É “sem expectativas” de que sejam abordadas questões setoriais no debate parlamentar que terá lugar esta quarta-feira, 27 de agosto, entre o Governo e os partidos, que o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses (LBP), António Nunes, lembrou, em declarações ao DN, que o relatório elaborado em 2024 pela Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) tinha destacado que os incêndios de setembro do ano passado expuseram, “mais uma vez, fragilidades crónicas” no que diz respeito a garantir “capacidade de antecipação, planeamento e comunicação” entre meios. Além disto, este ano, Portugal conta com 249.908 hectares de área ardida, até agora, enquanto no ano passado, no total dos 12 meses, teve apenas 137.651 hectares, segundo os dados do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR).Por agora, o que Luís Montenegro ou qualquer um dos partidos da oposição não levará para o debate, de acordo com António Nunes, serão temas relacionados com “carreira dos bombeiros, refinanciamento das associações, planeamento para atribuição de meios aos bombeiros, estatuto geral do bombeiro e direitos e deveres dos bombeiros voluntários”, porque vai ser “um debate muito político e os assuntos que os bombeiros têm são de ordem operativa ou técnica”, como a reforma do setor..Montenegro dá explicações aos deputados com a CPI à espreita.“Não estou a ver que num debate de urgência sobre os fogos se vá falar sobre o setor dos bombeiros na dimensão que nós precisamos que seja falado”, insiste o representante dos bombeiros, acrescentando que não vai surgir “um anúncio de que será feita qualquer coisa”, até porque, observa, “isso já foi anunciado várias vezes”.No entanto, explica, “a única coisa que eventualmente no meio daquilo pode vir a ser dita é sobre a coordenação e comando no âmbito dos incêndios florestais”, caso alguém leve para o hemiciclo as considerações do relatório do ano passado da AGIF.“Tecnicamente, há falhas de coordenação, quando nós não conseguimos colocar o nosso dispositivo de combate antecipando as situações. Nós estamos sempre a correr atrás do prejuízo e não à frente do prejuízo. Ou seja, é o velho ditado popular, depois da casa roubada, trancas à porta”, analisa António Nunes, sublinhando que até os autarcas já vieram identificar estes problemas.Aposta nos incentivos de fixação no interiorPedrógão Grande é um concelho com uma “área florestal de 90%”, começa por analisar o presidente desta Câmara Municipal, António Lopes, que, entre as propostas que gostaria de ver discutidas no Parlamento, destaca a “área integrada e gestão da paisagem”, porque, acrescenta, “há alguma esperança neste modelo, que será mais potenciado se ele for mais atrativo, se pagarem melhor” aos proprietários.Para além destas propostas, António Lopes destaca a importância “dos condomínios da aldeia”, que são barreiras simultaneamente naturais e criadas contras os incêndios.De acordo com o autarca, são “100 metros” de área que “são limpos” à volta das aldeia e onde são “plantadas espécies autóctones e resilientes ao fogo”.“Este condomínio custa ao município cerca de 50 mil euros. Portanto, é curto, é muito pouco”, nota António Lopes, acabando por explicar que este modelo “obriga o município a suportar as despesas de manutenção durante cinco anos”. No entanto, isto “vai trazer confrontos com os próprios proprietários”, porque poderão questionar o motivo pelo qual se faz num lado e não noutro. Portanto, tem de ser feito de forma generalizada.No meio disto tudo, há terrenos negligenciados, por os proprietários não conseguirem geri-los ou limpá-los, pela idade ou pela ausência. “Não conseguem tirar a rentabilidade desses terrenos, deixam-nos, digamos assim, ao abandono”, explica o autarca.Por tudo isto, continua António Lopes, “o principal problema é a falta de povoamento, de pessoas”.E é uma situação que diz ter tendência para piorar, porque, por exemplo, “qualquer empreendimento turístico envolvido numa floresta verde pode, de um momento para o outro, pode ficar negro [por ação dos incêndios], e isso também desmotiva o turismo”.Incêndios como arma políticaReconhecendo que os incêndios, dada a sua importância, devam ser discutidos em instâncias políticas, como o Parlamento, o investigador de incêndios rurais Xavier Viegas, defende que “não é um tema para ser partidarizado, usado como tema de clivagem e de partição entre grupos ou mentalidades ou entidades”, porque “pode atingir todos os cidadãos, qualquer que seja o seu papel e a sua função”.Por isso, Xavier Viegas apela a que haja “convergência de pontos de vista e de estratégias e de métodos e de modos de fazer”, e que, acima de tudo “não se comece do zero”, e se aprenda com as lições do passado, porque o contrário “pode ser um erro que tem sido cometido por vários países”.“Este é um tema de longo prazo”, afirma, que deve envolver “todas as estruturas da sociedade”. Questionado sobre o que correu mal este ano, por ter ocorrido o maior incêndio florestal registado, apesar de Portugal contar com o maior dispositivo de meios aéreos, o académico diz não haver uma resposta.“Este é um ano diferente de 2017 [quando aconteceu o incêndio de Pedrógão] e há uma semelhança com 2022, em termos de condições naturais, de meteorologia, mas o que estamos a ver em relação ao incêndio do Piódão é que ele realmente iniciou-se numa região muito complicada, do ponto de vista orográfico, e teve propagação em diferentes direções, e em terrenos que eram muito difíceis de controlar”, observa. .Balanço. Execução da despesa em prevenção e combate aos fogos ficou 25% abaixo do previsto.Incêndios de Arganil e Lousã. Um retrato do dia em que “parece que o Diabo andou por ali”.Incêndios. Na Lousã, a esperança dos bombeiros é que a "noite seja boa conselheira"