Apoiantes de Albuquerque “apreensivos” com decisão de Marcelo, recordista em Conselhos de Estado
Esta sexta-feira, dia em que Marcelo Rebelo de Sousa fica a 417 dias de deixar Belém, o número de reuniões do Conselho de Estado convocadas por um Presidente da República atinge um novo máximo: 37. De todos os presidentes eleitos democraticamente, desde 1976, nenhum consegue aproximar-se do ritmo de Marcelo - desde que convocou, pela primeira vez, a 7 de abril de 2016, os conselheiros para uma reunião [nesse dia com Mario Draghi, então presidente do BCE, e Carlos Costa, na altura governador do Banco de Portugal, como convidados] sobre a situação económica e financeira da Europa e os projetos do Programa de Estabilidade e do Programa Nacional de Reformas.
Jorge Sampaio, que soma 22 Conselhos de Estado, convocou o primeiro em julho de 2005 sobre a “situação europeia, abordando nomeadamente as suas causas, as perspetivas de evolução e as suas implicações para Portugal” tendo como convidado Freitas do Amaral que era ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, no Governo de José Sócrates.
No último, em junho de 1996, em que foi emitido “parecer favorável sobre a Proposta de Alteração do Estatuto Orgânico de Macau” - tema que atravessou também boa parte das convocatórias de Mário Soares - estiveram ausentes, mas com “justificação” Jardim, Madruga da Costa, Soares, Alegre e Eurico de Melo.
Mário Soares, o primeiro Presidente civil, terceiro nesta lista, convocou por 17 vezes os conselheiros, mas a quase totalidade ocorreu no primeiro mandato. No segundo, só marcou quatro Conselhos de Estado. Ramalho Eanes (11 vezes) e Cavaco Silva (12 vezes) foram os que menos usaram o órgão político de consulta de um Presidente da República.
Marcelo Rebelo de Sousa, que prometeu [e cumpriu] reunir pelo menos quatro vezes por ano o seu órgão consultivo, demorou somente 30 dias a realizar a primeira reunião - e se a média se mantiver há de ultrapassar as 40 convocatórias.
Cavaco Silva, pelo contrário, precisou de 351 dias e no seu primeiro Conselho de Estado, a 22 de fevereiro de 2007, levou à discussão “o envolvimento das Forças Militares e de Segurança Portuguesas em Operações Humanitárias e de Paz” e “os fatores [económicos] condicionantes da participação portuguesa em operações humanitárias e de apoio à paz”.
Se o primeiro demorou mais de 11 meses, o segundo Conselho de Estado aconteceu nove dias depois. E o tema foi o mesmo que hoje leva Marcelo Rebelo de Sousa a reunir os 18 conselheiros: a dissolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira e posterior convocação de Eleições Regionais.
Alberto João Jardim tinha-se demitido, a 19 de fevereiro desse ano, em protesto contra a nova Lei das Finanças Regionais do Governo de Sócrates. Líder dos destinos madeirenses há 29 anos, Jardim foi a votos e reforçou a anterior maioria absoluta afundando, mais uma vez, o PS. É neste ano, de 2007, que o número deputados passa de 68 para 47 e é criado um único círculo eleitoral da Madeira. Marcelo Rebelo de Sousa era nessa altura conselheiro de Estado designado por Cavaco Silva.
A Madeira voltaria a ser novamente tema, em 2015, depois de Jardim ter perdido, em dezembro de 2014, a liderança do partido para Miguel Albuquerque. Com a segunda demissão de Jardim, a 12 janeiro de 2015, Cavaco Silva volta a reunir o Conselho de Estado, 14 dias depois, e a recolher “parecer favorável à dissolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira”.
Das eleições de 29 de março de 2015, com Albuquerque na liderança, resulta a primeira maioria à tangente - por um deputado.
Em 2019, pela primeira vez desde 1976, o PSD-M não consegue alcançar as repetidas maiorias absolutas de Jardim. Nesse ano, o Governo social-democrata só consegue manter-se com o apoio de um adversário de 43 anos, o CDS. O PS, nessa altura, conseguiu a menor diferença de sempre em votos e deputados para o PSD.
Em 2023, Albuquerque vai a votos numa coligação com o CDS, mas o resultado somado é pior do que o de 2019. Só o apoio do PAN permite uma maioria escassa: por um deputado. No dia das eleições caiu a promessa repetida em campanha de que só “seria Governo com maioria absoluta”. O Governo cairia no ano seguinte.
A constituição de Miguel Albuquerque como arguido e a perda dos apoios parlamentares de CDS, PAN e Chega levam à demissão do presidente do Governo Regional em janeiro de 2024. Há novamente eleições, agora em maio. E novamente, Albuquerque não consegue a “maioria absoluta” que garantia ir conseguir. Seis meses e 22 dias depois, a 17 de dezembro, a moção de censura do Chega aprovada por toda a oposição, facto inédito, derruba Miguel Albuquerque.
O que mudou agora? Jardim demorou 36 anos até ter um adversário interno. Miguel Albuquerque só precisou de nove anos, mas recusa “eleições internas” apesar de Manuel António Correia, antigo secretário Regional, já ter recolhido as assinaturas necessárias para que seja convocado um congresso extraordinário. O antigo dirigente do PSD aguarda resposta do Conselho de Jurisdição desde 23 de dezembro, dia em que entregou 540 assinaturas - e somente 300 são necessárias.
Este deslizar do tempo, sem justificação até agora, encurta os prazos que podem permitir uma disputa interna no PSD-M. Esse tem sido, aliás, um dos argumentos de Miguel Albuquerque - “não há tempo” - para além dos recorrentes de que eleições no partido seria uma “medida suicidária”, “um favor aos adversários”, que “não há eleições internas ao abrigo da vontade do freguês”.
No entanto, “tempo” não é problema para Paulo Cafôfo, presidente do PS-M, que já marcou, depois de desafiado por diversas vezes pelo ex-líder Carlos Pereira, eleições diretas para 31 de janeiro e congresso para 22 e 23 de fevereiro - a tempo das Eleições Regionais.
“Albuquerque não tem outra alternativa que não seja demitir-se. O PSD-M não pode ser mais opaco e menos democrático e transparente que o PS", já disse Manuel António Correia ao DN.
No PS, a resposta de Carlos Pereira foi a recusa de ir a “jogo” e o líder dos socialistas só uma conclusão tira: “Num dia quer avançar, no outro dia - quando se lança a oportunidade - não avança. Portanto, ficou claro que as suas intenções continuam a ser só as de prejudicar o partido.”
A critica aos que recusam o “jogo” eleitoral interno foi também alargada a Albuquerque que tem “medo de eleições internas” e não tem a “humildade” de dar a palavra “aos militantes”.
No CDS é cada vez mais evidente o rompimento das relações inauguradas em 2019 com Miguel Albuquerque. José Manuel Rodrigues, líder regional do partido, quer uma “nova maioria” e “um novo presidente”. Ricardo Vieira, ex-líder, advogado e sócio da Abreu Advogados Madeira , colocou-se ao lado dos partidos da oposição contrariando Albuquerque e a “ameaça” de que “sem orçamento aprovado” as obras do hospital - um investimento importante para região - vão parar.
“Toda a jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Tribunal de Contas, bem como todos os pareceres de jurisconsultos, indicam que um governo demissionário, sem orçamento aprovado, pode praticar atos relevantes para o interesse público e não apenas os estritamente necessários à gestão corrente dos negócios públicos”, afirmou.
A questão que continua a criar “apreensão”, apurou o DN junto de apoiantes de Albuquerque, é a data que Marcelo Rebelo de Sousa vai escolher para a realização das Eleições Regionais.
A primeira possível é dia 16 de março. Miguel Albuquerque até já admitiu o domingo seguinte, dia 23.
“Se o Presidente da República marca para depois disso não há como evitar a candidatura de Manuel António Correia”, diz ao DN fonte dirigente do PSD-M.