Itália envia a Portugal novas provas contra espião do SIS
Os investigadores acreditam que o material apreendido ao espião russo vai sustentar a acusação contra Carvalhão Gil
Todo o material apreendido ao espião russo quando foi detido em Itália, juntamente com o agente português do Serviço de Informações de Segurança (SIS), vai ser entregue pelas autoridades italianas a Portugal. Os investigadores da Unidade Nacional de Contraterrorismo (UNCT) da PJ e os procuradores do Ministério Público titulares do inquérito acreditam que a acusação de espionagem contra Frederico Carvalhão Gil ficará sustentada de forma irrefutável.
A decisão de Itália surge depois de uma intervenção da Eurojust, a agência europeia para a cooperação judiciária, que tem acompanhado o processo e esteve na origem dos mandados de detenção europeia contra Carvalhão Gil e Sergey Nicolaevich Pozdnyakov, que levaram à operação "Top Secret" em Roma, em 21 de maio de 2016.
Conforme o DN noticiou em novembro passado, as autoridades italianas, que libertaram o russo, alegado agente da SVR (as secretas externas, ex-KGB) logo em julho sem o deixar ser interrogado pela investigação portuguesa, recusavam-se a enviar esse material e com isso colocavam em risco a acusação contra o espião português. A UNCT já tem consigo os documentos que estavam com o espião do SIS quando foi detido em flagrante, entre os quais um relatório da NATO, classificado como secreto (nunca podia ter saído das instalações das secretas) e 10 mil euros, alegadamente o pagamento pela venda das informações ao russo.
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Mas o material apreendido ao russo pela polícia italiana, que executou a operação, era considerado fundamental para provar a transação e a posse de documentos classificados portugueses e da NATO, que só lhe poderiam ter chegado através de Carvalhão Gil. Em causa está a prova para crimes de espionagem, corrupção e violação de segredo de Estado.
Recorde-se que a defesa de Carvalhão Gil alegou que o encontro com o russo tinha como objetivo a criação de uma empresa de exportação de azeite português para a Rússia. Até agora nenhuma prova surgiu dessa intenção.
Nos últimos meses, os membros italiano e português da Eurojust promoveram contactos entre as entidades de ambos os países envolvidas nas investigações e conseguiram que os italianos cumprissem o estabelecido para estes casos: toda a cooperação com o país que desencadeia a investigação, neste caso Portugal . "Itália considera a cooperação com as autoridades portuguesas muito positiva e eficiente, como sempre", sublinhou ao DN o representante italiano na Eurojust.
A mesma avaliação positiva do seu colega italiano faz o membro português da agência europeia. "Considero que a cooperação com as autoridades italianas obteve um sucesso total, tendo em conta as circunstâncias do caso", salientou António Cluny. Outro exemplo dessa cooperação foi o caso da ex-espia da CIA, Sabrina Sousa, ontem libertada e que tinha sido detida, também pela UNCT, para cumprir uma pena de prisão em Itália.
Frederico Carvalhão Gil, 58 anos, espião do SIS há mais de 30, passou por vários departamentos, entre os quais o de contraespionagem e o de contraterrorismo. É casado com uma cidadã georgiana e nunca escondeu as suas preferências por aquela região. No facebook publicava imagens dessas suas viagens (foto em cima).
Nas buscas que a PJ fez em sua casa, depois de ter sido detido em Itália, foram encontrados vários documentos, em papel e em suporte eletrónico, com classificação de secreto, que tinha trazido do SIS, sem autorização. Quando já estava sob suspeita e a ser alvo de investigação foram-lhe retiradas algumas permissões de acesso a bases de dados dos serviços de informações, mas o facto de ter conseguido retirá-los do sistema, levou a que fosse também investigada a possível cumplicidade de alguém que, mesmo não tendo conhecimento do fim a que se destinavam os documentos, os facultou ao "velho" espião.
O espião está detido em casa com pulseira eletrónica desde junho passado, uma semana depois de ter sido extraditado por Itália. O MP contestou a decisão do juiz de instrução Ivo Rosa, que não proibiu sequer Carvalhão Gil de falar com o cúmplice russo e concertar com ele a defesa. O Tribunal de Relação concordou com o protesto do MP, mas manteve o espião em casa.