Louçã pede esquerda unida em Lisboa e evoca Sampaio para pressionar PS
Foto: Líbia Florentino/Global Imagens

Louçã pede esquerda unida em Lisboa e evoca Sampaio para pressionar PS

Em 1989, Jorge Sampaio conquistou a autarquia da capital, resultante de um acordo do PS com o PCP, que contava também com a adesão do Partido Ecologista 'Os Verdes' (PEV), do MDP/CDE, da UDP e do PSR.
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O antigo coordenador do BE Francisco Louçã utilizou este sábado a candidatura do socialista Jorge Sampaio à câmara de Lisboa em 1989 para pedir uma união à esquerda contra Carlos Moedas (PSD) nas próximas autárquicas, pressionando o PS.

"Vencer [Carlos] Moedas é uma obrigação se a esquerda quer dar a cidade de volta aos cidadãos. E lembro, por isso, Jorge Sampaio. Quando quis derrotar a direita, Sampaio fez três coisas: candidatou-se (e era o secretário-geral do PS), juntou toda a esquerda da cidade e apresentou um programa de 50 medidas por um ano, a começar por domesticar o imobiliário", lembrou Francisco Louçã.

O ex-coordenador do BE falava na 5.ª Conferência Nacional, que decorre até domingo, no Porto, com o objetivo de debater o rumo estratégico do partido e as eleições autárquicas, marcadas para 2025.

E "se o PS continua a mostrar que não quer disputar a cidade", Francisco Louçã pede ao Bloco que "insista como Sampaio", avisando que "para vencer é preciso unidade, protagonismo forte e um programa ainda mais forte".

No documento apresentado à conferência, a comissão política do BE defende, sempre que possível, alianças alternativas a governações autárquicas de PS e PSD, mantendo, contudo, a abertura para uma aliança à esquerda que desafie Carlos Moedas em Lisboa -- da qual o PCP já se distanciou, tendo apresentado o nome de João Ferreira.

Em dezembro de 1989, Jorge Sampaio conquistou a autarquia da capital, resultante de um acordo do PS com o PCP, que contava também com a adesão do Partido Ecologista 'Os Verdes' (PEV), do MDP/CDE, da UDP e do PSR.

Foi este o exemplo que Francisco Louçã lembrou hoje para pressionar os socialistas, afirmando que "se mais ninguém quiser", o BE "escolhe ser a força que luta contra o capital imobiliário" na capital.

Num futuro programa autárquico para Lisboa, os bloquistas priorizam a redução do alojamento local, a suspensão de construção de hotéis ou "terrenos públicos disponíveis, geridos pela Câmara, com cooperativas de habitação e grandes zonas de mobilidade verde".

"É possível. Talvez seja mais difícil acordar um programa confiável e forte do que passar por um buraco da agulha. Mas nós não somos de desistir", garantiu.

Louçã deixou ainda duras críticas a Carlos Moedas, que acusou de estar a expulsar os lisboetas da capital, lamentando que o imobiliário seja "o dono da cidade".

"Carlos Moedas, que modestamente diz de si próprio ser o melhor autarca de todos os dias, é o chefe desse bando. Na baixa, há 71% de alojamento local. Há novos hotéis todos os meses. Com Moedas, o melhor que podemos esperar é que os lisboetas, alguns, sejam preservados num bairro zoológico em que cantem canções folclóricas e joguem ao 'pim-pam-pum' para entreter o turista", ironizou. 

Bloquistas divergem sobre eventual coligação com PS em Lisboa com alertas sobre diluição

A 5.ª Conferência Nacional do BE foi palco de algumas divergências entre bloquistas sobre uma eventual coligação autárquica com o PS em Lisboa, com alertas para uma possível diluição política, mas também apelos a uma "candidatura alargada".

Num documento apresentado à conferência, que esteve reunida na Escola Secundária Carolina Michaelis, no Porto, a comissão política do BE defende, sempre que possível, alianças alternativas a governações autárquicas de PS e PSD no país.

No texto, a direção alargada do Bloco faz questão, contudo, de salientar a sua abertura para uma convergência à esquerda que desafie o social-democrata Carlos Moedas em Lisboa - apelo deixado hoje pelo antigo coordenador Francisco Louçã, que frisou a importância da luta contra a especulação imobiliária num eventual entendimento pré-eleitoral com os socialistas.

Contudo, nem todos os bloquistas se manifestaram favoráveis a esta ideia, com o dirigente Manuel Afonso, que integra a Mesa Nacional, a deixar a questão: "O que é que Lisboa tem que o resto do país não tem?".

O dirigente realçou que, na "tropa especuladora que tomou a cidade de assalto, Moedas é o chefe", mas tem "um fiel escudeiro, que é o PS".

"Certamente que uma eventual vitória derrotando Carlos Moedas seria uma respiração democrática. Mas, quatro anos seguintes atados ao seu lugar-tenente da especulação seriam um sufoco", avisou.

Na mesma linha, Samuel Cardoso considerou "um erro diluir a candidatura do Bloco em Lisboa" numa coligação liderada pelo PS, argumentando que os socialistas "nunca vão aceitar uma política de rutura com os interesses imobiliários".

"Esta opção é má porque cola o BE ao PS em toda a área metropolitana de Lisboa e no país pelo centralismo mediático que Lisboa tem, num contexto em que o PS está colado a um governo de direita que temos que combater", sustentou.

O ex-deputado Heitor de Sousa defendeu que o BE deve apresentar candidaturas próprias e procurar alianças onde tal não for possível, lembrando que o PS é o partido que lidera mais autarquias no país.

"Ter uma perspetiva de aliança com o PS em Lisboa é a mesma coisa que entregar o ouro ao bandido", alertou.

O dirigente Bruno Góis saiu em defesa de uma eventual coligação, afirmando que "se Lisboa deve ser uma exceção não é porque o BE inventou essa exceção", mas sim porque "o país é macrocéfalo".

Reconhecendo que a habitação deve ser uma prioridade programática, o dirigente da Mesa Nacional defendeu que o BE deve, em Lisboa, "empenhar-se em dar tudo para a construção de uma candidatura mais alargada possível para derrotar Carlos Moedas".

Bruno Góis lembrou que o partido já teve acordos autárquicos em Lisboa e "mostrou que não está amarrado a nada".

Durante a tarde, alguns bloquistas divergiram também sobre se o partido deveria priorizar a luta de classes e dos trabalhadores comparativamente a causas sociais como o feminismo, o antirracismo ou as lutas LGBTQIA+, ou se todas essas lutas convergem numa lógica interseccional.

O histórico fundador Fernando Rosas rejeitou a ideia de que "a identidade do Bloco se dissolve" em alguns destes movimentos sociais e salientou que "a centralidade do trabalho não pode ser incompatível contra tudo o que o capitalismo representa para além da extração de mais-valia: o racismo, a homofobia".

"Precisamos de alianças com princípios, abrir e não fechar. Não devemos aceitar o regresso às cavernas quanto à natureza do partido que queremos", avisou, lembrando o lema bloquista de que "é essencial travar a luta toda".

A mesma tese foi defendida pelo fundador Luís Fazenda, por Francisco Louçã ou pelo ex-deputado Pedro Filipe Soares, que chegou a acusar estes críticos de estarem do lado de uma esquerda "conservadora, em dissolução e moribunda".

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