Chegam aviões da China com máscaras, testes e ventiladores, pagos pela comunidade chinesa
A comunidade chinesa em Portugal é, agora, uma das grandes ajudas na proteção contra a epidemia. Aproveitando o que sempre fizeram - comércio - e o facto de a China ser um dos principais fornecedores de material médico, como máscaras, fatos e até ventiladores, estão a usar os seus contactos para trazer muitos destes produtos para oferecer a Portugal e para reunir donativos para comprar esses artigos para doar aos hospitais.
"No início da pandemia na China, a comunidade chinesa fez duas coisas: juntou dinheiro e comprou máscaras, desinfetante, para enviar para Wuhan, onde começou o surto, e organizou-se em Portugal para que os chineses que regressassem da China fizessem a quarentena", conta a professora de mandarim, Wang Suoying. Com o vírus a chegar a Portugal, a comunidade voltou-se para o país onde vive. "A situação mudou, temos tido muitos pedidos de materiais, e todos se uniram para juntar dinheiro e comprar esses materiais para os hospitais e outras instituições portuguesas. Quem vive cá, também deve ajudar o país, ajudamo-nos uns aos outros", diz Wang .
É o que faz Jie Min, nascido em Portugal, filho de pais chineses. Tem 23 anos, acabou de tirar o curso de piloto comercial, e desde que começou esta crise tem distribuído máscaras aos bombeiros, polícias e sem-abrigo. "Sou voluntário no Centro de Apoio à Comunidade Chinesa, inicialmente comprava as máscaras nas farmácias dos supermercados, sobretudo cirúrgicas e algumas FFP2, agora não as consigo encontrar. Pedi ajuda à minha mãe, que tem um restaurante em Matosinhos, estamos a pedir orçamentos a fábricas na China, para decidirmos onde as vamos importar", conta.
A sua história já foi até notícia na televisão chinesa. Até agora conseguiu 500 máscaras que vai distribuindo de uma forma muito simples: "Ando na rua e quando encontro polícias, bombeiros, operacionais, estaciono o carro e vou entregar uma máscara. Também já fiz isso com os sem-abrigo."
A ajuda de Jie é pequena, mas em tempo de crise todas são poucas. Esta semana está prevista a chegada de mais um avião da China com material, e lá no meio estarão, por exemplo, as cem mil máscaras compradas pela autarquia de Lanxi e a associação de caridade de Lanxi, a Lanxi Hongze Charity Hall, que serão entregues à Câmara Municipal de Alenquer. Será a edilidade a fazer a distribuição - e esta foi uma parceria intermediada pela Liga dos Chineses em Portugal. A comunidade chinesa em Portugal recolheu e enviou para a China cerca de 350 mil euros entre dinheiro e material de proteção para o novo coronavírus disse esta terça-feira o presidente da Liga dos Chineses.
"A Liga espera cem mil máscaras e vieram nosso pedido", diz Y Ping Chow, o presidente daquela associação. "O destinatário é a Câmara Municipal de Alenquer, mas vão servir também para as autarquias da Maia, Condeixa, Vila do Conde e Vila da Feira, que nos pediram apoio." Esta é a maior encomenda que tiveram até agora, mas não é a única. A Liga foi recolhendo pequenas doações que possibilitaram também a compra direta de material aos armazéns chineses em Portugal - como máscaras, muito desse material doado diretamente ou angariado com dinheiro de privados e pequenos comerciantes. Estes materiais que foram entregues às câmaras de Vila do Conde, Maia e Braga.
Xiaoqin Jiang, por exemplo, vive em Vila do Conde e formou uma associação informal de mulheres chinesas só para comprar artigos para serem usados no combate à pandemia. "Organizámo-nos e juntámos dinheiro. Da primeira vez conseguimos quatro mil e tal euros, da segunda, mais de sete mil. Com o primeiro dinheiro que juntámos, comprámos 1500 máscaras cirúrgicas [que devem ser usados para quem está infetado] e N95 [FFP2, com respiradores e maior proteção, devendo ser usadas pelos profissionais que assistem os doentes] e entregámos à Câmara de Vila do Conde para enviar para o hospital. Da segunda, conseguimos comprar 5500 máscaras cirúrgicas e entregámos às câmaras de Vila do Conde, Maia e Braga", conta Jiang, que tem armazéns em Vila do Conde.
A primeira entrega teve direito a notícia nos jornais locais com a informação que metade desse material seguiu para o Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/ Vila do Conde. A presidente da câmara, Elisa Ferraz, agradeceu "a generosidade e a disponibilidade de todos em ajudar".
Em Lisboa, tem sido Choi Man Hin, administrador do Casino Estoril e presidente da Associação de Comerciantes e Industriais Luso-Chinesa e do Centro de Apoio à Comunidade Chinesa, que tem centralizado os donativos. Desde o dia 20 de março, angariaram 65 mil euros, dinheiro que vão colocar à disposição da Embaixada de Portugal em Pequim, para a compra de material de proteção e equipamento médico.
Explica Choi Man Hin: "Vamos dizer à Embaixada de Portugal em Pequim, ao embaixador Augusto Duarte, que temos esse dinheiro para comprar o material médico de maior necessidade, uma vez que não existe em Portugal. Queremos ajudar as instituições portuguesas, em especial os hospitais e as clínicas."
Entretanto, também os portugueses em Macau se juntaram para abrir uma conta bancária, Portugal Conta Solidária, numa iniciativa que junta duas dezenas de entidades, empresas e pessoas em nome individual. A conta foi aberta no dia 26 de março e, em menos de uma semana, angariaram 104 mil euros.
Nos últimos anos, as grandes empresas chinesas têm ganho presença em Portugal. E agora também elas participam no esforço de ajuda. A Fosun - o maior investidor chinês em Portugal, na Fidelidade, Millenium e Luz Saúde - que mandou vir um milhão de máscaras, 200 mil testes desenvolvidos pelo departamento médico da Fosun, a Fosun Pharma, óculos e fatos de proteção num avião da Tap que foi de propósito a Xangai buscar a ajuda, obtida também com a parceria das chinesas Haitong Bank e Haitong Securities.
O gigante Ali Baba, com a sua Fundação Jack Ma - nome do fundador da empresa - que, por estar sediada em Hangzhou, a capital do estado de Zhejiang onde vieram mais imigrantes chineses para Portugal estabeleceu uma parceria com Portugal e enviou um avião com máscaras, batas e testes.
Outro gigante chinês, a China Three Gorges, acionista da EDP, doou 50 ventiladores, 200 monitores médicos e ainda consumíveis e materiais de suporte, tudo no valor de quatro milhões de euros. A procura de material no mercado chinês é elevadíssima e os negócios fazem-se como num leilão. "Se tivéssemos hesitado por cinco segundos para fechar o investimento, este equipamento médico nunca aqui teria chegado", disse, na conferência de imprensa a anunciar a ação, Zhang Dingming, vice-presidente executivo da China Three Gorges. Em sentido contrário, a EDP doara 200 mil materiais de apoio médico a hospitais em Wuhan, quando a China se encontrava no período mais crítico de propagação da covid-19.
A televisão de Zhejiang vai também fornecer à sua congénere RTP um carregamento de máscaras protetoras.