"O Código de Conduta não são as tábuas de Moisés. Tem que ser atualizado, tem que ser revisto”, explicou ao DN o coordenador do estudo Ética e integridade na política, Luís de Sousa, sobre o diploma que regula o comportamento dos deputados na Assembleia da República (AR). Este será um dos temas em análise na conferência O Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos - 5 Anos Depois, que acontece esta terça-feira no Parlamento, numa altura em que o comportamento dos deputados é discutido, depois de ter havido trocas de ofensas (algumas à margem do debate) entre a bancada do Chega e do PS, durante um plenário. Ainda assim, hoje está em causa o balanço da aplicação desta lei.“O Parlamento tem que se dotar, sobretudo, de uma comissão com mais competências do que as que tem atualmente”, defende Luís de Sousa, ainda que acrescente a ideia de que, “se estas forem executadas na plenitude, já se faz um bom trabalho”. Contudo, o investigador considera que falta todo um trabalho de “fiscalização, de monitorização” das regras. “Se estão ou não estão a ser cumpridas.” Esta é a receita que Luís de Sousa propõe para que o Código de Conduta dos deputados seja aplicado. No fundo, completa, é criar “um regulador da ética parlamentar”.Mas esta é só uma das várias dimensões que estão em discussão quando se fala em estatuto dos políticos. Ainda assim, no que diz respeito ao Parlamento, competem todas à Comissão para a Transparência e os Estatutos Deputados, lembra o investigador.“Não é só a questão quase mais formal do estatuto dos deputados, mas esta dimensão mais dinâmica de gestão de situações, de potenciais conflitos de interesse ou de aparentes conflitos de interesse, que podem prejudicar a imagem do Parlamento e que precisam de ser geridos”, explica, com uma referência à última discussão parlamentar da semana passada, quando o Chega levou ao hemiciclo uma moção de censura ao Governo - chumbada pelos restantes partidos, por considerarem que era uma manobra de diversão em torno dos casos ligados ao partido - por alegado conflito de interesse que envolve o primeiro-ministro e uma empresa familiar com sede na sua casa. “Há situações no Código de Conduta em que os próprios deputados podem sentir que não têm uma noção clara do que é que devem fazer”, lembra Luís de Sousa , como “pedir aconselhamento”. Para além disto, há dados que não são produzidos sobre os políticos e que deveriam estar a ser produzidos e cuja produção e “disponibilização” a “outras entidades parceiras” poderia salvaguardar algumas situações, sendo que a “academia até podia dar um contributo nisto”.Sobre casos em concreto, Luís de Sousa exemplifica: “Se alguém me perguntar quantos deputados de 74 para cá tiveram interesses imobiliários - que é o que tem estado em discussão nas últimas semanas -, eu não sei responder.”Em discussão, estará também se “deve ou não ter um quadro sancionatório”, conclui o investigador.O DN também conversou com o antigo deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira sobre o que está em causa quando se fala em conduta dos deputados. Para o antigo parlamentar, “o ambiente da Assembleia da República degradou-se substancialmente nas últimas legislaturas”, pelo que “é necessário densificar o Código de Conduta e alterar o Regimento, nomeadamente dando mais poderes ao Presidente da Assembleia da República para que se cumpram os princípios que”, na sua perspetiva, “têm sido violados por diferentes incidentes e práticas parlamentares”.O DN questionou o antigo deputado sobre “como é que se legisla a falta de educação”, em alusão a uma pergunta sem resposta deixada em suspenso pelo líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, na sequência do plenário onde se adensaram as trocas de palavras entre bancadas.“Não se legisla a falta de educação”, defende Paulo Trigo Pereira, acrescentando que se pode “dar poder a quem preside a Assembleia da República para fazer a sua interpretação do que é que é tolerável”.Sobre o papel dos presidentes da AR, Paulo Trigo Pereira lembra que podemos encontrar “uma postura mais interventiva, como a que Augusto Santos Silva teve, ou menos, como a de Aguiar-Branco. Esta latitude de comportamentos deriva das coisas não estarem muito claras em relação aos poderes do presidente”, daí a necessidade de “rever o regimento nesse sentido”.