“O que realmente conta na hora de votar” e “o que procuram os eleitores num/a presidente de câmara” são algumas das perguntas que o estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) intitulado Barómetro do Poder Local levanta. O ponto de partida é um inquérito realizado no início deste ano pela empresa DOMP, S.A. e resulta num retrato do eleitorado, em várias dimensões, que, no final, mostra ter uma boa imagem dos seus representantes políticos nas autarquias, explicou ao DN o investigador da GOVCOPP, da Universidade de Aveiro, Nuno da Cruz, que é também um dos autores do estudo.Para responder às interrogações que possam orbitar a figura do presidente de câmara e a perceção que as pessoas têm deste autarca - que no estudo surge com uma “importância‑chave” - foi feita “uma experiência conjoint”, que, de acordo com Nuno da Cruz, passou por confrontar os inquiridos com as características que consideram ser as mais importantes para escolher os candidatos nas eleições autárquicas.No fundo, o estudo procurou descobrir os traços que os eleitores destacam sobre os candiatos que “os/as tornam mais competentes para governar”. “Para tal, foram apresentados aos inquiridos perfis hipotéticos de candidatos/as a presidentes de câmara, construídos com base em seis atributos variáveis, cuja combinação permite estabelecer diferentes tipos de líderes políticos”, explica o documento da FFMS, aludindo, deste modo, a integridade, ideologia, experiência profissional (pública/polítca ou privada), filiação partidária (ou se é independente), sexo e capacidade de liderança.Os autores do estudo criaram perfis diferentes com base nestes atributos e apresentaram-nos aos inquiridos, que, por seu turno, “foram convidados a escolher um entre dois candidatos hipotéticos com perfis diferentes”, detalha o estudo.“O que nós verificámos é que apenas três desses fatores explicam 70% do sentido do voto das pessoas”, relata Nuno da Cruz, aludindo a integridade, capacidade de liderar e a orientação ideológica.Portanto, por exclusão de partes, a filiação partidária, o sexo e a experiência profissional são menos relevantes para os eleitores no momento de escolher alguém para chefiar um executivo municipal.“O atributo mais importante é o comportamento ético”, conclui o documento da FFMS, acrescentando que esta característica assume uma “importância relativa de 27,1% para a decisão de voto”, sendo que os participantes no estudo valorizam os candidatos que “nunca” contornariam “os princípios quando procuram resolver problemas”.Em relação à ideologia política, a importância relativa é de 23,7%. “As pessoas disseram anteriormente que o partido a que pertencem os candidatos era o menos importante, mas a orientação ideológica nesta experiência surgiu como um fator muito importante”, lembra Nuno da Cruz, completando com a sugestão de que “essa orientação ideológica está do mesmo lado do aspeto político da pessoa que vota”.No que diz respeito à liderança, 18,3% dos inquiridos elegeram-na como um atributo fundamental, “sendo que os participantes valorizam uma liderança colaborativa”, em que os políticos decidem “com base em consultas alargadas com as partes interessadas”, detalha o estudo.Em relação aos outros três atributos menos valorizados, “a experiência profissional apresenta uma importância relativa de 10,6%, com uma ligeira preferência por candidatos com ampla experiência em cargos públicos e políticos. A filiação partidária tem uma importância relativa de 9,7%, com uma ténue preferência por candidatos independentes. Por fim, o sexo dos candidatos tem uma importância relativa de 10,2%, com uma ligeira preferência por candidatos do sexo feminino” (ver mais informações sobre este dado no texto ao lado), aponta o documento.Boa imagem do poder localPortugal tem 308 municípios, sendo que 278 estão na parte continental do país, lembra Nuno da Cruz, sublinhando um aspeto do estudo que, de acordo com o investigador, não é o que costuma passar nas notícias: “A imagem que os residentes em Portugal têm do poder local é tendencialmente boa e não corresponde necessariamente, se calhar, à caricatura mediática que muitas vezes é feita das autarquias, que são muitas vezes o alvo fácil quando se querem ilustrar más práticas administrativas ou governativas.”Assim, apesar deste “enviesamento”, a perspetiva dos residentes em Portugal sobre o poder local é boa..“Em 278 casos [possíveis], mal seria esperar que não houvesse situações estranhas”, ilustra o investigador.Num tentativa de encontrar “padrões diferenciais entre diferentes grupos dos residentes” - e não apenas de portugueses - os autores do estudo fizeram “vários testes em termos de faixas etárias, ou do sexo dos inquiridos, ou do nível de educação, ou da região onde residem, mas aquele ressuou mais foi a diferença entre os que moram em municípios urbanos e não urbanos”, revela Nuno da Cruz, enquanto cria uma imagem desta perspetiva.Para começar, a distinção é mesmo entre meios urbanos e não urbanos, e não entre cidades e “não cidades, porque do ponto de vista formal nós temos centenas de cidades em Portugal, mas do ponto de vista estatístico, para o Eurostat, só 26 dos 278 municípios de Portugal Continental é que são urbanos”, sublinha.Dentro destes 26 municípios, “11 são da área metropolitana de Lisboa, sete da área metropolitana do Porto e só oito é que são fora destas áreas”, completa. No total, “estes 26 municípios têm 45% da população residente em Portugal continental. Todos os outros, as outras várias centenas, têm 55%.”.Expostos os números, o investigador explica que foi neste retrato que foram encontradas “diferenças sistemáticas”, incluindo uma que considera “curiosa”: “Os residentes nos grandes centros urbanos tendem a confiar tanto no poder local, como noutras instituições, como a Assembleia da República, ou o Governo, ou o sistema judicial. Os que moram fora dos centros urbanos, os municípios não urbanos, claramente confiam mais no poder local do que nas outras instituições.”O estudo também conclui que “as eleições locais têm sido marcadas por níveis de abstenção elevados, mas também por uma notável estabilidade na identificação com os candidatos”. O estudo aponta que 69.3% dos inquiridos garante votar, de certeza. Em 2021, nas últimas autárquicas, 53,65% dos eleitores votaram.Na corrida às autarquias, mulheres são mais valorizadas do que homensÉ com a indicação de que “menos de 10% dos presidentes de câmara são mulheres” que o coautor do Barómetro do Poder Local Nuno da Cruz garantiu ao DN não esperar uma conclusão deste estudo, que demonstra que os eleitores têm uma preferência “por candidatas”, ainda que apenas 10,2% dos inquiridos na sondagem que sustentou o documento da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) tenha destacado o sexo dos candidatos como um atributo relevante.“Isso leva-nos a pensar que os partidos que têm possibilidade de ganhar eleições locais não estão a ter isto em conta, porque, mesmo que seja muito pouco, poderiam estar a melhorar as hipóteses de elegerem a sua candidata, se escolhessem uma candidata”, explica Nuno da Cruz, antes de ressalvar que a maior parte dos partidos, como nós sabemos, não escolhem” mulheres para este papel. “Infelizmente, temos um grande desequilíbrio do ponto de vista do sexo”, conclui.Com base neste apontamento, e com uma análise dos municípios que têm hipótese de eleger mulheres, por terem candidatas nos principais partidos, Lisboa aparece com um lugar cimeiro, com a socialista Alexandra Leitão a surgir como desafiante do incumbente, Carlos Moedas, que, através da coligação Novos Tempos (entre PSD, CDS, MPT, Aliança e PPM), em 2021 ganhou a liderança da autarquia com 34,26% dos votos.Sintra também promete uma batalha eleitoral, com duas mulheres a disputar o executivo que, deixará inevitavelmente de pertencer a Basílio Eleito, eleito pelo PS. Neste elenco, estarão Ana Mendes Godinho, do PS, e Rita Matias, do Chega.Em Oeiras, o duelo será entre o líder do executivo municipal, Isaltino Morais, e a socialista Ana Sofia Antunes.Na Amadora, Suzana Garcia, candidata do PSD, desafia o atual presidente da Câmara, Vítor Ferreira, do PS, que ocupou o lugar na sequência da ida da sua antecessora, Carla Tavares, para o Parlamento Europeu.Em Setúbal, Maria das Dores Meira liderou o executivo daquele município até 2021, eleita pela CDU. Por ter atingido o número máximo de mandatos permitidos, ficou fora da corrida nas últimas autárquicas, cedendo o lugar a André Martins, também eleito pela CDU. Agora, Maria das Dores Meira regressa como independente, mas com o apoio do PSD, o que sublinha o duelo entre incumbente e desafiante..Autárquicas. Ana Abrunhosa (PS) anuncia coligação com Livre, PAN e Cidadãos por Coimbra.Dores Meira agradece apoio do PSD mas recusa "interferências partidárias" na candidatura à Câmara de Setúbal