Uma solução para a distribuição de jornais no interior

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A iminência de oito distritos do interior do país ficarem sem distribuição de jornais e revistas a partir de 2026 é, antes de tudo, um sinal político preocupante. Trata-se de um problema mais simbólico do que estrutural, mas que nem por isso é menos relevante. Como sabem os diretores da imprensa que assinaram a carta aberta “Em defesa da imprensa, alerta à democracia”, a migração de leitores do suporte impresso para o digital é estrutural e, por isso, inevitável.

Ainda assim, este é um sinal – mais um – da marginalização progressiva a que, nas últimas décadas, têm sido sujeitos os territórios periféricos. Sendo este um fenómeno europeu e também norte-americano, em Portugal assume uma expressão particularmente grave. Basta comparar com a realidade espanhola, onde o centralismo estatal e a macrocefalia das grandes cidades são incomparavelmente menores do que em Portugal.

Tão relevante quanto o “desgaste da partilha por todo o país dos grandes fluxos da atualidade, das principais notícias e interesses coletivos”, apontado pelos diretores da imprensa, é o agravamento do sentimento de abandono vivido pelas populações do interior. Mais do que o acesso à informação – que a digitalização tende a resolver –, o desaparecimento dos jornais impressos alimenta a chamada “geografia do descontentamento” e causa danos reais à democracia e à coesão territorial.

Como tem sido amplamente discutido a propósito da proposta da Comissão Europeia para o Quadro Financeiro Plurianual 2028-2034 – que centraliza os fundos de coesão, concentra decisões nos governos nacionais e afasta autoridades locais e regionais – deixar regiões para trás tem consequências políticas profundas e representa um risco sério para a democracia. Portugal teve disso um exemplo claro nas eleições mais recentes: o descontentamento territorial alimenta o crescimento de partidos populistas e de extrema-direita, fragiliza a estabilidade democrática e gera sentimentos anti-imigração, anti-Europa e de rejeição das elites políticas.

Como escreveu José Manuel Ribeiro, até há pouco presidente da delegação portuguesa no Comité Europeu das Regiões, “a ‘geografia do descontentamento ’revela que áreas economicamente estagnadas se tornam focos de voto antissistema. A erosão da confiança nas instituições democráticas ocorre precisamente nos territórios onde as pessoas sentem que foram esquecidas”.

Para combater este sentimento de abandono, que se traduz em radicalização política e rejeição das elites, é simbolicamente relevante manter a distribuição de jornais impressos no interior. Tal como acontece com o porte pago da imprensa regional, o Governo pode criar um subsídio específico que assegure a entrega de jornais nacionais em todos os concelhos do país.

Esse subsídio, contudo, não deve ser entregue exclusivamente à VASP, o único operador de distribuição de imprensa em Portugal. Deve ser aberto, de forma concorrencial, às cadeias da grande distribuição que dispõem de redes logísticas com cobertura nacional: não há praticamente município sem lojas do Modelo/Continente, Pingo Doce, Auchan, Intermarché, Minipreço, Lidl, ALDI, da Bensaude Distribuição, nos Açores, ou do grupo madeirense Sá, entre outros.

Com o estímulo certo, e sem beneficiar indevidamente qualquer operador, será possível garantir a chegada da imprensa a todo o país – de Montalegre a

Mértola, do Porto Santo às Flores e ao Corvo. Será necessário pouco dinheiro, uma vez que a procura por jornais e revistas impressos é hoje reduzida. Mas fará toda a diferença para a coesão territorial e para a qualidade da nossa democracia.

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