Vindima na Região dos Vinhos Verdes.
Vindima na Região dos Vinhos Verdes. FOTO: Miguel Pereira/Global Imagens

Corrupção no vinho verde. PJ faz oito detenções no norte do país

Há quatro detidos da Divisão de Fiscalização e Controlo da Comissão que certifica o vinho verde e quatro empresários do setor de produção e distribuição. Em causa estão crimes de corrupção.
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Na operação realizada na manhã desta quarta-feira, na zona norte do país, a Polícia Judiciária (PJ) deteve oito pessoas, suspeitas de crimes de corrupção ativa e passiva, falsificação de documentos e abuso de poder.

O DN sabe que o alegado esquema passaria pela utilização de uvas de fora da região demarcada para produzir o vinho verde como se fosse de origem.

De acordo com a PJ foram realizadas 21 buscas domiciliárias e não domiciliárias, incluindo na sede da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV).

Segundo a mesma fonte oficial, a investigação, iniciada em agosto último, teve origem numa denúncia sobre um alegado esquema de conluio entre funcionários da Comissão e empresários do setor vinícola, com vista ao favorecimento destes, designadamente, mediante a omissão dos deveres de fiscalização da origem e trânsito das uvas e seu depósito em adegas e produtores durante a vindima de 2025.

Esta Comissão tem funções de controlo da produção e comércio e de certificação dos produtos vinícolas com direito a atribuição de DO (Denominação de Origem) e à IG (Indicação Geográfica), bem como a empresas relacionadas com a produção e comercialização de vinhos.

A PJ sublinha que, com esta conduta foi "colocado em risco o processo de certificação da qualidade do vinho com DO, que confere e atesta a sua origem, as castas utilizadas, os processos de tratamento da vinha, vinificação e estágios, que caracterizam os vinhos de uma determinada DO e os distinguem dos restantes".

O objetivo dos suspeitos seria beneficiar certos operadores económicos através da oferta e aceitação de vantagens, tanto em bens como em dinheiro.

Os detidos são quatro membros da Divisão de Fiscalização e Controlo da CVRVV e quatro empresários do setor de produção e distribuição de vinhos verdes.

A Diretoria do Norte da PJ dirigiu o inquérito que "visou detetar e recolher provas sobre o esquema referido, confirmar se houve violação das regras da certificação e impedimento do reforço da fiscalização, vindo as práticas detetadas a mostrar-se complexas e de muito difícil deteção não obstante os esforços da Direção da Comissão e de operações especiais de fiscalização conduzidas pela GNR e ASAE".

No decurso da Operação “Puro Verde” foram constituídos arguidos 17 pessoas singulares e coletivas e apreendidos bens em espécie e numerário.

Os detidos vão ser presentes à competente autoridade judiciária no Tribunal de Instrução Criminal do Porto para primeiro interrogatório judicial de arguido detido e aplicação das medidas de coação tidas por adequadas.

Comissão dos Vinhos Verdes garante colaboração "absoluta e interessada" com a PJ

Dora Simões, presidente da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes, garantiu a colaboração "absoluta e interessada" com as autoridades.

"Colaboração absoluta a interessada. Temos interesse em que as coisas sejam averiguadas da melhor forma e o mais rapidamente possível", disse à Lusa.

"Hoje de manhã, quando chegámos à Comissão, tínhamos a Polícia Judiciária na porta e estão a ser feitas buscas na comissão, e alguns elementos que trabalham na comissão foram detidos para averiguações", descreveu Dora Simões à Lusa, que diz ter sido "absolutamente" apanhada de surpresa com a investigação e garantiu não ter "conhecimento de nada em particular". Nesse sentido, assegurou que as autoridades terão "acesso a toda a informação de que necessitam para evoluir no processo".

"Nós próprios também somos parte interessada em perceber o que é que existe, e se existe alguma coisa", vincou, dizendo não ter ainda informações sobre a proveniência geográfica das empresas envolvidas.

Reconhecendo que este "é um momento exigente, difícil no setor do vinho", e que "é natural que possa haver uma situação de suspeição", considerou que é obrigação da CVRVV "colaborar e prestar o melhor serviço para que, no melhor interesse da comissão e da Região dos Vinhos Verdes, se poder fazer essa averiguação".

Questionada sobre se será tomada alguma medida sancionatória sobre os funcionários detidos, Dora Simões afastou, para já, essa possibilidade por desconhecer "o teor do processo".

"Sabemos que tem a ver com a fiscalização, mas de resto não sabemos mais nada. Portanto, estamos a dar acesso a tudo o que nos é pedido para que possam averiguar o que for necessário", concluiu.

Num comunicado entretanto enviado às redações, a CVRVV afirma que também "está a colaborar com o Ministério Público" e está "empenhada em apurar responsabilidades e esclarecer quaisquer questões que decorram da investigação".

Refere ainda que "continuará a trabalhar para que a rastreabilidade e a certificação do Vinho Verde sejam o mais rigorosas possível, cumprindo com os objectivos definidos" e lamenta que "este tipo de denúncias seja, sobretudo, lesivo para o trabalho sério de mais de 12 mil viticultores e mais de 400 engarrafadores, com um impacto fortíssimo na imagem da marca Vinho Verde e no trabalho sério desenvolvido pela Região".

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