Cinco da tarde. A azáfama na sala do Altis é das televisões e das rádios. Ligam-se cabos, testa-se o som, ensaiam-se os primeiros diretos, o rumor de vozes é ainda brando. No exterior, é impossível não perceber o que se está a passar. Os carros de exteriores, as câmaras que hão de registar os momentos da noite enchem os passeios de um lado e do outro..E apesar da hora, já há quem, sendo apoiante socialista, queira descer e ocupar lugar nas dezenas de cadeiras, ainda vazias, que rodeiam o palanque, o púlpito e o placard esverdeado com duas sinaléticas: António Costa 2002 e o símbolo do PS. "Só mais tarde, que as urnas só fecham às sete", dizem-lhe. A mulher, de casaco castanho, comprido, ainda insiste, mas depois lá desiste, contrariada..Os sinais de umas eleições concorridas, o "taco-a-taco", já eram tema de conversa pela "surpresa". Procuravam-se leituras para os mais de 700 mil votantes ao meio-dia (23,27% de participação) em relação a 2019 e a afluência de 45,66% às quatro da tarde, quase tanto quanto o total das últimas legislativas (48,57%). "Isto favorece quem? O Costa? O Rio? Será a direita a mobilizar-se?". As perguntas não tinham resposta, ainda..18:20. O rumor começa a ouvir-se: "Dizem que o Costa vai ganhar isto", "Quem diz?", "É o que toda a gente está a dizer", "Ainda agora me disseram isso". Na sala, dois homens começam a colocar bandeiras do PS - umas verdes, outras vermelhas - nas cadeiras ainda vazias. Minutos depois, espalham mais cores: amarelo e branco. E logo de imediato cartazes. De um lado a frase da campanha ("Juntos seguimos e conseguimos"), do outro: "Continuar a Avançar"..A agitação aumenta. Em frente ao hotel começam a juntar-se fotógrafos, câmaras, jornalistas, gente do staff socialista. No hall de entrada, as luzes para os diretos das televisões iluminam todo o espaço. O corrupio aumenta..19h. Os dirigentes socialistas começam a chegar. Muitos seguem diretamente para o 12.o andar, lugar onde o secretariado do PS se vai reunir. As projeções das televisões, que só dali a uma hora seriam divulgadas, mas cujas linhas gerais já eram do conhecimento de alguns, são motivo de sorrisos. A "crença" cresce e não é pela queda na abstenção. António Costa chegaria 14 minutos depois. À entrada, no lado direito do hall, pára e responde às perguntas. Não parece ter pressa. Fica quase cinco minutos. O microfone tinha sido montado minutos antes. O líder socialista, que andou a pedir uma "maioria", depois uma "maioria absoluta" e que acabou por concluir que os portugueses "não querem uma maioria absoluta (...) não queriam, não querem, não desejam", sublinha uma ideia: "estas eleições não eram iguais às outras" e os portugueses perceberam isso: são "eleições essenciais para o país"..E deixa um desejo: "que a noite eleitoral seja esclarecedora". Horas antes, questionado sobre se tinha dois discursos preparados, evitou certezas: "só tenciono fazer um discurso logo à noite"..19:45. Já há lugares ocupados com apoiantes. Num dos cantos, um casal marca lugar deixando uma mochila cor de rosa e azul entre duas cadeiras. No outro extremo, no lado direito, há duas dezenas de pessoas em pé. Vão conversando, todos aguardam pelas 20h. Há quem tire selfies. O ruído na sala já é grande..19:59. Todos os apoiantes se juntam em frente às três televisões que estão ligadas no lado direito da sala. 20H. A sala explode num grito:" PS, PS, PS... vitória, vitória, vitória". Há palmas, risos e alguém grita, erguendo os braços, "fascismo nunca mais". Os da JS animam a festa e cantam - "O povo já votou e o PS já ganhou... De quem o povo gosta? António Costa" -, e no meio deles um homem de idade não pára de gritar os slogans. E ergue bandeiras, uma em cada mão. São poucos os que estão sentados. "Aquilo quer dizer que podemos chegar à maioria?", pergunta um dos jovens. A pergunta fica sem resposta, está tudo concentrado nas projeções..Sala cheia. São 20:28. Está quase tudo em pé. A mulher que às cinco da tarde queria descer já está sentada. Os fotógrafos aglomeram-se junto ao púlpito. A chegada de Duarte Cordeiro deixa de novo a sala de novo ao rubro. E mais ainda quando deixa antever, com um sorriso, mas sem palavras claras a possibilidade de uma maioria perto da absoluta. A cada resposta às perguntas dos jornalistas, a sala irrompe em palmas. No final, João Galamba subiu ao palanque e abraçou Duarte Cordeiro..Na rua, frente ao hotel há grupos que vieram fumar uns cigarros. E todos estão de telemóvel na mão. João Galamba vai comentando os resultados que vão sendo conhecidos. "Estou quase a explodir", diz um dos homens do grupo..21:05. Manuel Alegre chega ao Altis. Num instante fica rodeado de câmaras. É Duarte Cordeiro quem o recebe e o acompanha até ao 12.o andar. Na sala, o ambiente acalmou. Uns grupos estão frente às televisões a ver os resultados. Uns ficam, outros já estão a preparar o que se irá passar nas ruas. Pouco a pouco, saem pessoas de bandeiras nas mãos. Outros entram..As conversas já só andam redor da "maioria absoluta". Há cada vez mais gente a chegar. Muitos já só têm lugar, lá fora, na rua frente ao Altis. Mais gente, mais bandeiras e abraços e nem as palavras de António Costa à RTP - "o cenário extremo não previsível "- arrefeceram os ânimos. Círculo a círculo eleitoral, há quem some os deputados e faça contas aos mais pequenos que podem decisivos nas contas finais..A sala está a abarrotar, há gente sentada - não sobram cadeiras vazias -, dezenas e dezenas em pé e um cruzar de conversas que cria um ruído intenso, quase um alvoraçar. Mas, nem isso afastou uma mulher de trazer as duas filhas pequenas para "a festa do PS". Os minutos vão passando. Nas televisões, fala Rui Rio, mas na sala onde António Costa irá falar, dali a minutos, quase ninguém escuta uma palavra. Há meia dúzia de interessados, mas nem esses devem ter ouvido o líder do PSD dizer que se demite se Costa tiver maioria absoluta. Os gritos de "vitória, vitória" da JS abafam por completo o som das televisões..E de repente, canta-se o "Grândola, Vila Morena". Os slogans gritados mudam: "Fascismo nunca mais, 25 de Abril sempre"..00:05. O líder do PS chega para o discurso final. Durante instantes o nome de "Costa" é cantado e aplaudido. As palavras de agradecimento do primeiro-ministro são demoradas, é "uma noite especial", explica. E a garantia? "Uma maioria absoluta não é o poder absoluto, não é governar sozinho.".A sala esvazia-se, mas lentamente. No palanque onde Costa discursou há grupos que se demoram para tirar selfies. Outros, mais afoitos, sobem ao púlpito.