O anúncio do seu nome como escolha do PSD para a câmara municipal, na altura, não foi muito consensual e motivou demissões na concelhia. Já depois disso, o atual presidente, José Ribau Esteves, deu-lhe o apoio. Sente-se, agora, apoiado pelo partido?É normal, no fim de ciclo de um presidente que esteve 12 anos à frente de uma câmara em qualquer município, haver várias possibilidades para a sucessão. E também é normal que as pessoas se inclinem mais num sentido e outras noutro. Perante um resultado, aquelas que achavam que a opção A era a melhor, ficam um pouco descontentes. Não há que dramatizar esses episódios. Já lá vão muitos meses, fazem parte da vida partidária e das escolhas. A verdade é esta: fui aprovado por unanimidade e aclamação no plenário concelhio. A tramitação formal que depois se seguiu teve esta característica. Isso significa que o PSD-Aveiro, esteve na esmagadora maioria comigo. Quanto ao presidente Ribau Esteves, encaro - e encarei - com naturalidade o facto de, num primeiro momento, ele entender que se calhar o seu número dois [Rogério Carlos] seria a escolha óbvia. É alguém que já vem com ele da Câmara de Ílhavo, um colaborador direto. Não vejo nenhum drama nisso. A partir do momento que a escolha foi feita, o presidente sempre disse publicamente que é para irmos para a frente..Autárquicas 2025. Entre o rosto do passado e o nome pouco consensual, Aveiro é palco de duelo de irmãos.Esses 12 anos de mandato de Ribau Esteves foram marcados por um trabalho reconhecido local e regionalmente. Sente pressão por ser o seu eventual sucessor?Ribau Esteves foi presidente da comunidade intermunicipal da região de Aveiro durante décadas e é uma referência que terá muito a dar à política nacional. Considero isso uma boa herança e uma responsabilidade, claro. É uma boa responsabilidade e um desafio estarmos à altura.Até 12 de outubro, é presidente da assembleia municipal. De que forma é que a presidência de um órgão desta natureza o preparou para o cargo de presidente da câmara, para o qual espera agora ser eleito?São muito diferentes e a verdade é que não estou no Executivo nem nunca fiz parte, mas fui sempre parte da atual maioria como presidente da assembleia municipal nos últimos oito anos. Isto dá-me duas coisas: primeiro, um acompanhamento permanente das grandes questões que atravessam o município. Todas as grandes decisões passam pelas assembleias municipais. A segunda vertente é que ando há oito anos a ouvir as pessoas. Sempre procurei ser um presidente da assembleia municipal aberto ao contacto com as pessoas, a ouvir também os seus anseios. Acho que estão aqui duas vantagens muito nítidas pelo facto de ter este cargo neste momento.Do lado do PS, tem o seu irmão, que já foi autarca e se recandidata agora. Como é que isto afeta a campanha? Como se gere esta situação?É evidente que o facto de haver aqui uma relação familiar tem algumas delicadezas. Mas há uma linha que defini muito claramente e que penso que também existe da parte do candidato do PS: nunca vamos fazer acusações de caráter pessoal. Nem isso está na nossa maneira de ser. Fomos criados na política. As pessoas estranham muito, e é normal, mas uso esta imagem: se fôssemos uma família de ourives, se calhar falávamos muito de ourivesaria. Acontece que já o nosso avô foi deputado na Assembleia Constituinte da República [1911], e tínhamos um outro avô monárquico, ou seja, fomos habituados a falar de política normalmente em família. A diferença é que agora passamos para fora, para o público, uma discussão que já tínhamos. O meu irmão sempre foi uma pessoa de esquerda e eu sempre fui do espaço político da AD. É com naturalidade que encaro isso, e até há outros exemplos, como o caso de Paulo e Miguel Portas, em extremos [CDS e BE, respetivamente]. Toda a gente sabe que isso nunca afetou a relação entre os dois.Sente que pode haver uma desvantagem para si, tendo em conta que o seu irmão já foi autarca em Aveiro, no passado?Partimos de uma maioria absoluta e, nas dez freguesias do concelho, temos o poder em todas. A vantagem inicial e a responsabilidade de continuar essa maioria absoluta são nossas. O candidato do PS teve uma experiência autárquica, mas correu tão bem que foi corrido pelos eleitores. A verdade é esta. Se tivesse sido um sucesso, teria renovado essa confiança. Todos sabemos que houve uma gestão muito má da autarquia. Ainda hoje estamos a pagar um empréstimo da nossa troika local, com verbas do Fundo de Apoio Municipal [FAM]. Só daqui a 12 anos é que vamos conseguir pagar essa ajuda. Serão 44 milhões de euros ainda para pagar. Houve uma fase em que medidas draconianas também foram aplicadas aqui em Aveiro, como as taxas de IMI no máximo. Há uma questão muito importante: os prazos de pagamento. Hoje em dia, graças ao trabalho da atual maioria, as contas da câmara estão impecáveis. O prazo de pagamento é de uma semana. Do outro lado, há uma experiência com um balanço que os aveirenses não esquecem que foi muito negativo ao nível da gestão.E caso não vença com maioria absoluta? Admite dialogar com o PS?Estou aqui para servir os interesses dos aveirenses, para fazer cada vez mais pela minha terra. A minha preocupação número um será sempre a defesa do interesse de Aveiro. Agora, tenho alertado, e acho que é importante esta mensagem: temos assistido a um ciclo virtuoso de crescimento económico e populacional, porque os dados recentes mostrados pela Pordata mostram que o crescimento de Aveiro desde 2021 a 2024 é o dobro da média nacional e supera o de Lisboa, de Sintra e de outras cidades. Não é por acaso que estamos a atrair mais gente, e este ciclo não pode parar. Se entrarmos em instabilidade política, quem vai pagar são os aveirenses, são as associações, são as juntas de freguesia. É este o risco de um bloqueio em Aveiro. Não queria nada que se entrasse numa fase desse género.Sente que pode haver esse risco?No fim de um ciclo, há sempre incógnitas. Mas estamos muito confiantes. O que estou a fazer é um alerta para que os eleitores tenham o maior sentido de responsabilidade no seu voto.E se tal não acontecer?Percebo a pergunta, mas essa é uma questão para o dia a seguir às eleições. Perante cenários reais, teremos então de ver como procuramos as melhores soluções que sejam do interesse estável.O seu programa é dividido em 18 áreas. Quando fez a apresentação, disse que “chegou a hora das freguesias”. Porquê?Queremos, com isto, dizer que nós vamos apostar muito numa política de coesão territorial. O município de Aveiro tem realidades que são muito distintas. Temos aqui freguesias urbanas e periurbanas e entendemos que é necessário fazer apostas claras em termos de investimento municipal e melhorias da mobilidade dos acessos ao nível da educação e da saúde e a criação daquilo que chamamos de investimentos âncora municipais. Por exemplo, na freguesia de Aradas, que não é o centro mesmo da cidade, vai ser criada uma área enorme que é o chamado “Quartel das artes e da música”. Há ali uma potencialidade, um pólo, que vai atrair gente e novas dinâmicas na freguesia. Em Nossa Senhora de Fátima, Requeixo e Nariz, vamos criar, através de uma quinta que já é propriedade da câmara municipal, uma unidade que vai permitir, por exemplo, estadia de pessoas de curta duração, contacto com as realidades do campo. É uma espécie de quinta pedagógica didática também, é um pólo. E temos um outro, porque também somos parte da região da Bairrada, através da localidade de Nariz, onde vamos implementar um centro de divulgação da Bairrada. Isto só para dar aqui alguns exemplos da “hora das freguesias”.Outra das prioridades é fazer uma revisão do Plano Diretor Municipal (PDM) para permitir o crescimento da habitação. Que habitação é esta, privada, social, no sentido lato?Temos de estar abertos a todas as modalidades de habitação que a lei permita. Assumimos desde o início que todas as formas de habitação são para avançar. Mas, para dar continuidade a uma política da maioria atual, foi a habitação a custos controlados, que é um modelo muito interessante, que em Aveiro não é retórica. Quando falamos em rever o PDM, uso sempre esta situação: não faz sentido existir um determinado local, numa freguesia servida por uma estação ferroviária ou onde está localizado um centro de saúde de nova geração, e depois só se poder construir numa pequena faixa de terreno próximo. E há medidas, além da revisão do PDM, que são muito importantes. Por exemplo, o quartel da GNR, que era do Regimento de Infantaria, está a ocupar um quarteirão inteiro no centro da cidade, com uma guarda que nem é urbana. Queremos que a GNR tenha as melhores condições de trabalho, mas deve haver uma deslocalização.Essa solução já tinha sido tentada pelo atual autarca, correto?Há muitos anos que Ribau Esteves defende a deslocalização do quartel. Mas não tinha definido o que fazer a seguir. Ao propormos isto, porque o problema da habitação agravou-se significativamente com o crescimento populacional, são novas soluções para novas realidades, no fundo..Alberto Souto Miranda: “Ribau Esteves herdou a câmara da gestão desastrosa do PSD e do CDS”