“Obrigado e até breve”. Derrota leva Pedro Nuno Santos a sair de cena
Foram precisos quase 40 anos para que o PS voltasse a ter menos de 25% dos votos numas eleições legislativas. Em 1987, os socialistas, liderados por Vítor Constâncio, tiveram 22,24% nas eleições que levaram Cavaco Silva à maioria absoluta. Agora, os 23,38% (ou 1.394.491 de votos) levaram Pedro Nuno Santos a “refletir”. E porque não quer “ser estorvo”, o líder socialista abriu a porta e pediu eleições internas para escolher o seu sucessor. Eleições a que, garantiu, não será candidato.
Para iniciar esse processo, os socialistas reúnem a comissão nacional já no próximo sábado, de onde sairá a data do congresso (que, se não fosse antecipado, deveria acontecer em dezembro).
Ainda assim, os socialistas continuam a ser o único partido a eleger em todos os círculos eleitorais (uma vez que a AD não elegeu em Portalegre e o Chega continua sem um deputado por Bragança).
No discurso que fez no final da noite, o ainda secretário-geral socialista assegurou também que não quer ser “suporte” ao Governo da AD e que, na sua opinião, esse papel “não deve” ser do PS. Ainda assim, “o povo português falou com clareza” e, por isso, os tempos são “duros” para a esquerda e para o próprio PS. Visivelmente emocionado, Pedro Nuno Santos não poupou nos ataques a Luís Montenegro (a quem disse já ter telefonado e felicitado pela vitória). Para o líder do PS, o líder do PSD “não tem a idoneidade necessária para o cargo de primeiro-ministro e as eleições não alteraram essa realidade” e “lidera um Governo que falhou a vários níveis no último ano”. Com isto, afirmou, os pressupostos para criar uma Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI) ao caso Spinumviva - que levou à queda do Governo - “mantêm-se” mesmo com a sua saída de cena para a qual não quis adiantar uma data. Contudo, quando o tema do programa do Governo foi abordado, Pedro Nuno Santos abanou repetidamente a cabeça em sinal negativo.
Questionado sobre o seu futuro enquanto deputado (uma vez que foi eleito pelo círculo de Aveiro), admitiu ainda não ter tido “essa reflexão”. Ainda assim, apesar de ter sofrido a segunda derrota em eleições legislativas no espaço de um ano (que significa uma perda de 20 deputados nesse período), Pedro Nuno Santos disse estar convicto de que “honrou a história do PS”. No discurso que fez perante os apoiantes presentes na sala Londres do hotel Altis, em Lisboa, o ainda secretário-geral do PS disse que o partido fará a análise sobre o que correu mal, recordando até as críticas internas que ouviu “ora de militantes, ora de dirigentes” sobre o rumo tomado nesta campanha. À semelhança do que já dissera noutras ocasiões, o PS “não provocou estas eleições”, mas queria ganhá-las.
Na intervenção perante uma sala cheia mesmo apesar da derrota, Pedro Nuno Santos deixou ainda uma palavra “à extrema-direita, que cresceu muito”. Esse crescimento veio também com mais “violência”, que se sentiu “ao longo desta campanha”. “A extrema-direita deve ser combatida sem complacência, com coragem e com firmeza”, disse, acrescentando que essa luta deve acontecer “esteja no poder ou a influenciar quem está no poder” (neste caso, o PSD e o CDS).
Terminando o discurso, o secretário-geral socialista - que falou ao lado de Carlos César, presidente do PS - citou Mário Soares, dizendo que “só é vencido quem desiste de lutar”. “E eu não desistirei de lutar. Obrigado e até breve”, concluiu.
Consternação e preocupação marcaram todo o dia
Ainda que a reação oficial por parte do PS só chegasse já ao bater da meia-noite, o clima no hotel Altis, em Lisboa, quartel-general socialista, foi sempre de muito pouco otimismo.
Por volta das 18h00, quando os primeiros rostos do PS, como o ex-ministro Duarte Cordeiro ou o deputado António Mendonça Mendes começaram a chegar ao hotel, as palavras eram poucas, remetendo sempre para “depois”. Esta foi, aliás, a regra até à chegada de Pedro Nuno Santos - que já aí dava sinais de que os resultados podiam ser desfavoráveis ao PS, dizendo que “no ano passado os resultados à boca das urnas” tinham sido bastante diferentes do desfecho final.
Depois da agitação com a chegada do líder, que subiu diretamente para o piso 13 do Altis, onde acompanhou os resultados eleitorais como habitualmente, a calma voltou e durou até às 20h. Aí, a calma passou a consternação e, se o clima nunca foi de festa (não foi agitada uma bandeira na sala onde Pedro Nuno Santos falou), pior ficou com as projeções das estações de televisão que indicavam aquilo que se verificaria mesmo: o PS ficaria taco-a-taco com o Chega. Em frente às quatro televisões da sala, vários militantes olharam em silêncio para os possíveis resultados.
Lá fora, o ambiente era igual: silêncio e desalento nos rostos dos poucos militantes que ali estavam. De deputados e dirigentes nem havia sinal, e à porta do Altis, por volta das 20h15, só quatro militantes da Juventude Socialista conversavam entre si. Um deles segurava numa bandeira (a única que se viu, aliás), enrolada, sem qualquer sinal de otimismo no rosto.
Enquanto isso, alguns militantes conversavam aqui e ali e, com os resultados já praticamente fechados, ouviu-se num dos corredores do Altis: “O André Ventura [presidente do Chega] lidera agora a oposição, não se tenha dúvidas sobre isso.”