Cova da Moura. "Estes agentes não são um bando de malfeitores. São pessoas de bem"
Sem surpresas, a defesa dos 17 polícias acusados de sequestro, agressões, injúrias e tortura, motivados pelo ódio racial, contra seis jovens da Cova da Moura, reafirmou toda a versão dos arguidos e desvalorizou a investigação do Ministério Público (MP) e da Unidade Nacional de Contraterrorismo da PJ. Tudo uma "invenção" e uma "efabulação" das vítimas e das testemunhas da acusação, uma investigação "que não investigou", sublinhou a advogada Isabel Gomes da Silva.
"Temos aqui pessoas de bem, homens de família. Porque haviam de esta a mentir colocando em causa a sua vida pessoal e profissional? Porque iriam criar um cenário assim? Não faz sentido!", assinalou, acrescentando que "estes agentes não são bando de malfeitores, são pessoas com carreiras exemplares de 10, 20 anos".
No início das alegações finais, Isabel Gomes da Silva congratulou-se com a presença na sala do comandante do Comando Metropolitano de Lisboa (COMETLIS), superintendente-chefe Jorge Maurício, que assistiu à sessão fardado, numa iniciativa interpretada como de apoio aos polícias arguidos.
A estratégia da defesa foi a mesma que tinha sido em julgamento - descredibilizar a investigação do MP e da PJ, as testemunhas da acusação e a versão das vítimas. Começou com Bruno Lopes, uma das seis vítimas, sobre o qual lembrou que, "à data dos factos (5 de fevereiro de 2015), tinha 24 anos e sete condenações, cinco das quais por roubo".
"Então porque é que a palavra dele vale mais do que a destes homens respeitáveis?", questionou, referindo-se aos arguidos. A detenção de Bruno Lopes na Cova da Moura foi o facto que acabou por desencadear os incidentes na esquadra, quando um grupo liderado por Flávio Almada e Celso Lopes - monitores do Moinho da Juventude, uma associação de apoio social no bairro - se dirigiu à esquadra de Alfragide, para onde tinha sido transportado o jovem.
A defesa voltou a reiterar a verão que já tinha insistido no julgamento, segundo a qual os jovens tentaram invadir a esquadra para libertar Bruno Lopes e os agentes foram obrigados a usar a "força estritamente necessária" para travar o ataque - e que todas as lesões descritas nos relatórios hospitalares são "compatíveis" com a "força utilizada contra a resistência dos assistentes (vítimas)".
"Mentira, mentira, mentira", repetiu várias vezes Isabel Gomes da Silva quando recordava a versão dos jovens da Cova da Moura, que tanto a PJ como o MP subscreveram por inteiro e fundamentaram a acusação contra os 18 polícias (um deles foi despronunciado em fase de instrução). Nem agressões como as descritas, nem tortura e muito menos racismo.
Para a defesa os reconhecimentos feitos na PJ estão "inquinados e têm que ser invalidados", porque "havia setinhas" nas fotografias dos arguidos e nenhum foi feito com agentes fardados. Estes reconhecimentos, sabe o DN, foram feitos na presença do procurador responsável do inquérito, Paes de Faria.
Isabel Gomes da Silva lamentou que a investigação se tivesse "demitido" da sua função e que apenas se tivesse limitado a "acreditar na versão dos assistentes e das testemunhas - por sinal todos conhecidos uns dos outros e todos ligados ao Moinho da Juventude", facto que, no seu entender retira toda a "isenção e objetividade" às suas descrições.
"Não houve sequestro, porque as detenções foram legais, não houve excesso de agressões, pois foi usada apenas a força estritamente necessária contra a resistência dos assistentes", afirmou a advogada que pediu a "absolvição de todos arguidos por todos os crimes" que lhe foram imputados.
Voltando-se para o coletivo perguntou se "perante tantas contradições e dúvidas" como as que apresentou nas suas alegações finais se "é capaz de condenar algum destes homens?".
A leitura da sentença está marcada para o dia 30 de abril.