Mandato terminado. Presidente do TC recusa sair pelo próprio pé

João Pedro Caupers já está em mandato prorrogado mas, em nome da "estabilidade necessária ao funcionamento do Tribunal Constitucional", recusa por ora renunciar. Só o fará quando lhe elegerem um substituto.

E vão três. Em 13 juízes do Tribunal Constitucional (TC), há três cujo mandato já expirou - mas mantêm-se em funções. Já estavam nessa situação o vice-presidente Pedro Machete (desde 1 de outubro de 2021) e Lino Ribeiro (20 de junho de 2022). Desde o passado dia 6, o próprio presidente do TC, João Pedro Caupers, entrou nessa situação. Os três magistrados têm uma característica em comum: foram cooptados para o TC pelos restantes dez juízes (tendo estes sido eleitos pela Assembleia da República).

"O presidente do Tribunal Constitucional João Caupers, terminado o seu mandato, assegura as funções até à sua substituição, cumprindo o procedimento previsto na Lei e garantindo assim a estabilidade necessária ao funcionamento do Tribunal Constitucional."

Todos têm um mandato único de nove anos, o prazo que já expirou nos casos de Machete, Ribeiro e Caupers. Mas nenhum deles tenciona renunciar enquanto os dez eleitos não escolherem os seus substitutos. E assim os mandatos poderão prolongar-se indefinidamente.

Caupers não tenciona sair pelo seu próprio pé, o que foi confirmado ao DN numa nota do seu gabinete. "O presidente do Tribunal Constitucional João Caupers, terminado o seu mandato, assegura as funções até à sua substituição, cumprindo o procedimento previsto na Lei e garantindo assim a estabilidade necessária ao funcionamento do Tribunal Constitucional." Na mesma nota, recorda-se o enquadramento legal: "Segundo o artº 21º da Lei do Tribunal Constitucional, "os juízes do Tribunal Constitucional são designados por um período de nove anos, contados da data da posse, e cessam funções com a posse do juiz designado para ocupar o respetivo lugar"". Além disso, "o processo de cooptação é da exclusiva responsabilidade dos juízes eleitos pela Assembleia da República".

Estes, porém, não se mexem. A situação bloqueou em maio de 2022, quando os dez juízes eleitos pela AR não se entenderam entre si para eleger o professor universitário António Almeida Costa, autor de teorias ultraconservadoras em matérias como o aborto.

Almeida Costa iria substituir o vice-presidente Pedro Machete mas não conseguiu ser eleito. Machete ficou. Agora compete ao juiz "mais idoso" do TC (dos eleitos pela AR) desencadear internamente o processo de substituição dos três juízes cooptados com mandato expirado. Esse juiz é José João Abrantes (58 anos), que chegou ao tribunal eleito pelo Parlamento, por indicação do PS, em julho de 2020.

Mudanças na revisão

O processo de revisão constitucional em curso discutirá propostas que alteram o funcionamento do Tribunal Constitucional (TC). Eis algumas dessas propostas.

Direitos dos deputados
O artigo 281 da Constituição da República prevê que um décimo dos deputados à Assembleia da República (ou seja: no mínimo 33) possam suscitar ao TC que verifique a constitucionalidade ou ilegalidade de lei, tendo as suas decisões "força obrigatória geral". Foi aliás por causa do uso deste mecanismo que o TC chumbou por unanimidade a lei dos metadados. Agora a Iniciativa Liberal quer que esse direito seja alargado a um grupo parlamentar (e o da IL só tem oito deputados).

Juízes eleitos
O Tribunal Constitucional é composto por 13 juízes: dez eleitos pela Assembleia da República, os quais, por sua vez, elegem os restantes três (por isso chamados juízes cooptados). Isso está previsto em mais do que um artigo, nomeadamente o 163, que determina as competências do Parlamento face a outros órgãos. O Chega propõe que o número de eleitos pelo Parlamento diminua de dez para oito, aumentando de três para cinco os juízes cooptados.

Presidente da AR
A proposta de revisão constitucional apresentada pelo Chega reflete o conflito que o grupo parlamentar do partido tem mantido ao longo da legislatura com o presidente da Assembleia da República. O socialista Augusto Silva Silva já recusou agendar diplomas do Chega argumentando com a sua inconstitucionalidade. Agora o Chega propõe um novo direito para os grupos parlamentares: "Recorrer ao Tribunal Constitucional caso considerem que os seus direitos constitucionalmente previstos estão a ser violados pelo Presidente da Assembleia da República." A proposta vai ser chumbada.

Leis regionais
Iniciativa Liberal e PSD defendem que nos poderes do Presidente da República relacionados com o Tribunal Constitucional deve ser acrescentado mais um: o de suscitar a fiscalização preventiva da constitucionalidade de leis originárias dos parlamentos regionais (Madeira e Açores).

joao.p.henriques@dn.pt

Nota: Notícia retificada às 17h05 de 21 de março. Foi eliminado o parágrafo onde se contou que o penalista Costa Andrade renunciou unilateralmente ao mandato de juiz, em fevereiro de 2021, completos que estavam os seus quatro anos e meio de mandato como presidente do TC. De facto, Costa Andrade só deixou o TC quando foi substituído.

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