O Estado gastaria, pelo menos, entre 194,8 e 954,4 milhões de euros para comparticipar por dois anos medicamentos para a obesidade aos 170.405 doentes dentro dos critérios do Percurso de Cuidados Integrados para a Pessoa com Obesidade.Segundo a análise do impacto da comparticipação destes medicamentos feita pelo Infarmed, a que a Lusa teve acesso esta terça-feira (23), nesta população, os valores indicados têm em conta comparticipações entre os 15% e os 90%, sendo que o valor mais alto representa uma despesa de quase metade do total gasto pelo SNS em medicamentos entre janeiro e setembro deste ano (2.381,4 milhões).O Infarmed, nas observações finais, recomenda que, caso se opte pela criação de um regime excecional de comparticipação – uma vez que estes medicamentos não se encontram abrangidos pelos grupos terapêuticos comparticipáveis -, "face ao elevado impacto económico", o regime deve conter critérios explícitos de elegibilidade com base no Percurso de Cuidados Integrados para a Pessoa com Obesidade (PCIPO), da Direção-Geral da Saúde (DGS)..EUA: aprovado comprimido que é alternativa a injeção para a obesidade.No estudo, o Infarmed analisou custos da comparticipação tanto neste cenário – utentes com critérios do PCIPO (entre 170.405 e 180.880) - como no caso da estimativa da população adulta (entre os 25 e os 74 anos) com obesidade, que atinge os 2.008.386, segundo o Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF).Se a comparticipação contemplasse estes mais de dois milhões de adultos obesos que se estima existam em Portugal, a despesa com a comparticipação destes medicamentos – tendo em conta dois anos de tratamento com todos os doentes a entrarem ao mesmo tempo – poderiam variar entre 2.296 milhões e os 11.248 milhões de euros.Segundo dados do Infarmed, entre janeiro e setembro, a despesa com medicamentos cresceu 14,9% (+257 milhões de euros) nos hospitais e 13,1% em ambulatório (+162 milhões de euros), chegando aos 2.381,4 milhões de euros.Na análise ao impacto orçamental da comparticipação para a população elegível de acordo com o PCIPO, o Infarmed estimou tanto os valores dos diversos escalões a comparticipar como a hipótese de entrarem todos os doentes em tratamento no mesmo ano ou entrar 50% em cada um dos anos.Neste segundo cenário, com a introdução faseada, a despesa no escalão A (90% de comparticipação) variaria entre os 229,1 milhões (1.º ano) e 477,2 milhões (2.º ano). No escalão D (15% de comparticipação), seria de 46,8 milhões no 1.ºano e de 97,4 milhões de euros no 2.ºano.No final da análise, o Infarmed diz que o regime de comparticipação a definir deve prever a monitorização e avaliação em função dos objetivos e resultados obtidos, assim como a reavaliação dos medicamentos financiados em função dos resultados na redução do nível de obesidade e comorbilidade associadas na população.Há já diversos países na Europa a comparticipar alguns dos medicamentos para tratar a obesidade, cinco dos quais são comercializados em Portugal, mas totalmente a cargo do utente e com necessidade de receitas médica: Mounjaro (Tirzepatida), Wegovy (Semaglutido), Saxenda (Liraglutido), Mysimba (Bupropiom + Naltrexona) e Orlistato 120 mg.As indicações aprovadas em sede de Autorização de Introdução no Mercado (AIM) para estes medicamentos são sobreponíveis, indicados em complemento a uma dieta reduzida em calorias e aumento da atividade física em doentes adultos com um Índice de Massa Corporal (IMC) igual ou superior a 30 Kg/m² ou entre 27 Kg/m² e 30 Kg/m2, se a pessoa tiver, pelo menos, uma comorbilidade relacionada com o peso, embora nem todos tenham indicação no tratamento da obesidade em adolescentes.Todos os países que comparticipam estes medicamentos e que o Infarmed teve como referência para esta análise têm critérios definidos para a comparticipação com base tanto no Índice de Massa Corporal (IMC) do doente como nos resultados obtidos, sendo que preveem um máximo de dois anos de comparticipação.O PCIPO define como critério de elegibilidade para esta medicação o utente ter um IMC igual ou superior a 35 Kg/m2, com pelo menos uma comorbilidade associada à adiposidade excessiva, para a generalidade dos fármacos, considerando algumas exceções.Prevê igualmente o facto de não ter havido sucesso noutras intervenções não farmacológicas após um período de 12 meses de acompanhamento multidisciplinar, com intervenção nutricional, plano de atividade física e intervenção psicológica.O PCIPO define que o tratamento não cirúrgico da obesidade deve ter uma abordagem estruturada e multidisciplinar, centrada na modificação do estilo de vida (intervenção nutricional e plano de atividade física), apoio psicológico, terapêutica farmacológica e monitorização da evolução clínica.Medicos de família querem saber se podem prescrever medicamentos para obesidade Os médicos de família pediram entretanto à Direção-Geral de Saúde que esclareça se podem ou não prescrever os medicamentos para tratar a obesidade, considerando que barrar a prescrição a estes clínicos afunila o acesso."Isto não é ter o doente no centro, afunila o acesso e nós não podemos achar que a obesidade, com o impacto que tem, com a prevalência que tem, que vai ser toda tratada farmacologicamente nos cuidados hospitalares”, disse à Lusa o presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, Nuno Jacinto.O responsável falava a propósito do Percurso de Cuidados Integrados para a Pessoa com Obesidade (PCIPO), da Direção-Geral da Saúde (DGS), que define todos os passos que estas pessoas terão de dar dentro do Serviço Nacional de Saúde para terem acesso aos medicamentos para tratar a obesidade, que neste momento precisa de receita médica e não é comparticipado.Nuno Jacinto considera que este documento “não é claro” quanto às responsabilidades de prescrição destes medicamentos, pois inicialmente abre a porta a que possa ocorrer nos cuidados primários, mas depois atribui a responsabilidade de prescrição aos médicos do núcleo dos cuidados hospitalares, designadamente às especialidades de Endocrinologia, Medicina Interna e Pediatria.”Já assumir que era numa consulta multidisciplinar de obesidade dentro dos centros de saúde era esquisito, porque era a mesma coisa que eu dizer a um doente que hoje está aqui comigo, sou o seu médico de família, vamos falar da diabetes, vamos falar da hipertensão, do colesterol, da artrose, agora da obesidade vai amanhã, ou daqui a uma semana, à consulta de um colega meu, porque eu não sou capaz de o ver”, explicou Nuno Jacinto.Com esta estratégia, referiu, está-se “a cortar os doentes às fatias”: “Agora fazemos este percurso para a obesidade, depois fazemos um percurso para a diabetes, um percurso para a hipertensão, mas esquecemos que a pessoa é a mesma”, acrescentou.Considerou que não faz sentido o médico de família não poder prescrever estes medicamentos, explicando que são idênticos aos da diabetes, que hoje prescrevem: “Aquele famoso chavão do doente no centro do percurso e dos cuidados não está a acontecer”.“Se é por uma questão financeira, então assumamos, enquanto Estado, que nós não temos dinheiro para tratar todos os obesos e só vamos tratar os mais graves (…). Não podemos andar é com subterfúgios”, afirmou.Segundo a análise ao impacto orçamental da comparticipação dos medicamentos para tratar a obesidade feita pelo Infarmed, o Estado gastaria, pelo menos, entre 194,8 e 954,4 milhões de euros para comparticipar por dois anos estes fármacos aos 170.405 doentes que estão dentro dos critérios definidos no PCIPO para ter acesso à medicação.Estes valores têm em conta comparticipações entre os 15% e os 90%, sendo que o valor mais alto representa uma despesa de quase metade do total gasto pelo SNS em medicamentos entre janeiro e setembro deste ano (2.381,4 milhões).Nos critérios de prescrição indicados, o Infarmed aponta os médicos dos núcleos de cuidados hospitalares pertencentes às equipas multidisciplinares de obesidade (EMO) no Serviço Nacional de Saúde, aludindo ao PCIPO.No estudo, o Infarmed analisou os custos da comparticipação tanto neste cenário – utentes com critérios do PCIPO (entre 170.405 e 180.880) - como no caso da estimativa da população adulta (entre os 25 e os 74 anos) com obesidade, que atinge os 2.008.386, segundo o Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF).Se a comparticipação contemplasse estes mais de dois milhões de adultos obesos que se estima existam em Portugal, a despesa com a comparticipação destes medicamentos – tendo em conta dois anos de tratamento com todos os doentes a entrarem ao mesmo tempo – poderiam variar entre 2.296 milhões e os 11.248 milhões de euros, quase cinco vezes mais do que o SNS gastou em medicamentos entre janeiro e setembro deste ano (2.381,4 milhões)..Um em cada sete portugueses com obesidade não reconhecem ter a doença