante superior a 10 milhões de euros. A investigação identificou três cidadãos portugueses na organização criminosa, com o objetivo de apoiar a operação internacional em território nacional.Mais temas no fórumImpostos e soberania: O economista José Roberto Afonso defende que os países tenham soberania para decidir sobre os seus impostos, mesmo que pareça um paradoxo.A mesa sobre soberania e impostos terá a presença da advogada Ana Claudia Axie Utu, especialista na área tributária, de Betty Graciela Rodrigues, investigadora em tributação e economia digital, de Espiridião Amin, senador brasileiro e Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribuna Federal (STF) brasileiro. Novas relações de trabalho e impostos: Como reimaginar o papel da tributação diante de novas formas de trabalho, de consumo, de riqueza e de poder económico é norte de outro painel do fórum. Os oradores são Adacir Reis, da associação brasileira que representa a previdência privada, Alberto Barreix, do Inter-American Bank, Carlos Veras, deputado federal brasileiro, Ives Gandra Martins Filho, ministro do Tribuna Superior do Trabalho,José Roberto Afonso, do FIBE e Matilde Lavouras, professora da Universidade de Coimbra.Workshops: O aspeto tecnológico é outro destaque do evento, com workshops temáticos que vão discutir estas soluções, como IVA nas plataformas digitais, administração tributária descentralizada e automatizada, criptoativos e moedas digitais, além dos desafios da tributação para atividades económicas essenciais.amanda.lima@dn.pt.Bruxelas pede menos tributação na luz para baixar contas na União Europeia ."O dinheiro para a Defesa vai ter de vir dos nossos impostos", diz fiscalista Rogério Fernandes Ferreira