“Empoderar” a Polícia Municipal. Margarida Blasco pede parecer “urgente” à PGR

“Empoderar” a Polícia Municipal. Margarida Blasco pede parecer “urgente” à PGR

Ministra da Administração Interna entende que não há unanimidade de interpretação e é necessária uma clarificação das competências desta força policial para identificar e deter suspeitos de crimes.
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A ministra da Administração Interna vai pedir, com caráter de urgência, um novo parecer ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) em relação ao poder das Polícias Municipais de Lisboa e do Porto para identificar e deter suspeitos de crimes, sabe o DN.

Margarida Blasco entende que não há unanimidade de interpretação e é necessária uma clarificação destas competências. Isto apesar de o Conselho Consultivo já se ter pronunciado em 2008 e em 2018  sobre os limites de atuação destes agentes municipais declarando que, apesar de serem oriundos da PSP, “não constituem forças de segurança, estando-lhes vedado o exercício de competências próprias de órgãos de polícia criminal (OPC).”

Esta iniciativa de Blasco decorre da controvérsia instalada no início da semana quando o presidente da Câmara Municipal de Lisboa fez declarações a dizer que a Polícia Municipal de Lisboa (PML) estava a fazer detenções, qualificando a situação como “uma grande mudança na filosofia de atuar na cidade”. A forma como foi feito o anúncio deixou implícito que os agentes da PML tinham passado a agir como se fossem OPC e que tinham deixado, como impõe a lei que regula a atividade destas forças, de chamar a PSP para oficializar a detenção.

Carlos Moedas veio depois tentar esclarecer o sentido das suas declarações: “A Polícia Municipal está na rua e, se houver um crime, a Polícia Municipal - que são polícias de Segurança Pública - tem de atuar. Eu dei essa indicação ao comandante e posso dizer que, em Lisboa, todos os dias tem havido esse tipo de detenções, mas, obviamente, depois têm de chamar a PSP.”

Precisando que a “orientação” foi por si dada “há mais de um ano” ao comandante da PML, superintendente José Carvalho Figueira, o autarca lamentou, ainda assim, que as detenções estejam dependentes da chegada ao local da PSP, considerando que essa exigência legal “cria uma perceção errada sobre a Polícia Municipal”.

O seu homólogo do Porto, Rui Moreira, já tinha criticado Moedas, considerando que autarcas terem órgãos de investigação criminal na respetiva competência - que acreditava ser o que resultava da pretensão de Moedas - “viola a Constituição” e equivaleria a “avançar para o modelo americano dos xerifes”, abrindo “uma Caixa de Pandora”.

Fonte do ministério que está a acompanhar o processo, revelou ao DN que “perante este divergências, a sra. ministra entendeu que se torna imperiosa uma interpretação clara e transparente sobre as funções, atribuições e competências em que estão investidos os agentes das Polícias Municipais de Lisboa e Porto”, solicitando o “parecer com com caráter de urgência”. 

Uma “polícia integral” e com crachás da PSP

Na verdade, antes mesmo de terem vindo a público as palavras de Carlos Moedas, cerca de uma semana antes, quem esteve na cerimónia que assinalou o 133º aniversário da PML, no passado dia 17 de setembro, ouviu do próprio comandante quais eram as suas ambições.

“Os polícias municipais no exercício da sua missão e das suas competências, quando verifiquem a prática de crimes em flagrante delito, devem ter a competência para a  prática dos atos processuais adequados e tendentes à detenção dos infratores. É perceção das comunidades locais que os polícias municipais estão limitados na sua capacidade de garantir uma detenção, o que nos fragiliza e nos expõe a um risco acrescido”, afiançou José Carvalho Figueira, que foi chefe do Serviço de Segurança da Presidência da República, com Cavaco Silva (tal como o atual diretor nacional da PSP, Luís Carrilho).

Para Carvalho Figueira “a circunstância de as Polícias Municipais de regime especial se encontrarem limitadas à figura da entrega sob detenção, acaba por exigir uma intervenção adicional de outros OPC, o que se traduz numa sobreposição de recursos ineficiente”. E concluía: “Se não somos competentes como OPC com capacidade de efetuar detenções em flagrante delito, poderá questionar-se qual a vantagem dos municípios de Lisboa e do Porto recrutarem polícias das fileiras da PSP?”

O superintendente defendeu que a PML, “sendo uma instituição fundamental na segurança da cidade”, deveria desde logo “constituir-se como uma polícia integral no âmbito das suas  competências”, com a sua “ação de comando” alicerçada em duas ideias “fundamentais: empoderar os polícias da Polícia Municipal; corresponder às necessidades de segurança da cidade e dos seus munícipes”.

Informou que para “materializar” esse desígnio tinha reintroduzido o “NUIPC (Número Único de Identificação de Processo-crime)”, que permite “registar ocorrências de natureza criminal e, através desse número, identificar, rastrear e acompanhar essas ocorrências”.

Paralelamente, afirmou, foi reforçada “a autoridade dos polícias da Polícia Municipal, de uma forma bem visível, pela reintrodução do crachá da PSP” que desde esse dia passaram “a usar, por direito, no uniforme”, mantendo “a simbologia” da CML.  “Iniciámos também, a substituição das armas de fogo individuais por armamento mais moderno, em articulação com a PSP”, desvendou.

Aproveitou ainda para, na presença de Luís Carrilho, apelar a que a PML possa ter acesso ao Sistema Estratégico de Informações (SEI) da PSP - uma base de dados com informação policial.

“Não podemos, aliás, a segurança do país não poderá continuar a permitir que a informação recolhida na abordagem das centenas de pessoas que, diariamente, são identificadas pela Polícia Municipal, pelas mais diversas razões, nomeadamente em fiscalizações de trânsito, de venda ambulante e de estabelecimentos, não seja  cruzada com a informação constante na base de dados da PSP.”

“Quantas pessoas identificadas pela Polícia Municipal, tendo ações pendentes na PSP (notificações, pedidos de averiguação, mandados de detenção), passam impunes? Não sabemos, mas certamente serão algumas”, sublinhou.

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