A última bomba contra a ditadura
A notícia do rebentamento de uma bomba nos porões do Niassa - navio utilizado no transporte de tropas para a Guerra Colonial que se preparava para largar de Lisboa para a Guiné - não mereceu mais do que uma tímida foto ao fundo da primeira página. Não podia ser de outra maneira.
A censura continuava impiedosa. O chefe do Governo, Marcello Caetano, prometera acabar com a mordaça quando, em 1968, sucedeu a Salazar -, mas só lhe mudou o nome: a censura passou a chamar-se “exame prévio”.
A história que o DN então não contou contamo-la agora: o atentado à bomba contra o navio, pronto para zarpar rumo à Guiné com o Batalhão de Caçadores 4610, foi executado pelas Brigadas Revolucionárias (BR) - o grupo fundado por Carlos Antunes e Isabel do Carmo que, entre 1971 e 1974, levou a cabo ações de luta armada contra o Regime do Estado Novo.
A bomba no Niassa foi a última contra a ditadura. Mas as primícias da ação direta pertencem ao PCP, através da Ação Revolucionária Armada (ARA), fundada em 1970 e dirigida por um comando central de que faziam parte Jaime Serra, Francisco Miguel e Raimundo Narciso. Fez-se anunciar, em outubro de 1970, com uma bomba no Cunene, navio de transporte de material ao serviço das unidades militares que combatiam em África. A operação foi executado por Gabriel Pedro, que tinha passado pelas prisões de Angra do Heroísmo e do Tarrafal, e pelo jornalista Carlos Coutinho.
Entre outubro de 1970 e janeiro de 1974, a Ação Revolucionária Armada e as Brigadas Revolucionárias dividiram-se na luta armada com vista ao derrube do regime. Levaram a cabo, por junto, dez operações: ataque ao navio Cunene, explosão no Centro Cultural da Embaixada dos EUA, destruição da frota de helicópteros na Base Aérea de Tancos, corte total das comunicações radiotelegráficas e telefónicas durante reunião de altos-comandos da NATO em Lisboa, ataque ao quartel-general do Comi- berlant em Lisboa (todas executadas pela ARA) e uma bomba na Base da NATO, na Fonte da Telha, destruição de 15 camiões Berliet que se destinavam à Guerra Colonial, bomba no quartel-general em Bissau, bomba nos porões do Niassa.