Tudo correu bem, porque setor se organizou para resolver situações de stress. Mas apagão é um alerta, diz bastonário.
Tudo correu bem, porque setor se organizou para resolver situações de stress. Mas apagão é um alerta, diz bastonário.

Apagão poderia levar a "corte de medicamentos”. Farmacêuticos dizem que não há "reserva estratégica"

Uma semana depois do corte energético, bastonário dos Farmacêuticos diz que setor está isolado. "Não integra plano de contingência da Saúde", quando “todas as estruturas deveriam atuar em rede”.
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O setor farmacêutico esteve sempre a monitorizar o seu funcionamento durante o corte energético e de comunicações, que durou mais de 11 horas em Portugal, no passado dia 28 de abril. Aliás, e segundo explica ao DN o bastonário dos Farmacêuticos, Hélder Mota Filipe, “foi todo o circuito farmacêutico que esteve a ser monitorizado, da produção à distribuição, porque se não chegarem medicamentos às farmácias, mesmo que estas estejam a funcionar, não se consegue responder às necessidades dos utentes”.

Mas, uma semana depois do apagão, e apesar de “o balanço que fazemos ser positivo”, há problemas que permanecem e que “devem ser levados muito a sério”, destaca o bastonário, que, ao DN, se queixou de o setor continuar isolado de qualquer plano de contingência nacional ou da área da Saúde para situações de emergência e da falta de “uma reserva estratégica nacional de medicamentos”.

Hélder Mota Filipe afirma mesmo que “se o apagão tivesse durado 24 horas, 48 ou 72, como inicialmente se previa, haveria um corte no fornecimento dos medicamentos. As situações que agora conseguiram ser bem geridas, tornavam-se mais problemáticas”.

Para o bastonário, “as farmácias conseguiram manter-se em funcionamento porque têm uma das melhores redes europeias a nível informático e de comunicação”, mas, tal, não impediu que “houvesse situações de stress”.

Ao DN especificou que “houve dificuldade no acesso às receitas eletrónicas e só através do guia de tratamento que muitos doentes trazem foi possível vender medicamentos”. Mas não só. Houve ainda dificuldade na leitura de preço dos medicamentos, sobretudo quando estes não faziam já parte da ficha do utente, porque as embalagens não indicam o preço, e sem este não poderia efetuar-se a venda.

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No entanto, e como salienta o bastonário dos farmacêuticos, “o maior problema foi com os medicamentos que necessitam de frio”. Situações que, como confirmou, também “só foram possíveis de resolver porque houve uma colaboração muito grande entre farmácias comunitárias e hospitalares. E, nalgumas situações, entre farmácias comunitárias e autarquias, no sentido de garantirem energia para a rede frio, senão teria sido impossível”.

O representante da classe não tem dúvidas de que o apagão foi um aviso para Portugal em relação a dois temas, que são recorrentes, sempre que há situações de emergência, como aconteceu com a pandemia da covid-19, mas que, depois, não se faz para que haja mudanças. E explica porquê: “Há muitos anos que se fala de um Plano de Contingência Nacional para a Saúde que integre as farmácias, mas este não existe. Até pode aparecer alguém com um papel a dizer que sim, mas, na prática não existe. O setor farmacêutico está isolado, não integra qualquer plano de contingência.” Mais grave ainda: “Também se fala, há muito, na criação de uma Reserva Estratégica Nacional de Medicamentos. Recentemente voltou a falar-se, com a pandemia, mas até agora nada foi feito”.

Por tudo isto, o bastonário defende que ainda “há muita margem de progressão no sentido de se melhorar a forma como o país está organizado para responder a situações como a do apagão. Imagine que era um terramoto, como é que o país iria responder na área do medicamento?”.

Hélder Mota Filipe volta a reforçar que se “as coisas correram bem há uma semana, só se deve à organização de cada uma das estruturas, e por haver um plano onde todas as estruturas de um setor estão incluídas”. Ou seja, “um Plano Nacional de Contingência para a área da Saúde, onde esteja definido o papel de cada uma das estruturas desta área, que no caso do setor farmacêutico, vai da produção à distribuição e venda”.

“Setor da Saúde tem de funcionar articuladamente”

Para o bastonário é “fundamental que o setor da Saúde funcione em rede, de forma articulada, incluindo todo o circuito do medicamento”, destacando que, “ se alguém vier dizer que há um plano, é mentira. Na prática, este não existe. Se existe, ninguém tem conhecimento. Nesta situação específica, cada setor organizou-se da melhor maneira possível, um bocadinho à portuguesa, no sentido de: ‘Vamos fazer o que sabemos’.”

Além da necessidade de o setor farmacêutico integrar um Plano de Contingência Nacional para a Saúde, Hélder Mota Filipe alerta ainda para a necessidade urgente da criação de uma Reserva Estratégica de Medicamentos, assumindo que “é uma luta [sua] de há muitos anos”. Até porque, sublinha, “um país civilizado tem de ter uma reserva estratégica para situações de emergência, porque se os medicamentos não chegarem às farmácias haverá disrrupção no fornecimento”. Portanto, “é importante que se leve a sério o que se passou”.

Questionado sobre a razão por que ainda não terá sido criada esta reserva estratégica e se ainda nenhum Ministério da Saúde se interessou pelo assunto, o bastonário deixa claro que “todos os ministérios se interessam, mas ninguém faz nada. Se falarmos da existência de uma Reserva Estratégica Nacional de Medicamentos a qualquer ministro, todos eles vão dizer que é fundamental. Se for preciso até dizem que há vacinas guardadas, mas isso não é uma reserva estratégica”.

Senão, numa situação de emergência como se tratam doentes crónicos? Como se tratam doentes oncológicos ou como se respondem às necessidades da população? A inexistência de “uma reserva estratégica é um problema nacional”.

Hélder Mota Filipe critica mesmo, e porque estamos em campanha nacional, que este tema não seja discutido. “Olhei para os programas dos partidos todos e nenhum deles tem este tema incluído e deveríamos levar muito a sério o aviso que o apagão nos deixou”, conclui.

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