Os focos simultâneos de incêndio registados desde domingo trazem à tona a memória de outubro de 2017, quando 51 pessoas morreram vítimas de um enorme fogo que atingia mais de 500 localidades ao mesmo tempo. Mas, o que se aprendeu com esta tragédia, sete anos depois e novamente com vários focos de incêndio ao mesmo tempo no país (sobretudo no distrito de Aveiro, mas também no do Porto), já com dois mortos a lamentar, pessoas feridas, moradores deslocados e várias estradas cortadas?.Para o investigador Miguel Almeida, da Universidade de Coimbra (UC), houve lições retiradas daquele ano, mas há ainda caminho a fazer. “Desde 2017 temos vindo a fazer um esforço muito maior na prevenção, e considero que continuamos assim numa tendência crescente, mas penso, contudo, que os cidadãos e o estado podem fazer mais”, diz ao DN..Já o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, António Nunes, afirma que “pelos vistos” não se aprendeu muito com o passado recente. “Há umas lições dadas, mas há uma distância muito grande entre saber o que é que se passou e aquilo que é possível fazer do ponto de vista da modernização técnica. Este talvez tenha sido o problema”, avalia..Ao DN, Nunes cita a necessidade de “modernização tecnológica, gestão de meios, sistema de comando e controlo dos bombeiros e nova organização de fomento aos meios municipais”, além de defender a “descentralização do poder de decisão e não a concentração da decisão”..A análise do presidente dos bombeiros, baseada no trabalho no terreno e no conhecimento técnico, vai ao encontro da visão do investigador, que, inclusive, acaba de lançar um livro técnico intitulado A Gestão do Risco de Incêndio Rural. Ambos concordam que a descentralização e atenção às populações rurais devem ser levadas em conta. “As comunidades estão muito pouco preparadas para este tipo de catástrofe, pouquíssimas têm um plano familiar de proteção, algo que todas as comunidades precisam”, analisa Miguel Almeida..No terreno, quem está a viver na pele o problema também sente as dificuldades da atual abordagem de combate aos incêndios. A situação é “muito dificultada” pela “estrutura de comando muito difusa”, destaca ao DN José Ribau Esteves, presidente da Câmara Municipal de Aveiro..“Não podemos andar sempre num passa-culpas, é preciso uma abordagem nacional e diferente. Não precisamos de mais leis, mas sim de autoridade para atuar em situações como esta. Não faz grande sentido precisarmos intervir em terrenos e não termos autorização para entrar nesses locais para retirar pessoas”, complementa. Apesar de ter sido acionado o plano municipal, o autarca diz que não havia mais helicópteros para combater as chamas, porque um “estava avariado”..Mais de 5 mil operacionais.Os incêndios que mais preocupam as autoridades são os que estão a deflagrar entre a Área Metropolitana do Porto e a Região de Aveiro, em Albergaria-a-Velha, Oliveira de Azeméis e Sever do Vouga, afirmou o Comandante Nacional da Proteção Civil, André Fernandes, em conferência de imprensa na noite de segunda-feira. A área ardida pode chegar a 30 mil hectares. Estão mobilizados mais de 5 mil operacionais no total e Portugal conta com apoio da União Europeia através do Mecanismo Europeu de Proteção Civil. Oito aviões Canadairs foram disponibilizados, sendo que dois já estão no país e realizaram 20 descargas de água. Os demais devem chegar ao território esta terça-feira durante a tarde..Em Albergaria-a-Velha pelo menos 70 pessoas foram retiradas de casa e as aulas foram suspensas. Também nessa localidade uma pessoa morreu carbonizada, sendo um trabalhador brasileiro de 28 anos que não conseguiu fugir das chamas a tempo enquanto tentava recuperar máquinas na zona de incêndio. A outra vítima fatal foi um bombeiro que sofreu um ataque cardíaco..amanda.lima@dn.pt