Corrupção na Defesa. 73 acusados na operação "Tempestade Perfeita"
O Ministério Público deduziu já a acusação do inquérito que investigou suspeitas de corrupção da Defesa, envolvendo funcionários do Ministério e empresas. O despacho foi concluído no passado dia 10 e enviado aos arguidos.
Entre os 73 acusados do presente inquérito, que teve a Unidade Nacional de Combate à Corrupção a executar a investigação, estão Alberto Coelho, o ex-diretor-geral da ainda mais poderosa estrutura de aquisições e gestão de serviços do MDN, a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional (resultante da fusão da Direção -Geral de Pessoal e Recrutamento Militar com a Direção-Geral de Armamento e Infraestruturas de Defesa); Paulo Branco, diretor de serviços da gestão financeira; e Francisco Marques, diretor de serviços de infraestruturas e património. Ambos foram escolhidos por Alberto Coelho.
Os principais crimes que consubstanciam a acusação são a corrupção ativa e passiva, peculato, branqueamento e falsificação de documentos.
Além dos três dirigentes já referidos, estão ainda acusados outros quatro funcionários do MDN, 36 empresários e familiares, bem como 30 empresas.
Alberto Coelho está acusado de três crimes de corrupção passiva, um do branqueamento, dois de peculato e um de falsificação de documento. Terá recebido, pelo menos, um Audi, no valor de 39 500; mobiliário de jardim no valor de 1177 euros, obras de remodelação da casa, no valor de 13 mil euros.; duas televisões e uma serigrafia.
Paulo Branco está acusado de cinco crimes de corrupção passiva, dois de branqueamento e quatro de falsificação de documento. Terá sido corrompido com obras de remodelação numa casa na Comporta, no valor de 92 mil euros; eletrodomésticos no valor de 3 600 euros; numerário em cerca de 150 mil euros.
Francisco Marques está acusado de quatro crimes de corrupção passiva, dois de branqueamento e dois de falsificação de documento. Terá recebido pelo favorecimento às empresas 28 500 euros para comprar Audi; obras de remodelação na sua casa no valor de 12 700 euros; 170 mil euros em numerário.
Jantares, estadias em hoteis e viagens, vinhos Pêra Manca, equipamento informático estão também na lista de valores que o MP dá como provado terem sido usados para corromper os dirigentes do MDN.
Para todos os seis funcionários do MDN que ainda estão no ativo (Coelho está reformado) o MP requereu pena acessória de proibição do exercício de função.
Condena ainda Alberto Coelho a pagar ao Estado cerca de 86 mil euros, o que estima ter recebido em vantagens; Paulo Branco deverá pagar 415 mil euros; Francisco Marques, cerca de 270 mil; os empresários 634 mil, correspondente às valores de que se apropriaram ilegitimamente.
O intervalo temporal da investigação incidiu especialmente no período entre 2018 e 2021 - a maior parte, em 2020, no período em que João Gomes Cravinho foi Ministro da Defesa.
A investigação apurou que só neste ano foram feitas cerca de 30 das quase cinco dezenas de adjudicações suspeitas entre 2019 e 2021, no valor de mais de cinco milhões de euros.
Com muitas escutas, vigilâncias e um escrutínio rigoroso às contas bancárias dos envolvidos, o MP e a UNCC conseguiram estabelecer ligações, que a investigação considerou criminosas, entre os altos quadros do MDN e as empresas.
Obras não executadas, material pago e não entregue, obras executadas por empresas diferentes das contratadas, propostas fictícias, demolições pagas que não aconteceram, contratos não escritos e já os habituais fracionamentos de custos para fugir aos concursos, estão entre a lista de casos descritos na acusação.
Como o DN já noticiou, foi a empreitada da requalificação do Hospital Militar de Belém (HMB), e derrapagem de 750 mil para 3,2 milhões de euros, a fazer avançar mais a investigação, com Alberto Coelho à cabeça e por cujas comprovadas irregularidades já foi condenado pelo Tribunal de Contas (TdC) a pagar uma multa de 15 300 euros.
Alberto Coelho, era um dos mais antigos quadros do MDN, foi nomeado para as funções na Diretor-Geral de Recursos da Defesa Nacional (DGRDN) durante o mandato do ministro Aguiar-Branco (Governo PSD/CDS-PP), em janeiro de 2015, cargo que ocupou até fevereiro de 2021, quando já estava sob suspeita.
Este antigo diretor-geral é um conhecido militante do CDS-PP, presidiu ao Conselho de Jurisdição do CDS, cargo que ocupou durante seis anos (até 2021) e fez parte.
Em 1980, servira no Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA) e, em 1992, fora transferido para a Direção-Geral de Pessoal e Infraestruturas do Ministério da Defesa.
Sob pressão do parlamento por causa da controversa derrapagem, o ex-ministro da Defesa João Gomes Cravinho não deixou de defender o seu diretor-geral, destacando que "prestou enormes contributos ao Ministério, que lhe estará sempre grato", classificando-o como "pessoa extremamente qualificada e capaz".
Recorde-se que nessa altura uma auditoria interna do MDN atribuía a Alberto Coelho responsabilidade pela volumosa derrapagem.
Como prova de confiança, Gomes Cravinho validou a nomeação de Alberto Coelho para Presidente do Conselho de Administração da ETI (EMPORDEF - Tecnologias de Informação, S.A), uma empresa do universo da holding IdD Portugal Defence.