O anteprojeto de lei do Governo relativo às alterações laborais, que o executivo apelidou de flexibilização laboral, ainda não foi discutido em concertação social, mas já teve o repúdio de UGT e CGTP e não convence o Partido Socialista. Em conversa com o Diário de Notícias centrada na facilitação dos processos de despedimento, o deputado Miguel Cabrita explica a posição do partido, deixando a entender que a ponte dialogante que José Luís Carneiro expressou ser possível com o PSD não deverá ser feita neste tema. “É mais uma das várias áreas em que o Governo apresenta propostas que são, a nosso ver, muito desequilibradas. Aquilo que o Governo procura fazer, chamando-lhe simplificação, é, sim, simplificar os processos de despedimento. Mas esse processo só fica mais simples para uma das partes, para a outra das partes torna-se tudo mais complicado”, advoga, explicitando: “Durante um processo, há uma fase em que os trabalhadores podem, por um lado, pedir ao patrão provas dos elementos que estão a fundamentar o despedimento e, por outro lado, apresentar testemunhas para, no fundo, contrariar, a decisão. O que o Governo faz é simplificar, muitíssimo, as obrigações relativas a esta fase instrutória. Temos de pensar que o trabalhador está numa situação mais frágil e que não se pode defender”, explica Cabrita, membro do grupo de trabalho do tema. Esta mesma medida poderá ser considerada inconstitucional em caso de aprovação no Parlamento, tal como em 2009, quando o socialista José Sócrates avançou com alterações laborais. O deputado alerta ainda para a perda de poder da Autoridade para as Condições do Trabalho: “A ACT tinha, desde a pandemia, o poder de comunicar ao Ministério Público para que se pudessem acelerar ações para evitar o despedimento. Em casos muito concretos, situações minoritárias. Ganhou um poder que não tinha, que agora pode perder e que, na altura, desencadeou muitas críticas dos empregadores.” Por fim, precisa que o fim do direito à reintegração, em caso de ser invalidada a justa causa, implique que deixe de “ser feita a proteção constitucional ao trabalhador” e que há uma “ameaça clara à segurança dos direitos laborais.”O PS não compreende alterações tão profundas quando “o próprio Governo se vangloria de números de emprego a níveis máximos” e questiona a aplicação desta facilitação da justa causa à maior parte do tecido empresarial português (serão mais de 95% as empresas com menos de 250 trabalhadores, ficam, por isso, de fora as multinacionais). “Não encontramos justificação nem fundamentação”, atira, dando a entender que no Parlamento o PS votará contra o projeto de lei: “O equilíbrio geral da proposta teria de mudar de maneira muito significativa para que pudesse haver algum tipo de diálogo mais consequente com o PS. E, francamente, a nossa expectativa de que o Governo seja disponível para isso é muito diminuta. Até pela maneira como outros partidos de direita se apressaram a vir saudar esta proposta. Não é por acaso que são os partidos de direita e o lado empresarial a saudar esta proposta” Cabrita estranha a “pressa” de Montenegro avançar com o “pacote fechado” ainda sem reunir com a concertação social. Depois de já se ter insurgido anteriormente contra a falta de fundamentação do Governo para uma proposta de alteração na lei laboral relativa à amamentação - justificada pela ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social com alegados abusos dos quais não apresentou evidências - o Partido Socialista enviou uma carta à ministra Maria do Rosário Palma Ramalho, na qual pede a apresentação de dados concretos que justifiquem uma mudança na lei. O PS questiona a base para que Palma Ramalho diga que “ao fim de cinco meses e vinte e nove dias” os empregadores tendem a fazer cessar o contrato, aproveitando-se do período experimental de seis meses concedido pela lei atual; e pede as queixas registadas pela Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e outras que tenham chegado ao Ministério do Trabalho sobre essa matéria ou estudos sobre o impacto das medidas implementadas em 2018. Em causa o alargamento da duração dos contratos a termo certo, de dois para três anos, e a termo incerto de quatro para cinco anos, proposto pelo anteprojeto de lei aprovado em Conselho de Ministros, o que, de acordo com a missiva socialista, aumentam a “precariedade”. Algumas das propostas do projeto de lei:Aumento da duração mínima e máxima dos contratos a termoA duração mínima dos contratos a termo passa dos atuais seis meses para um ano e a duração máxima dos atuais dois para três nos contratos a termo certo e de quatro para cinco anos nos contratos a termo incerto.Despedimento por justa causaA medida prevê que as micro, pequenas e médias empresas possam avançar com despedimentos por justa causa, por factos imputáveis ao trabalhador, sem apresentarem provas pedidas por este ou ouvir o que as testemunhas apresentam para o defender, durante o processo disciplinar. Esta proposta, se for aprovada, aplicar-se-á a todas as sociedades que empregam menos de 250 pessoas.Fim das restrições ao outsourcing após despedimentosNo caso de uma empresa fazer um despedimento coletivo ou extinguir um posto de trabalho, ficava impedida de, durante os 12 meses seguintes, recorrer ao outsourcing para as mesmas necessidades. A proposta do Governo prevê a revogação desta limitação.Período ExperimentalO período experimental dos contratos de trabalho de um desempregado de longa duração ou do primeiro emprego recua de 180 dias para 90 dias. Horário flexívelOs pais com filhos até aos 12 anos, ou com deficiência ou doença crónica, deixam de poder recusar trabalho à noite, ao fim de semana e feriados.AmamentaçãoO direito ao horário reduzido durante a amamentação fica limitado a dois anos. Também passa a ser obrigatório comprovar a amamentação, com atestado, a partir do nascimento. Antes era só ao fim de um ano. .José Luís Carneiro assume “linhas vermelhas” na lei da greve e na legislação laboral.Partido Socialista pede "fundamentação" à ministra do Trabalho para alterações à lei laboral