Lei da Proteção aos Animais foi aprovada em 1995, mas ainda teve um aditamento em 2022, que introduziu a proibição de tiro desportivo aos pombos.
Lei da Proteção aos Animais foi aprovada em 1995, mas ainda teve um aditamento em 2022, que introduziu a proibição de tiro desportivo aos pombos.Foto: Miguel Pereira/Global Imagens

Houve 1018 casos de maus tratos em 2024. PAN assinala a lei que reconhece o “sofrimento animal”

A rentrée do partido liderado por Inês de Sousa Real acontece esta sexta-feira, com um encontro à volta do mesmo objetivo: Celebrar a Lei de Proteção aos Animais, aprovada em 1995.
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"A lei também veio acabar, na altura, com as touradas de morte. Houve exceções, infelizmente, que se perpetuam até hoje nos termos das touradas autorizadas por lei, mas houve aqui avanços importantes”, explica ao DN a líder do PAN, Inês de Sousa Real, enquanto desvela o conteúdo da conferência organizada pelo partido em torno da Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, que estabelece os alicerces da proteção aos animais em Portugal, que já implicou algumas atualizações e ainda terá um caminho para fazer.

Foi uma lei histórica, na medida em que não só se reconheceu o sofrimento animal como, por outro lado, proibiu-se todas as violências injustificadas contra os mesmos”, completa a deputada única do PAN.

O documento emanado pela Assembleia da República tem data de 29 de agosto de 1995, quando Aníbal Cavaco Silva era primeiro-ministro e Mário Soares era Presidente da República, mas está longe de ser o primeiro diploma legal a ser discutido no contexto legislativo português à volta do tema.

De acordo com a página oficial do Parlamento, “a primeira tentativa de consagrar legalmente em Portugal a proteção aos animais data do século XIX”, mais especificamente de 1875, quando “foi fundada a Sociedade Protetora dos Animais (SPA) e, dois anos depois, os deputados Carlos Testa - que era também membro da direção da SPA-Lisboa - e Manuel Pinheiro Chagas, entre outros, apresentaram, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei visando a proteção dos animais”.

De acordo com a mesma fonte, “o projeto foi aprovado, mas não chegou a ser discutido na Câmara dos Pares do Reino, inviabilizando, por isso, a conclusão do processo legislativo e a sua entrada em vigor”.

E também não ficou concluída em 1995, tendo havido aditamentos que, lembrou Inês de Sousa Real, chegaram ao hemiciclo pela mão do PAN, que conseguiu “criar pela primeira vez o quadro sancionatório, que durante quase duas décadas foi inexistente”.

Entre as várias alterações, explica a deputada do PAN, em alusão à Lei n.º 6/2022, de 07 de janeiro, passou a não ser possível “deixar impune situações de maus tratos a outras espécies que não estão atualmente protegidas pelo Código Penal”. Para além disto, “acabou-se também com a prática desportiva do tiro ao pombo - que até era uma luta muito antiga das associações de proteção animal -, que passou também a ser infração, e, através de todo este quadro contraordenacional destas sanções, também passou a haver a possibilidade de poder retirar e ser declarada a perda dos animais que pertençam ao agressor”, explica Inês de Sousa Real.

Considerando que há um quadro legal que prevê os crimes de maus tratos a animais, até porque sem lei não há crime, estes números surgem no Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), juntos com todos os outros crimes.

De acordo com o RASI, em 2024 houve 1018 casos de “morte e maus tratos de animal de companhia”, o que significa que houve uma diminuição homóloga de 6,1%, face a 2023, quando foram registados 1084 destes casos.

No entanto, no que diz respeito a casos de abandono de animais de companhia, que são contabilizados como um fenómenos à parte, houve 652 casos em 2024, quando em 2023 tinha havido 645 (um aumento de 1,1%).

De acordo com dados da GNR a que o DN teve acesso, relativos ao período entre 2022 e o dia 31 de julho de 2025, tem havido uma diminuição progressiva no número de crimes de maus tratos e abandono de animais.

A GNR contabilizou, em 2022, um total de 704 casos de maus tratos e 491 de abandono, quando em 2023 estes dados davam conta de 626 casos de maus tratos e 384 de abandono.

Em 2024, a mesma fonte refere 572 casos de maus tratos e 380 de abandono. Apesar das contas não estarem fechadas em relação a este ano, a GNR indica que, até 31 de julho houve 347 casos de maus tratos e 214 de abandono.

Estes dados vêm ainda acompanhados de uma promessa por parte desta força de segurança: “A GNR, especialmente através do Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA), está profundamente empenhada na defesa dos valores naturais e ambientais numa perspetiva de alcançar uma melhor segurança e bem-estar para os seres humanos e biodiversidade, destacando o bem-estar animal.”

Questionada sobre se estes números são realistas ou se são a ponta do icebergue, Inês de Sousa Real opta pela segunda possibilidade, mas sublinha que “os números têm sido importantes porque eles eram inexistentes”.

Ainda assim, a líder do PAN aponta possibilidades de melhoria no cruzamento entre os dados oficiais.

Só lamentamos que no âmbito da ligação desses dados com o crime de violência doméstica - porque existem muitos casos em que existe essa associação - o RASI não o faça”, considera Inês de Sousa Real, acrescentando o mesmo padrão “no caso do crime de abandono, tendo em conta que a maior parte dos casos não são reportados, porque os dados estão muito aquém da realidade”.

Para sustentar a consideração, Inês de Sousa Real assegura que os números que todos os anos os canis municipais reportam dão conta de “30 mil animais a entrarem nos canis, e isso nem contabiliza o número de animais entrados nas associações de proteção animal e, portanto, acreditamos que esses números infelizmente ficam aquém da realidade”.

Para além disto, há um efeito legal em todo o fenómeno, aponta a líder do PAN, lembrando que “tivemos anos bastante difíceis em que, por força das declarações de inconstitucionalidade que existiram em processos concretos - e felizmente o tribunal depois veio no seu coletivo declarar a constitucionalidade da lei - acreditamos que isso, de alguma forma, tenha tido um efeito dissuasor, quer das denúncias, quer da própria tramitação dos processos, até porque temos conhecimento e é público que houve muitos processos que foram arquivados logo desde o início, erradamente, pelo facto de ter havido aquelas declarações de inconstitucionalidade”, sustenta.

Carlos Pimentel/Global Imagens

Como corolário de tudo isto, Inês de Sousa Real diz que a conferência de hoje, promovida pelo partido em torno da Lei de Proteção dos Animais, pretende alertar para o facto de ser “importante continuarmos a sensibilizar a sociedade civil para o respeito que deve existir com os direitos dos animais, para evitar formas de maus tratos ou de abandono sobre qualquer tipo de circunstância, até porque temos tido em Portugal casos bastante graves”.

Como exemplo, Inês de Sousa Real dá o que acontece em Santo Tirso, em 2020, como um exemplo, quando morreram 93 animais num incêndio, o que levaria à constituição, entre outros sujeitos processuais, de duas arguidas, cada uma delas acusada de 79 crimes de maus tratos a animais.

O Tribunal de Matosinhos acabou por decidir levar as mulheres a julgamento na sequência dum debate instrutório que foi requerido pelo PAN e pela Associação Zoófila Midas, já depois de, em 2022, o Ministério Público ter dado o caso como arquivado.

Sobre o dia de hoje, Inês de Sousa Real diz esperar que seja “positivo e não apenas evocativo”, com uma homenagem que integrará a conferência ao antigo deputado social-democrata António Maria Pereira e também à professora de Direito Maria da Conceição Valdágua, a título póstumo, pelo contributo para a evolução legislativa nesta matéria.

“Se hoje temos com a instituição de Arguido, no caso de Santo Tirso, por violação do dever de omissão, deve-se àquilo que foi também a sua visão pioneira e a sua interpretação e a doutrina que criou em Portugal relativamente ao crime por omissão ser aplicável igualmente aos crimes contra animais de companhia”, conclui a deputada do PAN sobre Maria da Conceição Valdágua.

Aumento do número de casos

“Em termos de números, acho que o mediatismo tem vindo a aumentar e aqui no registo que temos, efetivamente, há um aumento do número de casos”, garantiu ao DN a vice-presidente da Federação de Defesa e Resgate Animal (Fedra), Sofia Róis, contradizendo os padrões assinalados no RASI e pla GNR.

As associações estão muito mais presentes na recolha dos animais, no acolhimento, na esterilização, até no apoio alimentar e também fazem um bocadinho esta mediação social”, sustenta a representante da federação de associações que tgêm estado no terreno no que diz respeito a resgate de animais maltratados.

Sobre estas instituições, afirma que “aproximam, por um lado, os cidadãos ao poder local”, o que diz trazer vantagens.

É um mediatismo positivo, na minha opinião. Há uma pressão política e houve uma evolução legislativa após 1995, um motor de avanços legislativos.”

Mas há trabalho para continuar, garante, porque “é um processo que tem um limite atual”.

“A maior parte as organizações que vivem do voluntariado deveriam ser reconhecidas como parceiros estruturais do Estado e nós poderíamos pensar que o que mudou em 30 anos não foi só a lei. Mudou a mentalidade das pessoas”, aponta.

“Estão cada vez menos tolerantes com a crueldade dos setores que usam animais e por isso é que acho que existe este aumento do número de relatos. E não estou só a falar efetivamente do bem-estar dos animais de companhia, estou a falar também de outras áreas um bocadinho mais sensíveis, como a pecuária intensiva, a tourada, os transportes”, conclui.

Reforço das diligências

O DN também conversou com o tenente-coronel Carlos Fernandes, da GNR, sobre os dados divulgados, que garante que esta força de segurança, “ainda antes da criminalização dos maus tratos a animais de companhia, já dedicava uma máxima atenção a este dever especial de cuidado dos detentores de animais de companhia. Após a criminalização temos investido um reforço ao nível da preparação também dos inquéritos para apoio ao Ministério Público”, explica.

Para facilitar a denúncia a maus tratos ou abandono de animais, Carlos Fernandes lembra que a GNR tem a linha de apoio SOS Ambiente e Território - 808 200 520.

A denúncia é encaminhada pelos nossos núcleos de proteção ambiental, que estão dispersos em todo o território nacional, e depois é averiguada pelos nossos profissionais”, explica, com o apelo de que seja utilizada pelos cidadãos.

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