Se Matilde ficar abaixo do 16 a Português só pode ter sido por distração
É de enunciado em riste que Matilde Costa confirmava com os colegas alguns detalhes do exame de Português que acabou cinco minutos antes. E reforçava a confiança num "16 ou 17". Admitia que a prova fora "facílima", apesar de ter saído "o Camões lírico", que, à partida, não era do seu agrado. "Mas se tiver má nota só pode ser distração. E acho que estive sempre concentrada", afirmava a jovem, que quer seguir música, em tom confiante à porta da Escola Secundária de Bocage, em Setúbal, onde cerca de duas dezenas de alunos partilhavam otimismo. Já os professores divergem na apreciação do exame.
Estava assim terminada a prova que assinalou o início da época de exames do 12.º ano - para a qual estão inscritos cerca de 76 mil alunos - numa escola onde a maioria dos alunos dispensou os 30 minutos de tolerância. As duas horas bastaram para que Matilde e os colegas concluíssem a prova "nas calmas". "Até estava com medo que nos dificultassem a vida e acabei por estudar muito. Mas se calhar também foi por isso que a prova me pareceu tão fácil", sublinhava ao DN.
Os docentes travam o otimismo. A Associação Nacional de Professores de Português (ANPROPORT) diz que o exame tem nível de "exigência elevado", com características que "condicionarão os resultados dos examinandos". A associação justifica que a prova não está totalmente equilibrada "no que diz respeito aos objetivos de referência", admitindo que o facto de a maioria dos alunos ter utilizado o tempo de tolerância "talvez seja indiciador desta característica da prova".
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A ANPROPORT alerta para um "predomínio excessivo da leitura (12 valores) em relação ao funcionamento da língua (3 valores), não sendo os conteúdos gramaticais representativos da matéria indicada no Programa do Ensino Secundário". Acrescenta que a prova apresenta uma "boa seleção de textos".
Já a presidente da Associação de Professores de Português (AAP), Edviges Ferreira, considera, pelo contrário, que a prova se pautou pelo "equilíbrio e objetividade", dando o exemplo do segundo grupo, onde as questões obrigavam a uma leitura atenta do texto de Carlos Fiolhais "que é expectável em alunos do 12.º ano". Acrescenta que as questões "estavam corretamente formuladas, não devendo haver, da parte dos alunos, hesitação na escolha da alínea correta".
Os alunos da escola sadina admitiam que os dois textos de interpretação - um excerto de Felizmente Há Luar e um soneto de Camões - tinham um grau "aceitável" de dificuldade, embora Gonçalo Matias, que quer seguir edição de vídeo, precisando da nota de Português para uma média de 15, tenha apontado este exame como "mais complicado" face ao do ano passado. "Havia uma parte mais abstrata, que falava da educação e como é relevante a educação, a paz, liberdade e justiça. O texto do ano passado era mais direto e aqui era necessário pensarmos mais por nós mesmos. Estamos pouco habituados a esse sistema", justificava o jovem, concordando que o facto de o excerto do Felizmente Há Luar ser lido em aula e de o soneto de Camões ser representativo do programa de 12.º ano "não criou confusão em termos de estudo".
De sorriso largo e otimista estava Fernanda Farias, ainda aluna da escola do Bocage. "Tive medo do Memorial do Convento (de José Saramago), mas assim que vi Felizmente Há Luar (de Luís de Sttau Monteiro) fiquei mais descansada e confiante", resumiu esta jovem. Os estudantes não admitiam "má nota", embora Gabriel Sousa optasse por não lançar palpites. "Cada vez que digo uma nota tenho um resultado abaixo do que esperava", justificava, admitindo que entrou "nervoso" na escola e à espera de "encontrar um bicho-de-sete-cabeças", mas acalmou-se assim que leu a prova.
Em paralelo com a prova de Português decorreu ainda o exame de Português Língua Não Materna e à tarde foi a vez da Filosofia para o 11.º ano, cujos alunos também serão chamados sexta-feira para as provas de Física e Química e Geografia, enquanto à tarde será a vez da História da Cultura e das Artes. A prova de Matemática para o 12.º ano será a 23 de junho.