Debate BE-IL. Da Defesa à Saúde, tudo separa Mariana Mortágua e Rui Rocha
A acusação é de Mariana Mortágua, porta-voz do Bloco de Esquerda, e foi deixada no debate desta quinta-feira: Rui Rocha, presidente da Iniciativa Liberal, "não soube explicar as contas" do partido, que "quer", entre outros, "cortar um número maior de funcionários públicos do que aquele que existe. É um bulldozer, cortam todos, não sobra nenhum".
A discórdia entre ambos os líderes foi, aliás, o que ficou mais vincado durante o frente a frente (o penúltimo antes do início da campanha eleitoral para as legislativas de 18 de maio). Da saúde à defesa, passando pela habitação, quer Rui Rocha, quer Mariana Mortágua deixaram vincado o que os separa ideologicamente.
Na reta final da discussão, o líder liberal acusou a porta-voz bloquista de ter "responsabilidade" no estado atual do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Durante a geringonça, de que o BE fez parte, houve um "ataque claro a soluções como as Parcerias Público-Privadas [PPP] na saúde", argumentou Rui Rocha. Defendendo ser necessário fazer um "diagnóstico" ao SNS, o liberal apresentou a proposta do partido, explicando que a IL defende que "os portugueses possam escolher onde querem ser tratados", independentemente de ser no setor público, privado ou social. Caso contrário, o país "continuará com remendos". Agora, referiu, é "o momento de tomar decisões" sobre a saúde.
Perante isto, Mariana Mortágua argumentou que no passado as PPP na saúde já foram uma realidade e que "os privados mandavam utentes para o público".
Antes, as discordâncias já tinham ficado patentes. E foram visíveis logo no tema que abriu o debate: a Defesa. Na quarta-feira, o Governo pediu à Comissão Europeia (CE) a ativação da "cláusula derrogatória nacional", que permite um investimento até 1,5% do PIB em defesa sem pena de prejudicar o défice. Para Rui Rocha, este será um "investimento a longo prazo". "Não tenho dúvida nenhuma de que temos de alinhar o nosso gasto com as exigências, mas isso tem de ser feito passo a passo. Neste caso, trará vantagens a longo prazo e é esse o caminho que deve ser seguido", defendeu, até pelo impacto que poderá ter em áreas "como a ciência e tecnologia".
Já Mariana Mortágua - que já havia criticado a "deriva armamentista" em relação à Defesa - voltou a reiterar a sua oposição à medida, acrescentando ainda: "Não faz sentido. Não é uma estratégia de industrialização, é uma estratégia para comprar mais armas a empresas, muitas delas privadas, e fazer mais contratos. Não precisamos aumentar o investimento em armamento até ao limite de 3% do PIB que a Comissão Europeia exige. A Europa já é uma potência militar três vezes superior à Rússia."
Passando a discussão, depois, para a Habitação, Mariana Mortágua procurou colar a IL aos vistos gold, que o partido "já apoiava" quando a coordenadora do BE "já os combatia", e voltou a distanciar-se das políticas liberais. Puxando depois por uma das bandeiras do BE para estas eleições (o teto às rendas), Mortágua argumentou que a medida "funciona" e que países como a Alemanha ou os Países Baixos até a estão a "prorrogar". Esta proposta, referiu, "funciona porque baixa o preço das casas", sobretudo num mercado imobiliário como o português, em que "uma pessoa com um salário entre os 800 e os 1000 euros - que é o que maior parte das pessoas ganha - não consegue pagar uma renda porque já é superior ao que aufere". "Para a maior parte das pessoas o mercado de arrendamento já nem existe", atirou.
Mas "o teto das rendas tem telhados de vidro", contrapôs Rui Rocha, sublinhando que a medida correu mal em países como o Reino Unido ou a Suécia.
Para o liberal, a solução passa por "construir mais, mais depressa e mais alto" e há uma forma de o fazer "a médio prazo": baixar o IVA da construção (uma das bandeiras da IL), que Rui Rocha considera ser "decisivo", sobretudo para casas de classe média.
Além disso, acrescentou ainda, há vários milhares de casas vazias que podiam estar no mercado de arrendamento, mas para isso é necessário baixar a tributação aos proprietários. Outra solução para a crise no setor, disse ainda, pode passar pelo edificado devoluto do Estado que, na opinião de Rui Rocha, deve servir como habitação.
Na resposta, Mariana Mortágua disse concordar com a necessidade de mais construção habitacional, mas considerou essa uma solução "para ricos" e concretizável daqui "a 10, 20 anos". "Precisamos de uma medida que baixe os preços agora", argumentou, antes de terminar juntando IL a PS e PSD nesta matéria, acusando os três partidos de ficar à espera que o problema da habitação se resolva sem serem apresentadas medidas para tal.