A moção de censura apresentada pelo Chega ao executivo da Câmara de Lisboa foi chumbada nesta terça-feira, apenas com votos favoráveis do partido proponente e do PPM, numa sessão da Assembleia Municipal de Lisboa que contou com a presença do presidente da Câmara de Lisboa e os vereadores eleitos pela coligação Novos Tempos. A iniciativa foi rotulada de "inútil" e de ser um "aproveitamento político" do acidente, que fez 16 mortos e 23 feridos no Elevador da Glória, por quase todas as bancadas, com as da esquerda a atacarem Bruno Mascarenhas tanto ou mais do que Carlos Moedas.O deputado municipal do Chega, candidato do partido à presidência da Câmara de Lisboa nas eleições de 12 de outubro, defendeu na sua intervenção que "era sabido" que os pontos de amarração nas cabinas do Elevador da Glória eram "um dos pontos mais vulneráveis", e responsabilizou Carlos Moedas por o concurso público lançado pela Carris para a manutenção dos funiculares ter ficado deserto, naquilo que disse ser "uma falha política e institucional". Numa intervenção que encerrou com a pergunta, que alegou ter ouvido nos últimos dias, "quantas moedas vale a vida humana?", Mascarenhas disse que o presidente da Câmara de Lisboa "falhou no essencial, que é proteger as vidas dos cidadãos", recusando que a moção de censura apresentada nesta terça-feira fosse "um ato simbólico ou vazio de significado".A resposta da bancada social-democrata veio por Luís Newton, que começou por descrever a moção do Chega como "um documento construído sobre uma ausência de factos, de provas e, sobretudo, de seriedade", interrogando onde estaria o relatório que sustenta um nexo causal entre o fim do contrato de manutenção e o acidente que fez 16 mortos e 23 feridos.Luís Newton rotulou de "irresponsabilidade política" a moção apresentada por Bruno Mascarenhas, no que disse ser um comportamento "indigno, ofensivo à cidade e um insulto à democracia local". E, nas suas palavras, a demonstração que o cabeça de lista do Chega "não está preparado para liderar um condomínio, quanto mais uma câmara municipal", encerrando com as célebres palavras do treinador Manuel Machado: "Um vintém é um vintém, e um cretino é um cretino."Em defesa da honra, Mascarenhas atacou Newton, recordando os problemas judiciais do presidente da Junta de Freguesia da Estrela. "Tenho a dizer que é indigno que a pessoa que está a defender a Câmara seja um acusado por corrupção passiva", disse o deputado municipal do Chega, com o seu alvo a retorquir que "se encaixam bem nele as palavras de Manuel Machado".A deputada municipal socialista Carla Madeira, presidente da Junta de Freguesia da Misericórdia, manteve a linha seguida por Alexandra Leitão, que é a principal adversária eleitoral de Moedas, dizendo que "há erros técnicos que têm consequências políticas, mas primeiro temos de apurar os factos e aguardar as conclusões dos inquéritos em curso"."Apesar da necessidade de esclarecer o que aconteceu, o que falhou, porque falhou e quem falhou, este não é um momento para aproveitamentos políticos", defendeu Carla Madeira, abrindo caminho para a abstenção da bancada do PS na Assembleia Municipal de Lisboa à moção de censura do Chega.Defendendo que a "tragédia sem precedentes na história recente" de Lisboa, "exige de todos nós alguma contenção nas palavras", a socialista lamentou que Carlos Moedas não a tenha tido. E defendeu "ações formes, gestos solidários e um inquérito transparente", para que a tragédia do Elevador da Glória "seja um ponto de viragem na forma como gerimos, fiscalizamos e cuidamos dos equipamentos públicos da cidade".Ao contrário de Gonçalo da Câmara Pereira, do PPM, e de Inácio Faria, do MPT, que justificou a sua rejeição da moção de censura por, "para o bem e para o mal, até ao final do mandato integrar uma coligação", o ataque foi a melhor defesa para o centrista Martim Borges de Freitas. O deputado municipal do CDS distribuiu ataques aos "mesmos do costume, que vivem na bolha mediática", dizendo que "não é inocente" que Alexandra Leitão diga que não pede a demissão do presidente da Câmara de Lisboa ao mesmo tempo que Pedro Nuno Santos, o seu antigo secretário-geral, o faz, numa lógica de "polícia mau, polícia bom e polícia assim-assim", que "já não pega". Isto antes de se dirigir à forma "leviana e medíocre" como o Chega anunciou a moção de censura "quando os cadáveres ainda estavam nas morgues".Já o deputado municipal da Iniciativa Liberal Rodrigo Mello Gonçalves, que nestas eleições autárquicas integra as listas da coligação Por Ti, Lisboa, num lugar elegível, disse que "o que é censurável é o aproveitamento político feito pelo Chega, quando a cidade estava de luto". O liberal acusou mesmo Bruno Mascarenhas de não ter colocado uma única pergunta ao presidente da Carris quando ele se deslocou à Assembleia Municipal de Lisboa para uma audição. Mais tarde, o partido liderado por André Ventura recordou ter feito o pedido para um debate sobre as dificuldades na Carris.À esquerda, a deputada municipal (e também da Assembleia da República) do Livre, Isabel Mendes Lopes dirigiu-se a Moedas, dizendo que "a confiança constrói-se com sentido de responsabilidade e coerência", e fez uma comparação com o apelo que fez à demissão de Fernando Medina, em 2021, na sequência do envio de dados pessoais de ativistas anti-Putin à Embaixada da Federação Russa. "O que considerava ser responsabilidade política já não se aplica a si", comentou.Com a deputada bloquista Joana Teixeira a preferir dedicar o tempo de intervenção a uma moção apresentada pela sua bancada, relativa à flotilha que pretende atravessar o Mediterrâneo até chegar à Faixa de Gaza, com a porta-voz e deputada do partido, Mariana Mortágua, a bordo de uma das embarcações, a comunista Natacha Amaro insistiu na inutilidade da moção de censura - "o que é útil é o cabal esclarecimento das dúvidas", disse - e Cláudia Madeira, do PEV, reconheceu que "muitas inquietações continuam sem respostas". Por seu lado, António Valente, do PAN, disse que "não é ainda altura" para moções de censura.No final, a moção foi reprovada, com votos contra do PSD, CDS, Iniciativa Liberal, MPT e Aliança, abstenções do PS, Bloco de Esquerda, Livre, PCP, PEV, PAN e Cidadãos por Lisboa, e votos a favor do Chega e do PPM.