Ideia de criar quotas para professores doentes deve cair ainda antes de nascer

Proposta da tutela, muito contestada, previa que cada agrupamento pudesse dar destacamento por doença a cinco professores
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A ideia de introduzir quotas, prioridades e até considerar a graduação profissional na concessão dos destacamentos por doença - a possibilidade de os professores serem colocados perto das suas residências ou de familiares próximos devido a problemas de saúde próprios ou de familiares - não deverá passar disso mesmo. Perante a contestação generalizada dos parceiros educativos, o Ministério da Educação já deixa em aberto a hipótese de um recuo completo nesta medida controversa.
"A questão das quotas foi sinalizada por todos os parceiros", reconheceu ao DN fonte oficial do Ministério da Educação. "Nesse sentido, essa é uma questão que não está fechada e é um dos temas que estarão efetivamente em aberto na negociação que vai acontecer nos próximos dias."
No projeto de despacho sobre a Mobilidade por Doença (MPD) - que não chegou a ser debatido com os sindicatos na semana passada, porque as reuniões previstas tiveram de ser adiadas - o ministério pretendia estipular uma quota máxima de cinco destacamentos por cada agrupamento de escolas. A lógica seria tentar evitar situações de recurso abusivo a este modelo. E o número foi apurado com base no raciocínio de que uma quota de cinco professores por escola equivaleria e 4000 destacamentos, existindo no atual ano letivo cerca de 3600 professores nesta situação.
Mas como a generalidade dos sindicatos e outros parceiros rapidamente explicaram, as doenças não se distribuem numa lógica aritmética: "As pessoas não estão distribuídas cinco por cada local. Seguir esse raciocínio leva a situações muito complicadas", disse ao DN Mário Nogueira, secretário--geral da Fenprof, antes de o ministério ter confirmado que esta ideia poderá cair. "A mobilidade tem de ser uma coisa indiscutível. E isso passa pela forma como os casos são verificados e confirmados", considerou. "Mas verificando-se a veracidade da situação não se pode aplicar quotas."
O sindicalista lembrou, por exemplo, que muitos dos casos de destacamento por doença envolvem a aproximação destes professores aos grandes centros urbanos. Mas que isso tem uma explicação: "Não estamos normalmente a falar de gripes ou de pernas partidas. Estamos a falar de doenças graves, nomeadamente oncológicas, e é nas grandes cidades que há uma concentração dos serviços prestados a quem sofre dessas doenças."
Júlia Azevedo, do Sindicato Independente doas Professores e Educadores (SIPE), defendeu ao DN que este é um diploma "cego", nomeadamente por tratar por igual grandes e pequenos agrupamentos de escolas, onde o número de professores é radicalmente diferente. E criticou também a ideia de serem definidas "prioridades" na atribuição dos destacamentos. Nomeadamente a graduação profissional do professor: "Como é que podem distinguir-se doenças através da graduação profissional? Este é uma tema sensível", considerou. "Sabemos que poderá ter havido abuso no passado, e deve haver uma enorme fiscalização, mas quem está de facto doente deve ter acesso a isto."
A primeira prioridade definida pelo ministério era a doença afetar o próprio professor, só depois surgindo a doença ou a incapacidade de um familiar próximo. Mas mesmo este critério, aparentemente lógico, prestava-se a consequências complexas: "Há professores que não estão eles próprios doentes mas acompanham filhos menores com situações complicadas, como deficiências profundas, ou pais com situações também muito complicadas", ilustrou Mário Nogueira.
Estes critérios deverão também cair a partir do momento em que as quotas deixem de se aplicar. Em vez disso, os sindicatos defendem que todos os atestados médicos "multiusos" - que só existem quando o doente já foi sujeito a juntas médicas ou avaliado por serviços de saúde - devem automaticamente dar lugar à concessão da mobilidade por doença. Em relação às situações que suscitem dúvidas, consideram que estas devem ser esclarecidas pela sujeição a juntas médicas ou outras avaliações consideradas necessárias.
Entre os mais de 3600 professores que no ano passado pediram a mobilidade por doença, mais de 80% fizeram-no em função de doenças próprias. O número elevado de destacamentos para escolas em áreas apetecíveis suscitou dúvidas mas todos os casos avaliados pelo ministério foram comprovados.
"É verdade que o destacamento destes professores, ao preencher lugares em escolas muito pretendidas, acaba por gerar algum mal-estar noutros docentes", admitiu Mário Nogueira. "Mas isso deverá resolver-se atribuindo a estes professores outras funções, como tarefas de apoio e coadjuvação e não a titularidade de turma, ocupando vagas que tinham sido atribuídas a outros."

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