Quem entra no atelier detém-se perante o sussurrar dos pinceis e de lápis a riscar freneticamente em folhas de papel cavalinho que os presentes têm à sua frente. Dos cinco na sala, só Bernardo rompe o silêncio: “olha como te chamas?” É um dado importante para ele, que, em primeiro lugar, faz questão de repetir o seu nome completo, mas aparentemente esta é uma informação com relevância para os outros, que pousam utensílios enquanto esperam o desfecho da súbita conversa.
De focados, ou melhor “completamente focados no seu trabalho” passam para um estado momentâneo de pausa e curiosidade. Como nos explica Daniela Gomes, monitora do Atelier de Artes Plásticas do CERCICA, a Cooperativa de Educação, Reabilitação e Capacitação para a Inclusão em Cascais, este é um grupo diverso, mas que partilha entre si silêncios e a curiosidade.
Curiosidade por quem chega, por quem aqui passa ou apenas pelo trabalho uns dos outros. Como o Gonçalo, que apesar de pouco falar não deixa de atentamente perscrutar o trabalho dos companheiros. São quase quarenta artistas que partilham este espaço e que se realizam nestas folhas numa sala preenchida por desenhos e cor.
Nesta manhã, 18 junho, dia que há duas décadas reconhece o potencial inato em todas as pessoas, incluindo aquelas no espectro do autismo, estes artistas também partilham esse pequeno detalhe: o autismo. Não que faça diferença, independentemente de eventuais condicionantes alguns são reconhecidos pelo público em geral mas também pelos seus pares artistas. Como José Jorge Monteiro, que partilhou carros em três dimensões e cidades infinitamente geométricas, numa exposição conjunta com o pintor João Louro, ou o Filipe Cerqueira, que, num estilo bem-humorado de cultura pop, tem diversas colaborações com artistas consagrados.
Num desejo de partilha com a comunidade, o atelier vai abrir portas a todos no novo centro social na Parede no próximo dia 27 junho. Um projeto da responsabilidade da Câmara Municipal de Cascais. Apesar de ser bom recordar a pergunta de Filipe Cerqueira a Phillipe Starck, durante a visita do mítico designer francês de quem fez uma série de desenhos bem-humorados, “a ti também te cansam as pessoas?”.