Regeneração?

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Tenho alguma dificuldade em encontrar um termo não desgastado ou desvirtuado pelo uso recente para designar o que me parece de importância central para que o aparelho burocrático-administrativo do Ministério da Educação regresse ao papel que já teve, mas que foi sendo transformado em outra coisa, sob a acção dos decisores políticos e a conivência das chefias que foram sendo nomeadas.

Há pouco mais de uma década houve um ministro que falou na necessidade de “implosão” desse aparelho, criticando mesmo o papel de “comissários políticos” que assumiam alguns dos seus agentes no terreno. Pela mesma altura, no mesmo quadrante político falou-se na necessidade de “refundação” do Estado e dos serviços públicos, algo a que assisti em primeira mão, porque fui um dos poucos participantes críticos na conferência Pensar o futuro - um Estado para a sociedade, realizada em Janeiro de 2013.

O balanço concreto dessas ideias, muito em linha com a deriva ideológica do “Estado Mínimo” que tem marcado as últimas décadas, foi a erosão de muitos serviços públicos, com uma degradação dramática da sua qualidade e com efeitos mais desastrosos em áreas como a Saúde e a Educação, em especial para as parcelas da população economicamente mais desfavorecidas.

No caso da Educação Pública, terminamos outro ano lectivo com os problemas de sempre, agora acrescidos dos que resultam da pretensa transição digital e da ineficiência de diversas “plataformas” onde se desenvolvem diversos procedimentos indispensáveis para o lançamento do próximo ano, como é o caso das matrículas. Mas não só, porque ao longo do ano também foram sensíveis as falhas de plataformas que têm custado muitos milhões de euros ao Estado para criar e manter, como é o caso do E360.

Como escrevi, estes problemas repetem-se. Podendo juntar-se outros como os das plataformas digitais para classificação de provas de aferição ou exames do Secundário. Ou dos concursos de professores.

Qualquer consulta ao Portal-Base permite verificar os avultados encargos com estas “ferramentas”. Já este ano, para “Desenvolvimento evolutivo e corretivo do Portal das Matrículas” foi feito um contrato de cerca de 750 000 euros (mais IVA).

Para “Aquisição de licenças de administração aplicacional e de produtos de segurança e privacidade para a Plataforma Digital da Educação (PDE)” o Instituto de Gestão Financeira da Educação investiu quase 4,2 M€ (+IVA) o mês passado. E se recuarmos no tempo, entre o IGeFE, a Direcção-Geral da Educação, a Direcção-Geral das Estatísticas da Educação e Ciência ou mesmo a Secretaria-Geral do ME, são muitos os milhões que, apesar da aparente diversidade de empresas contratadas, foram encaminhados quase sempre nas mesmas direcções. O que é curioso, atendendo aos sucessivos problemas verificados.

Na área do apoio ao funcionamento das escolas, de esclarecimento dos procedimentos ou de verificação da sua legalidade, a estrutura administrativa do Ministério da Educação, que no início deste século funcionava com razoável independência e autonomia técnica nos seus pareceres e intervenções, foi-se transformando num mero braço operacional dos humores políticos de cada situação, com consequências graves na cobertura dada a ilegalidades evidentes, desde que ao serviço da política “certa”.

Como sair desta situação, em que incompetência e instrumentalização se perpetuam, ano após ano?

Haverá regeneração possível?

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