A resposta de Gregory Day, responsável da Lockeed Martin pelo desenvolvimento do programa F-35, foi muita clara, quando questionado pelo DN sobre se se sentiam verdadeiramente desafiados pela indústria europeia de aviação na venda dos programas dos novos caças: “Gostamos de uma boa competição. Vencemos sempre!”. Numa apresentação para vários jornalistas portugueses, que decorreu em Lisboa na sexta-feira, coadjuvado por Carlton Wilson, piloto de F-35, que explicou as capacidades e a tecnologia dos caças norte-americanos, Day já foi mais prudente em relação ao impacto da política da atual administração dos EUA na promoção dos seus equipamentos na Europa. “Sugiro que questione o presidente Trump ou o vosso Governo. Isso é política. Mas posso afirmar o seguinte: olhem para as bandeiras e olhem para si mesmos. Em breve verá e ouvirá o que a Bélgica pensa sobre o F-35. Garanto-lhe que isso demonstra que este programa é sólido em qualquer administração. Nós, como empresa, trabalhamos com cada 4 a 8 anos no nosso governo. Os governos mudam. Os vossos governos também mudam. Trabalhamos com sucesso com todas as administrações. O programa é o programa certo e tem sido assim há décadas.”Esta iniciativa da Lockeed Martin, que contou com a presença de uma representante da embaixada norte-americana em Lisboa, foi a segunda do género numa semana. Na quinta-feira, tal como o DN noticiou, os suecos da Saab, fabricantes dos caça Gripen, exibiram o que consideram ser vantagens para Portugal optar pelos seus jatos, de construção europeia.O programa de substituição dos F-16 em Portugal (uma frota de 28 aeronaves ao serviço há 30 anos), que terá um custo estimado em 5,5 mil milhões de euros em 20 anos, é dos mais atrasados da Europa, sem que o Governo tenha ainda avançado uma data para o seu arranque. “Não está em cima da mesa nem este ano nem, possivelmente, no próximo ano”, disse ao DN fonte autorizada do ministério da Defesa.Apesar de, para a Força Aérea Portuguesa, os F-35 de quinta geração serem os caças que mais se adequam às necessidades nacionais e de manutenção capacidades de defesa aérea compatíveis com o seu espaço geoestratégico no Atlântico, o ministro da Defesa, Nuno Melo pensa que, pelo menos, há que criar alguma competitividade, além de não ser descartado o contexto político internacional.“Nas nossas escolhas não podemos ficar alheados da envolvente geopolítica. A recente posição dos Estados Unidos, no contexto da NATO e no plano geoestratégico internacional, tem que nos fazer pensar as melhores opções, porque a previsibilidade dos nossos aliados é um bem maior a ter em conta. Temos que acreditar que, em todas as circunstâncias, esses aliados estarão do nosso lado. Há várias opções que têm que ser consideradas, nomeadamente no contexto de produção europeia e também tendo em conta o retorno que essas opções possam ter para a economia portuguesa”, declarou em março deste ano, em entrevista ao Público.O Chefe de Estado-Maior da Força Aérea, Cartaxo Alves, havia revelado, numa entrevista DN/TSF, em abril do ano passado, que “o processo fundamental de transição para o F-35 é algo que está a decorrer (…) já começou”, afirmando que tinha decorrido em Portugal “um workshop com a Lockheed e com a Força Aérea Americana para nos capacitarmos também do que é esse salto para a quinta geração”.Instado a comentar este processo “a decorrer”, Gregory Day foi mais evasivo: “Conversámos com todos os nossos clientes e conversámos com todos aqueles que o governo dos EUA diz estar interessado em conversar. Essas conversas continuam. O nosso trabalho, tal como estamos a tentar fazer intencionalmente hoje, é ajudar a educar um leque mais alargado de pessoas. Procuramos garantir que estamos em contacto com a Força Aérea, com o Exército e com os políticos sobre o que este programa significa. Cabe-lhes a eles tomar a sua decisão no momento e local adequados. Devemos reconhecer que os F-16 em Portugal estão a envelhecer. Em algum momento, teremos que pensar em uma substituição se quisermos continuar a ter uma Força Aérea”. Quanto a isso, concluiu, “temos desfrutado do nosso relacionamento de longa data em Portugal com a Força Aérea, de sermos parceiros aqui, e esperamos ansiosamente pela oportunidade de fazer isso no futuro”.Letalidade vs CooperaçãoPerante os jornalistas portugueses, os responsáveis da Lockheed Martin seguiram uma abordagem semelhante à da SAAB - um piloto da falar da tecnologia e um administrador da marca a realçar os benefícios do programa industrial. Mas o teor de ambas as propostas não poderia ser mais diferente. Se os suecos apresentaram como ás de trunfo a maior transferência de tecnologia, a cooperação industrial e as parcerias com empresas nacionais, os norte-americanos focaram-se no carácter furtivo (stealth) e na letalidade do F-35 - “o nosso caça tem um rácio de abate de 20 para 1”. Ou seja, o F-35 abate vinte adversários por cada F-35 abatido. Mas não é o único trunfo dos americanos: também realçaram a capacidade que o aparelho tem de interagir em tempo real com forças terrestres, navais e os restantes aliados - numa espécie de enxurrada coordenada de forças - e a fiabilidade que dá garantias, uma vez que o modelo já foi adotado por múltiplas forças aéreas de todo o mundo. O F-35, revelaram, já tem um total combinado de mais de um milhão de horas de voo. Ou seja, dizem, este é um programa altamente testado, internacional e em grande medida europeu, uma vez que 25% resulta de contributos de forças aéreas europeias. Sobre o impacto industrial e económico do programa F-35 em Portugal, os responsáveis da Lockheed Martin foram muito menos expansivos. Os suecos da SAAB fizeram parcerias com a Critical Software e com as OGMA - que se vão manter mesmo que o Gripen não seja escolhido. Já os americanos dizem que já têm estado a trabalhar com empresas portuguesas (que se escusaram a revelar), dizem que estão prontos para ter um impacto nos restantes ramos das forças armadas (Exército e Marinha) e até no espacial , mas tudo só virá se o F-35 for escolhido. “Primeiro a disparar, último a aterrar”A frase do piloto de F-35 Carlton “Puff” Wilson diz bem o orgulho que os americanos têm no seu caça. “Face à performance que o avião tem, é difícil ser modesto”, disse aos jornalistas na sua apresentação. O piloto, com extensa carreira nos Marines (que também têm forças aéreas, caças de asa fixa e helicópteros), descreveu como, a bordo, apenas tem de se concentrar no combate e na missão, com os sistemas do F-35 a cuidarem automaticamente de várias tarefas menores que antes retiravam atenção. a tecnologia furtiva, que inclui armamento recolhido dentro da fuselagem, faz o resto. “O inimigo não sabe que estamos ali até ao momento em que é atingido. Se eu tivesse de por um amigo meu dentro de um avião, entre um F-35 e outro, não hesitaria”, disse ao DN à margem do evento. O caça americano também se gaba de uma maior autonomia, cumprindo a missão e ficando em voo mais tempo do que os concorrentes. Por isso surgiu o lema “primeiro a disparar” (e às vezes, o único a disparar) e “o último a aterrar” (por vezes também o único, face ao “destino” do adversário). O elefante na sala do F-35, claro, é o preço. No briefing aos jornalistas em Lisboa não foi exceção, com os representantes da Lockheed a serem confrontados com projeções de 5,5 mil milhões de euros por 27 aparelhos. A empresa recusa abordar os números, mas dá várias informações de contexto. “O preço é estabelecido entre governos. Portanto, a Lockheed Martin não tem e não divulga esse preço. Porque quem o faz é o Governo dos EUA”, disparou Gregory Day. O gestor da Lockheed citou a análise de mercado competitiva que a Bélgica fez em 2018, quando comparou todos os concorrentes da quarta geração e os F-35 (5ª geração).“O que os belgas disseram é que o F-35 foi o melhor em todos os sete critérios de pontuação. Desde o ponto de vista das capacidades do avião até à sustentabilidade, por estar integrado no programa F-35. Outra área foi precisamente o custo, aquilo que pergunta. E os belgas disseram que o F-35 foi o melhor em termos de custo”, explicou.E Portugal pode dar-se ao luxo de adquirir estes aparelhos de 5.ª geração? Porque não começar desde já a trabalhar para adquirir os de 6.ª geração?“Fala-se muito da 6.ª geração, mas eu nunca vi voar um aparelho desses. (...) O F-35 é uma plataforma testada e comprovada e é o melhor “, sublinhou Gregory Day, voltando a um dos pontos fortes da proposta americana.“Quando o governo norte-americano recebe uma encomenda de alguém, quando temos contrato, os primeiros aviões chegam tipicamente no prazo de quatro anos. Ou seja, o primeiro ano para o long lead [processo de aquisição de materiais e componentes vitais dos aviões] e três anos para a montagem e entrega. A seguir entramos no pipeline de treino e depois continuamos a desenvolver e a construir aparelhos com o perfil que escolheram. Por isso, é o vosso governo que escolhe quando é que quer receber o primeiro e quando é que quer receber o último caça da encomenda”, explicou..Defesa. Suecos desafiam EUA na venda de caças de guerra a Portugal