Os entes queridos "têm um lugar especial, talvez no coração", mas "certamente no cérebro", segundo o neurocientista alemão Winrich Freiwald, um dos distinguidos este ano com o Prémio António Champalimaud de Visão, atribuído pela Fundação Champalimaud..Recentemente, Freiwald, da Universidade norte-americana de Rockefeller, descobriu uma área facial no cérebro especializada no reconhecimento de rostos familiares.."Há áreas especializadas nos nossos cérebros que existem para um propósito, e apenas um propósito: reconhecimento facial. Estas áreas são feitas de células que são seletivas para rostos: respondem de forma diferente, normalmente mais, a rostos do que a outros objetos visuais", explicou à Lusa, acrescentando que diferentes áreas faciais processam caras de modo distinto..Por exemplo, células numa área facial são "muito seletivas para a orientação da cabeça", enquanto numa outra são para a identidade do rosto.."Estas áreas faciais estão ligadas para formar uma rede de processamento facial", sublinhou o neurocientista..Na realidade, segundo Winrich Freiwald, "a forma como o cérebro processa a informação que vem dos olhos sobre o rosto dos outros é surprendentemente simples", apesar de o cérebro e a face dos humanos serem "muito complexos"..Freiwald usa várias técnicas de trabalho, como imagens de ressonância magnética funcional, particularmente utilizadas para fazer o mapeamento da atividade cerebral, para localizar as áreas faciais..Depois de localizadas, as diferentes áreas faciais no cérebro são objeto de registos eletrofisiológicos que permitem perceber como a informação é processada..De acordo com Freiwald, o reconhecimento facial "mantém-se resiliente durante um longo período de tempo, provavelmente devido a alguma redundância no sistema".."Mas quando sucumbe à degeneração, e os entes queridos já não podem ser reconhecidos, é, figurativamente falando, uma primeira morte das nossas ligações sociais", acentuou..Winrich Freiwald admite que a ligação entre a perceção de um rosto e a memória - o reconhecimento de um rosto - acontece numa parte específica do cérebro, onde foi descoberta "uma área facial adicional cheia de células seletivas para pessoas familiares"..Como interage com o "sistema de memória geral" é uma das questões que estão a ser estudadas pela equipa do neurocientista.."Infelizmente, parte do circuito está localizado na zona do cérebro mais afetada por Alzheimer", doença neurodegenerativa, frisou..O laboratório que Winrich Freiwald dirige na Universidade de Rockefeller, focado no reconhecimento facial e na atenção, está a procurar, agora, "compreender como o cérebro gera sentimentos e como são alterados na depressão", depois de ter descoberto "uma área no cérebro que processa expressões emocionais" dos rostos percecionados e uma "rede que controla a formação das expressões faciais"..Freiwald também quer perceber como pessoas com autismo "têm grande dificuldade em reconhecer expressões emocionais nos rostos de outros"..O neurocientista alemão espera poder fazer avanços neste campo juntamente com o neurocientista português Miguel Castelo-Branco, da Universidade de Coimbra, que se tem dedicado ao estudo do autismo, uma perturbação do neurodesenvolvimento que se caracteriza, nomeadamente, por dificuldade na interação e comunicação verbal e não verbal e por comportamentos e pensamentos restritos e repetitivos.."Sei onde o reconhecimento das expressões faciais está a acontecer no cérebro e tenho as ferramentas para compreender como. O meu colega Miguel Castelo-Branco (...) tem ideias de como treinar pessoas com autismo para melhorar o reconhecimento de expressões", disse Winrich Freiwald à Lusa.