No 10.º dia da campanha, a esquerda quase toda ficou concentrada em Lisboa, mas de costas voltadas e por motivos diferentes. Pedro Nuno Santos garantiu que o PS tem capacidade “para dialogar e para construir soluções duradouras”, mas preferiu remeter a Geringonça para o passado e apostar num apelo ao voto útil, afirmando que o “partido precisa de ganhar as eleições” para criar estabilidade. O Livre criticou a posição do líder socialista e alertou para uma nova crise política, caso um eventual governo minoritário opte por não trazer um “diálogo parlamentar que seja construtivo”.Com a promessa de que, depois de dia 18 de maio, o PS procurará “as soluções de estabilidade”, Pedro Nuno Santos, durante um almoço em Queluz, no quartel dos bombeiros, argumentou que “o que é importante é que” os partidos de esquerda já tiveram “a oportunidade de trabalhar no passado”.“E trabalhámos bem, mas, neste momento, o Partido Socialista precisa de ganhar as eleições”, afirmou, insistindo nesta ideia várias vezes ao longo do dia..A estratégia socialista, segundo o líder do partido, passa assim por “lutar pela vitória”, porque, acrescentou, “de outra forma nós não vamos ter estabilidade”.Em relação ao conteúdo da campanha, e depois de questionado sobre se, após as eleições, continuaria a haver um escrutínio sobre a empresa familiar do primeiro-ministro, o líder do PS preferiu dar “esperança” às pessoas.“É só nisso que eu vou estar concentrado nos próximos dias, dizer às pessoas que é mesmo possível viver melhor em Portugal e que podem confiar em nós, não só neste contexto de incerteza, mas para continuarmos a transformar o país, para aumentarmos salários, para aumentarmos pensões, para reduzirmos o custo de vida, para garantirmos casas e defendermos o Serviço Nacional de Saúde (SNS)”, assegurou durante uma ação de campanha na Ajuda, em Lisboa, que não reuniu mais do que quatro dezenas de pessoas.Mais próximo da terra natal de Pedro Nuno Santos - São João da Madeira -, em Aveiro, Rui Tavares desvalorizou a importância de se chegar primeiro em termos eleitorais, remetendo esse tipo de resultado para o futebol..“O que é preciso é ter uma maioria ou, pelo menos, uma base de apoio parlamentar a um governo que seja coerente e coeso”, afirmou o porta-voz do Livre, sem, no entanto, confirmar se apoiaria um governo minoritário do PS.Rui Tavares definiu como meta para o Livre a governação e não a oposição, classificando o seu partido como “decisivo e de charneira na política portuguesa”.O porta-voz do Livre, que tem sido muito vocal em relação à construção de uma solução governativa à esquerda, disse que a esquerda não tem de comunicar em uníssono, mas tem de ser pragmática e coordenada no momento de encontrar uma maioria.“Isso é o que acontece noutros países europeus e é o que pode acontecer em Portugal, mas, evidentemente, não acontecerá com partidos que não trazem este tipo de atitude para o centro da ação política”, explicou.Sem discussões em torno de propostas concretas, falar sobre cenários de governação não resolverá nada, só “desmobiliza”, afirmou a líder do BE, Mariana Mortágua..“O programa da esquerda não pode ser ir para o Governo, porque depois perguntam-nos: ‘OK, e chegando ao Governo vão fazer o quê?’ Não basta chegar ao Governo, é preciso dizer às pessoas o que é que vamos fazer. E é por isso que estamos aqui a falar sobre habitação”, sustentou a líder bloquista numa ação de campanha na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde esteve acompanhada pela antiga líder do partido Ana Drago.Num exercício semelhante ao que Pedro Nuno Santos fez, de regressar a 2015, quando PCP, BE e PEV viabilizou o primeiro Governo de António Costa, Mariana Mortágua lembrou que a esquerda já se unira “em torno de propostas e programas concretos”.Para sublinhar esta ideia, a líder do BE apelou ao voto no partido, porque, argumentou, isso significa “garantir que a habitação vai estar no Parlamento e que a habitação estará no centro, seja qual for o entendimento ou acordo”, tendo em conta que os partidos “estão condenados a entender-se”.No que diz respeito a entendimentos, o secretário-geral do PCP classificou ontem a aproximação do Livre ao PS como “negociatas”, preferindo, por seu turno, lembrar que os comunistas nunca faltaram “às soluções concretas para a vida das pessoas”.“A nossa história fala por nós. Nós alguma vez falhámos às soluções concretas para a vida das pessoas? Eu até diria assim: se todos fizessem como o PCP e a CDU fizeram sempre, a vida de cada um estaria muito melhor”, garantiu Paulo Raimundo, durante uma arruada em Benfica, antes de criticar Livre e PS pela troca de ideias em torno de eventuais acordos.“O Livre faz apelos ao PS. O PS responde aos apelos do Livre. O que nós apelamos é ao nosso povo, aos trabalhadores, àqueles que trabalharam a vida inteira, à juventude, que provoquem um sobressalto”, justificando que, se o povo provocar esse “sobressalto”, mais gente será arrastada para “este projeto, inclusive a esses que andam agora a fazer apelos uns aos outros”, explicou.Questionado sobre o apelo de Pedro Nuno Santos ao voto útil, Raimundo deixou uma interrogação sobre a ideia.“Como é que um voto que quer deixar tudo rigorosamente na mesma e quer garantir esta alternância entre PS e PSD pode ser considerado um voto útil? Ele pode ser útil para quem o recebe, mas nunca é útil para quem o dá”, concluiu.