PSD e CDS levam esta sexta-feira ao parlamento dois projetos de resolução que recomendam ao Governo a retirada de circulação do guia O Direito a Ser nas Escolas - um documento que, de acordo com a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, que o criou em conjunto com a Direção-Geral da Educação, promove, desde 2023, “orientações destinadas a pessoal docente e não docente com vista a uma escola mais inclusiva”. Também o Chega leva ao debate uma iniciativa para que sejam asseguradas as “condições para que as crianças e jovens não tenham de ser obrigados a partilhar casas de banho e balneários com pessoas que se identifiquem com o sexo oposto ao qual nasceram”. Ao DN, partidos da esquerda falam em “retrocesso”, enquanto a direita prepara o combate ao que diz ser “ideologia de género”. Para as escolas, esta discussão é um problema exclusivo dos políticos.“Parece-nos altamente precipitado, não só esta proposta, como também ver o PSD e o CDS virem a reboque da agenda da extrema-direita”, considerou ao DN a deputada única do PAN, Inês de Sousa Real.Mas a também líder do PAN vai mais longe e defende que “estes manuais devem ser reforçados” na mesma medida em que “toda e qualquer capacitação dos docentes deve passar não por aquilo que estes partidos estão a propor”, mas “o respeito pelo próximo, independentemente da sua identidade de género”.“Isso não é algo ideológico, é algo que respeita os direitos humanos”, esclarece.Como exemplo de violência dirigida à “diversidade”, Inês de Sousa Real lembra que em 2025 são assinalados os 19 anos que passaram desde que Gisberta Salce Júnior, uma mulher trans e imigrante brasileira em situação de sem-abrigo, foi assassinada no Porto por um grupo de 14 adolescentes que a torturaram.Face a esta história, a deputada do PAN defende que este “não é um assunto que deva desmerecer a nossa preocupação ou atenção quando voltamos a ver esta procura de recuos”, em especial quando se trata de “partidos que têm a responsabilidade de governarem a pensar em todas as pessoas, incluindo as pessoas trans e LGBTI”.O DN também ouviu a argumentação do deputado do PSD Bruno Vitorino, que resumiu todo o tema a uma questão de “bom senso”. Para o social-democrata, isto “não tem nada a ver com chavões, não tem nada a ver com misturas de conceitos que a esquerda gosta propositadamente de fazer”. “É um absurdo”, diz. “Falar de direitos de crianças a serem protegidas na sua orientação sexual, com o qual obviamente nós concordamos, não tem nada a ver com os direitos de autodeterminação de género, que é um conceito novo que foi introduzido na legislação portuguesa”, através da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, que enquadra o “direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa”.Bruno Vitorino acusou ainda os partidos da esquerda de insistirem em manter, através do guia O Direito a Ser nas Escolas, o objeto do decreto da Assembleia da República n.º 127/XV, que “estabelecia o quadro jurídico para a emissão das medidas administrativas a adotar pelas escolas para a implementação da Lei n.º 38/2018”. Porém, Marcelo Rebelo de Sousa vetou o documento há um ano, por considerar que “o papel dos pais e encarregados de educação” não era respeitado, sendo que também não clarificava “as diferentes situações em função das idades”.De qualquer forma, o projeto de resolução que o PSD leva ao Parlamento também alude a uma petição, que será hoje discutida, que pede “que as crianças e jovens” não “sejam obrigados a partilhar os WCs e balneários com pessoas fisicamente do sexo oposto”, isto é, a premissa do projeto de resolução que o Chega também leva ao hemiciclo.“Nunca consigo compreender porque é que vamos contra os direitos humanos quando dizemos que não queremos que crianças e jovens de sexos opostos sejam obrigados a partilhar balneários ou casas de banho”, disse, de forma retórica, Bruno Vitorino. Sobre este tema, o DN também falou com o deputado do Livre Paulo Muacho, que lembrou que “o único partido que apresentou um projeto de lei que criava casas de banho mistas nas escolas foi o Chega, por inaptidão própria”.Paulo Muacho liga esta batalha também à disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, acusando os partidos proponentes destes projetos de resolução de “criar uma espécie de guerra cultural entre esquerda e direita, absolutamente artificial, porque isto não diz nada à realidade do dia-a-dia das escolas que têm problemas muito maiores”.Para além disto, retirar o guia de circulação é “sobretudo não dar meios aos profissionais desse estabelecimento de ensino para saberem lidar com essas situações”, defende.Também para a deputada do PS Patrícia Faro estas iniciativas do CDS, PSD e Chega são “um retrocesso”, porque, explica, todos os estudos internacionais “têm mostrado que a discriminação na educação continua a afetar a vida de muitas crianças, jovens professores, investigadores e profissionais, que, se identificando como lésbicas ou gays ou bissexuais ou trans, são vítimas de bullying”.Para perceber como estes temas afetam as escolas, o DN também conversou com o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, que garante que esta discussão “é claramente um problema dos políticos, e não das escolas”. “Aqueles políticos que nos deixem trabalhar nas escolas com esses desafios. A escola saberá, com confiança, o que é preciso para os resolver. Agora, nós, lá nas escolas temos problemas graves, que não é o caso”, conclui.