A principal empresa visada na Operação Torre de Controlo teria uma “toupeira” na Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), um tenente-coronel piloto-aviador, na reforma desde 2000 e que é avençado deste organismo desde 2011 até ao momento, confirmou o DN junto a fontes judiciais. Este militar foi um dos alvos da operação desta quinta-feira, designada Torre de Controlo, com buscas a organismos públicos - ANAC e o Gabinete Coordenador de Missão no Âmbito dos Incêndios Rurais, localizado no Estado-Maior da Força Aérea - e, pelo menos, a cinco empresas com meios aéreos de combate aos incêndios. Segundo a Procuradoria-Geral da República, foram constituídos 12 arguidos (sete pessoas e cinco empresas). De acordo com os comunicados do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), que dirigiu o inquérito, e da Polícia Judiciária (PJ) que coadjuvou, “em causa estão factos suscetíveis de integrar os crimes corrupção ativa e passiva, burla qualificada, abuso de poder, tráfico de influência, associação criminosa e de fraude fiscal qualificada, através de uma complexa relação, estabelecida pelo menos desde 2022, entre várias sociedades comerciais, sediadas em Portugal, e que têm vindo a controlar a participação nos concursos públicos no âmbito do combate aos incêndios rurais em Portugal, no valor de cerca de 100 milhões de euros”.O tenente-coronel da ANAC, que foi também assessor principal do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes Aeronáuticos (GPIIA), seria a quem os gestores de duas das empresas visadas na investigação - a Helibravo e a sua “empresa-mãe, a Sodarca Group - recorreriam para facilitar a certificação de aeronaves que subcontratavam, fornecendo informações internas sobre o estado dos processos. Ex-presidente da holding da Defesa é um dos alvosPara conseguirem os preços mais elevados, esta rede, que as autoridades classificam de “organização criminosa”, conluiava contra o interesse público nos concursos para a aquisição, manutenção e gestão dos meios aéreos do Estado integrados Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR), combinando valores e deixando intencionalmente que o Estado português ficasse “com carência de meios aéreos” e se sujeitasse “aos subsequentes preços mais elevados destas sociedades comerciais”.Para conseguirem informações privilegiadas sobre os cadernos de encargos, a investigação verificou que as empresas tinham, não só contactos regulares com oficiais militares no ativo com conhecimento sobre estes processos, como procuravam recrutar antigos generais na reserva ou na reforma, ainda com ligações pessoais aos estados-maiores. A Sodarca - empresa que tem como negócio principal a venda de armas e abastece as polícias com pistolas Glock 9mm - tem dois, ambos alvo também das buscas judiciais. .Corrupção no combate a incêndios. Constituídos 12 arguidos, há dois generais e um tenente-coronel suspeitos. Um deles é o major-general Henrique Macedo, ex-presidente do Conselho de Administração da IdD - Portugal Defence, a holding pública de Defesa, que foi nomeado pelo ex-ministro da tutela, Azeredo Lopes. O segundo é o major-general Pedro Salvada, engenheiro aeronáutico da Força Aérea, que passou à reserva em 2021. O último cargo foi o de diretor da Direção de Engenharia e Programas, em cujo exercício esteve envolvido no processo da venda dos caças F-16 à Roménia, que decorreu em 2020, no valor de 130 milhões de euros, que teve a participação de uma empresa israelita que será representada pela Sodarca, dirigida por João Maria Bravo, um empresário identificado nas revistas Visão e Sábado como financiador do partido Chega.Concursos investigadosDe acordo com o portal base.gov, que regista os contratos públicos, só este ano, a Helibravo já celebrou com a Força Aérea quatro contratos no valor de 47 milhões de euros, todos eles por concurso público, para a “disponibilização e locação” de meios aéreos para o DECIR de 2025 a 2027. .Incêndios. Meios de combate são hoje reforçados com quase 9.000 operacionais e 33 meios aéreos. Estes procedimentos estarão entre os 16, dos quais nove por ajuste direto, que o DN sabe terem sido escrutinados na investigação criminal por envolveu as empresas visadas na investigação: além da Helibravo e da Sodarca, a Heliportugal, a Gestifly, a Helifly, a Gesticopter e a Elitellina. Nestes concursos a investigação terá conseguido demonstrar o modus operandi da rede criminosa, quer com o conluio dos preços, quer deixando os concursos desertos para obrigar o Estado a fazer) a preços muito acima do mercado..Incêndios. Proteção Civil admite constrangimentos na coordenação territorial. O DN contactou os visados João Bravo e Henrique Macedo, de quem tem contactos, para confirmar se estavam entre os 12 arguidos, mas estes não responderam. A Força Aérea garantiu que estava “a colaborar ativamente com o DCIAP, promovendo todo o apoio às necessárias diligências”. O Ministério da Defesa Nacional solicitou, entretanto, à Força Aérea “todas as informações disponíveis” sobre este caso, estando aquela entidade militar “a colaborar ativamente com o DCIAP, promovendo todo o apoio às necessárias diligências”. A ANAC esclareceu que “não tem intervenção direta nos concursos públicos relacionados com a seleção dos operadores aéreos para efeitos de integração no DECIR, mas enquanto regulador do setor, está naturalmente a prestar total colaboração com as autoridades judiciais na concretização das diligências em curso e na prestação de esclarecimentos técnicos necessários ao contexto em presença”.