Luís Neves, diretor nacional da Polícia Judiciária (PJ) mostrou-se esta quinta-feira, 13 de novembro, preocupado com o aumento da violência dos traficantes de droga contra as autoridades, notando que as redes de tráfico por via marítima já usam armas de calibre de guerra.“As organizações criminosas estão cada vez mais sofisticadas e, não raras vezes, reativas à violência, à atuação das autoridades. A Guarda Nacional Republicana, nos últimos dois meses, foi confrontada com a utilização de armas de calibre de guerra, com AK 47”, sublinhou Luís Neves.Aquele responsável, que falava na abertura da conferência “Tráfico de Estupefacientes por Via Marítima – As Narcolanchas”, aproveitou a ocasião para homenagear o militar da GNR morto no final de outubro em serviço no Algarve, não por arma de fogo, mas após uma colisão com uma lancha rápida no Rio Guadiana.De acordo com o diretor nacional da PJ, durante muitos anos, os elementos destas redes só utilizavam armas de fogo contra os grupos rivais “que conseguiam ficar na posse da droga uns dos outros”, mas, atualmente, “perdeu-se o respeito pela autoridade” e os próprios agentes de segurança são também vítimas.Segundo Luís Neves, do ponto de vista operacional, estas organizações utilizam embarcações aparentemente legítimas - e também submergíveis e semi-submergíveis -, apoiadas em alto mar por lanchas de grande velocidade que fazem depois o desembarque no continente.“Há muito pouco tempo, com o apoio da Marinha e com o apoio da Força Aérea, a quase 300 a 400 milhas, conseguimos localizar uma destas embarcações e apreender quase duas toneladas de cocaína, sendo certo que nas suas redondezas já existiam várias lanchas rápidas”, exemplificou.De acordo com o responsável, o cenário agora é diferente de há uns anos e as lanchas já não constituem um meio de transporte do norte de África para a Europa: “Já vão a centenas de milhas com combustível, com jerricãs, levam para lá combustível e trazem, para o território europeu, droga”, indicou.Luís Neves referiu, ainda, que atualmente existe uma “macro máfia” no centro e norte da Europa e organizações sediadas sobretudo na Suécia que “aportam elevados níveis de crime”, na sua maioria, de criminalidade violenta.“[…] Falamos de homicídios, de raptos, de utilização de armas de calibre de guerra. Nos últimos anos temos vários homicídios consumados e tentados em Portugal, cometidos por sicários vindos do norte da Europa para aqui fazerem ajustes de contas porque a droga não foi entregue ao seu proprietário”.Relativamente a apreensões de droga, Luís Neves indicou que no ano passado foram apreendidas 23 toneladas de cocaína e sete toneladas de haxixe, para além de centenas de milhares de peças de ‘ectasy’.“Até ao momento, foram apreendidas, este ano, 14 toneladas de cocaína e centenas de indivíduos presos com património e vantagens de lucro apreendidas, através do Gabinete de Recuperação de Ativos”, referiu, acrescentando que em 2024 foram apreendidos mais de sete milhões e meio de euros destes valores.Introdução de cocaína na Europa por via marítima é cada vez mais complexaA introdução de cocaína na Europa por via marítima é cada vez mais complexa, com a droga a ser transportada em submarinos da América Latina e transferida em alto mar para lanchas rápidas que a levam para o continente.De acordo com o diretor da Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes (UNCTE) da Polícia Judiciária (PJ), tem havido um aumento muito significativo do recurso a lanchas rápidas para a recolha em alto mar de “consideráveis quantidades de cocaína” da América Latina.“Estas embarcações vão ao meio do Atlântico, literalmente, para recolher droga que vem noutras embarcações”, disse Artur Vaz, à margem da conferência realizada na PJ de Faro, notando que, antes, estas lanchas eram usadas sobretudo para transportar de haxixe do norte da África para a Península Ibérica.Também presente na conferência, Paulo Silva, chefe de análise no Centro de Análise e Operações Marítimas (MAOC), explicou que a cocaína é carregada em narcossubmarinos que a passam depois para narcolanchas, o que torna complexa a intervenção das autoridades.“Porque, de um lado, temos embarcações, como narcossubmarinos, que são difíceis de detetar, e depois esta cocaína é passada para estas narcolanchas, que têm vários pontos de reabastecimento ao longo do caminho, e portanto, isto torna muito complexa a interceção destas embarcações”, referiu.Segundo o responsável, no caso dos narcossubmarinos, estes são carregados ou à saída dos sítios onde são construídos, ou no lugar onde são construídos, nomeadamente na América do Sul, e a rota é muitas vezes direta para a Europa.“Estamos a ver efetivamente estas lanchas que são muito bem equipadas a ir cada vez mais longe, estamos a falar em alguns casos de mais de 100 milhas náuticas, portanto são capazes de sair da Península Ibérica e passar a zona dos Açores e da Madeira”, ilustrou.De acordo com Paulo Silva, um dos países onde se constroem estas embarcações é a Colômbia, existindo já casos de semi submersíveis autopropulsionados (SPSS) construídos no Brasil, e também na Venezuela, independentemente de carregarem a droga ao largo de outros países, como o Suriname, por exemplo.A conferência que esta quinta-feira decorreu na Diretoria do Sul da PJ, em Faro, contou com a participação de diversas entidades nacionais e internacionais, tendo como objetivo a definição de estratégias para uma atuação mais eficaz das autoridades na prevenção e repressão do fenómeno.