Furto em Tancos. Caixa fora da lista tinha explosivos perigosos
Uma caixa com mais de cem unidades (velas) de explosivo plástico PE4A foi furtada dos paióis de Tancos sem que o Exército tivesse registado a falta do material. A falha foi revelada pelo próprio Chefe de Estado-Maior, segundo o qual tinha aparecido uma "caixa a mais que não constava da relação inicial" entre o material furtado que foi recuperado pela Polícia Judiciária Militar (PJM), no passado dia 18, próximo da Chamusca.
Rovisco Duarte, que falava em conferência de imprensa na Unidade Apoio Geral Material do Exército (UAGME), Benavente, para fazer o ponto da situação da desativação dos Paióis de Tancos, disse aos jornalistas que a caixa continha petardos, considerando que a "ligeira discrepância" é "perfeitamente compreensível". Segundo o tenente-general, o material em causa era utilizado na instrução, podendo ter sido registada a sua saída e não ter sido na realidade consumido por várias razões, como por exemplo atmosféricas, regressando ao paiol.
Na lista de material furtado dos paióis em junho passado, publicamente divulgada, estavam 264 unidades destas velas de explosivo plástico, mas afinal havia mais cem desaparecidas que estavam fora do radar da investigação. Só a sua devolução fez saber que estava em falta. Cada unidade, um cilindro moldável como a plasticina, tem cerca de 200 gramas e é um explosivo militar com capacidade superior ao TNT. Um carro-bomba com apenas cinco quilos deste material faz muitos estragos e vítimas.
Esta caixa não constaria, no entanto, da lista de material furtado que o Exército forneceu à PJM no início da investigação. O DN questionou o gabinete de Rovisco Duarte sobre esta omissão e sobre se havia outro inquérito a decorrer em relação ao extravio destes explosivos, mas não obteve resposta. "O Exército não esclarece questões veiculadas na comunicação social", justificou o porta-voz, remetendo para as declarações do CEME na conferência de imprensa. A PJM não respondeu a nenhuma das perguntas do DN, sobre a discrepância entre o material dado como furtado e o recuperado.
Violação do segredo de justiça?
A lista do material recuperado pela PJM, onde se inclui também esta caixa de explosivos, foi objeto de um auto de apreensão que faz parte do inquérito que ainda decorre, sob coordenação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) do Ministério Público (MP). Este inquérito, segundo a Procuradoria-Geral da República "encontra-se em segredo de justiça". Questionada sobre se a revelação de Rovisco Duarte configura numa violação desse segredo de justiça, a PGR não responde. O Exército alega que "não foi divulgada qualquer informação proveniente do processo de inquérito".
Este novo episódio da já longa e inédita "novela" sobre o furto do material dos paióis de Tancos, deixou perplexos alguns militares, na reserva. "Se já foi mau de mais ter sido furtado todo o material, ainda é pior vir agora o CEME dizer que até foi devolvida pelos bandidos uma caixa a mais, de cuja falta nem tinham reparado. E dizer, ainda por cima, que "é compreensível" é simplesmente muito mau", salienta um oficial de alta patente, que pede o anonimato por ter "muita vergonha pelas Forças Armadas", do que está a acontecer.
Ainda na conferência de imprensa, o Chefe de Estado-Maior do Exército manifestou-se "extremamente satisfeito com o esvaziamento dos paióis de Tancos", admitindo que ao longo dos anos houve "erros estruturais e erros sistémicos" na filosofia seguida pelo Exército quanto às instalações. Por uma questão de "racionalização de meios" e de "gestão de infraestruturas", disse, "não fazia sentido manter" os paióis de Tancos.
Um deputado da comissão de Defesa, que remeteu para hoje eventuais comentários oficiais sobre as declarações de Rovisco Duarte, detetou "alguma contradição" nas palavras do CEME: "Por um lado ele assume que houve erros estruturais e sistémicos, mas, por outro, diz que é compreensível que esta nova caixa não tenha sido registada na lista de material furtado", sublinha. Com Lusa