Semana horribilis no PS. Nomeações, delações, deserções, infeções. Mas vêm aí milhões da UE

O primeiro-ministro espera compensar os sucessivos casos desta semana anunciando na próxima, com a presidente da Comissão Europeia a seu lado, que os milhões da União Europeia estão cada vez mais próximos de chegarem
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Depois do 10 de Junho, o primeiro-ministro António Costa ficou no Funchal a passar uns dias de férias. Merecidas férias, terá pensado o próprio, depois de uma semana em que os casos se foram sucedendo, cada um mais desgastante do que o outro (e não se sabe se o "Medina Gate" não o atingirá pessoalmente, enquanto ex-presidente da CML).
Na próxima semana, o primeiro-ministro tentará dar a volta ao texto com um programa de peso: segunda-feira assina em Bruxelas o regulamento que cria o certificado digital covid-19 da UE. E na quarta, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, estará em Lisboa a anunciar formalmente a aprovação do Plano de Recuperação e Resiliência português.

A resolução do Conselho de Ministros foi publicada no "Diário da República" em 27 de maio passado. Pedro Adão e Silva, comentador político, professor universitário (de sociologia), antigo dirigente do PS (no tempo da liderança de Ferro Rodrigues),era nomeado comissário executivo das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril (2024), sendo equiparado, na remuneração, a dirigente superior de 1º grau da Administração Pública, o que significa um salário bruto de de 3745,26 euros e 780,36 euros em despesas de representação. O despacho prevê a existência de um comissário adjunto e de uma estrutura técnica com um máximo de oito pessoas, equiparados a "membros de gabinete de um membro do Governo": três adjuntos; três técnicos especialistas, um secretário pessoal e um motorista. E com mandato até 31 de dezembro de 2026, estando o comissário autorizado a acumular este cargo com a docência universitária.

Isto foi o suficiente para desencadear uma tempestade política - mas ao retardador. Em 7 de junho, o Porto Canal emitiu uma análise extraordinariamente crítica da escolha de Pedro Adão e Silva. A peça do Porto Canal foi suficiente para Rui Rio desencadear o primeiro ataque político à escolha de Adão e Silva. "O PS tem os seus "comentadores independentes" espalhados pelos diversos canais para vender a propaganda socialista e tentar destruir os adversários... mas esse trabalhinho tem um preço. Chegou a vez de Pedro Adão e Silva receber a compensação. Pagamos nós; com os nossos impostos", escreveu no Twitter, no dia seguinte, 8 de junho. A partir daí, toda a direita foi à boleia de Rio e criticou duramente a escolha do Governo. António Costa, pelo seu lado, respondia a Rio considerando o seu comentário "insultuoso". O próprio PAN - parceiro do PS a viabilizar o Orçamento do Estado - criticou os gastos com a nomeação. À esquerda do PS, o Bloco de Esquerda manteve-se em silêncio e o PCP tentou passar ao lado da polémica dizendo, através de Jerónimo de Sousa, que mais importante do que o nome do comissário será o conhecimento dos critérios e objetivos da celebração do cinquentenário da revolução. A polémica, na verdade, só começou a arrefecer quando o Presidente da República assegurou que a escolha do Governo tinha tido o seu "aval". Adão e Silva, pelo seu lado, assegurou ter suspendido a docência universitária. Dito de outra forma: não acumulará vencimentos.

Outra escolha governamental polémica foi a da atual deputada do PS (e ex-ministra do Mar, e mulher do atual ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, com quem aliás integrou o Conselho de Ministros na legislatura 2015-2019) Ana Paula Vitorino para presidir à Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT). A escolha foi do ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, e neste momento o processo estará a ser avaliado pela CReSAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública).

Esta foi mais uma situação que Rui Rio explorou a seu favor, na senda do que fez em relação à escolha de Pedro Adão e Silva - de resto, nos seus comentários públicos o líder do PSD misturou ambas as situações, pedindo explicações sobre ambas, em conjunto. Quanto a Ana Paula Vitorino disse: "Trata-se de uma nomeação feira pelo Governo da esposa de um outro ministro [Eduardo Cabrita], que não o que nomeia [Pedro Nuno Santos], mas, mais relevante do que isso, de uma deputada do PS." Salientando que não estava a pôr em causa a competência da deputada do PS e ex-ministra para o cargo, concluía, no entanto, "o Governo está cada vez a afunilar mais as suas escolhas". Pedro Nuno Santos teve de vir a terreiro salientar que Ana Paula Vitorino "é uma das pessoas mais qualificadas no nosso país da área [dos transportes] e quem a conhece percebe que tem um perfil que garante independência face aos regulados". Pelo meio, várias vozes socialistas foram sublinhando que a AMT, sendo uma entidade reguladora, não fiscaliza o Governo, antes os operadores do setor.

É um clássico do PS, as guerras permanentes dentro das estruturas dos socialistas do Porto. Desta vez os protagonistas são três: José Luís Carneiro, secretário-geral adjunto do PS (e antigo presidente da câmara de Baião, nos arredores agrícolas do Porto); o eurodeputado Manuel Pizarro, presidente da distrital do PS do Porto; e o deputado na AR Tiago Barbosa Ribeiro, presidente da concelhia do PS-Porto. O problema é: face ao favoritismo de Rui Moreira na sua mais que garantida recandidatura a presidente da câmara (para um terceiro e último mandato), que candidato apresentará o PS? Carneiro, Pizarro e Barbosa Ribeiro são voluntários. Só que Carneiro não parece ter apoio da concelhia e da distrital; Pizarro, por sua vez, já perdeu duas vezes e teme-se que perca uma terceira por margem ainda maior; e Barbosa Ribeiro é demasiado esquerdista para ter a concordância de Costa. Este desencantou assim uma quarta via: Eduardo Pinheiro, secretário de Estado da Mobilidade. O convite foi noticiado; e no dia seguinte recusado - Pinheiro percebeu que não teria os socialistas do Porto a acompanhá-lo. Delicadamente, disse que não. António Costa lavou as mãos: os barões socialistas portuenses que se entendam e arranjem uma solução. Tudo parece apontar para José Luís Carneiro - mas no PS do Porto verdadeiramente nunca se sabe.

O caso mais grave da semana seria tornado público na quarta-feira. Via Observador e Expresso, o país soube que, em janeiro deste ano, a Câmara Municipal de Lisboa entregou à embaixada da Rússia em Lisboa as identidades completas (nomes, moradas, emails, telefones) de três russos (dois deles também com cidadania portuguesa) que promoveram uma manifestação anti Putin (a propósito da detenção do ativista Alexei Navalny) em frente àquela representação diplomática. Os ditos ativistas afirmavam-se agora receosos pela sua segurança, tendo todos a certeza de que não podem voltar ao seu país natal. Carlos Moedas, o candidato do PSD à câmara de Lisboa, aproveitou para de imediato exigir a demissão do socialista presidente da câmara, Fernando Medina. O CDS-PP desenvolveu ações no Parlamento e junto das instituições europeias. Da esquerda à direita, unanimemente, toda a gente se uniu a censurar a conduta da CML.

Fernando Medina não teve outro remédio senão assumir o erro e pedir desculpa aos ativistas - anunciando também alterações nos procedimentos de autorização das manifestações. Mais uma vez, o Presidente da República correu em socorro dos socialistas, afirmando-se compreensivo com o presidente da autarquia. Medina ainda não anunciou a recandidatura a Lisboa mas já sabe que parte ferido. E sabe também sabe que, depois deste caso, dificilmente poderá continuar a constar na lista dos putativos candidatos à sucessão de António Costa na liderança do PS.

A vacinação vai fazendo o seu caminho mas o facto é que o desconfinamento também vai produzindo, em paralelo, os resultados que se esperavam: mais infetados e um progressivo aumento da pressão sobre o SNS, tanto no número de internados gerais como nos que estão nos cuidados intensivos. Em Lisboa, os números vão-se tornando cada vez mais preocupantes. Em regra, o número de novos infetados diários na região de Lisboa e Vale do Tejo é metade, ou mais, do do número registado no resto do país. No concelho de Lisboa a incidência pandémica já é (números de ontem) de 222 casos por cem mil habitantes a 14 dias. É quase o triplo do valor nacional (79,3 casos). Resultado: nesta semana, o Governo teve de anunciar que o desconfinamento iria ter de parar na capital (bem como em Braga e Odemira). O teletrabalho continua obrigatório (no resto do país passou a "recomendado") e os restaurantes continuam a só poder funcionar até às 22.30.

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