Preso às férias, como nos desenhos de Piranesi!
As minhas férias são um labirinto de dimensões épicas, mas aparentemente vazias de propósito ou de outra qualquer função. Tal como eu gosto!
São dias cheios de inquietação, carregados de perspetivas retorcidas e impossíveis, fazendo lembrar as Carceri d’invenzione de Piranesi.
Piranesi, arquiteto e artista gráfico, criou, em meados do séc. XVIII, 16 gravuras de prisões imaginárias. Um destes seus desenhos podia muito bem ser uma ilustração fiel das minhas férias, pois sinto-me preso numa estrutura espacial e fantasiosa, e assoberbado por espaços intrincados que vão dar a sítio nenhum.
Preso a uma tentativa de desmame de um ano de trabalho carregado de teams, de reuniões, de e-mails e de Excel (claro!), ou quiçá já aprisionado a este maravilhoso ramerrame de hotel-praia, praia-hotel.
Dou por mim preso a pequenos cadernos de desenho a riscar compulsivamente na praia. Preso, a observar os transeuntes que me rodeiam com os seus pés enterrados na areia até aos tornozelos.
Preso a observar, com inquietação, mas desconfiado, imaginando que também haverá alguém do outro lado do desenho que me observa de caneta em riste.
Percorro este labirinto de espaços imensos onde o nada se liga a lugar nenhum, onde chapéus de sol e recortes na paisagem emolduram perspetivas que vão até ao infinito, e onde a luz direta do sol, refletida no Mediterrâneo revela tão pouco quanto as sombras que surgem tímidas, misturadas nos reflexos do sol das 11.00 da manhã.
Vejo insistentemente maquinaria pesada, inimaginada, mas com roldanas pesadas e cordas grossas que ora seguram os banhistas às suas espreguiçadeiras, ora os levam a banhos.
Vejo recorrentemente iates que atravessam arcos de pedra, pervertidos numa perspetiva inviável e que neles desaparecem, como se entrassem numa dimensão paralela. Vagueio entre a vontade de voltar ao meu quotidiano e a necessidade de me manter mais uns dias neste mundo imaginado.
E eu, vazio de pensamento, lá me vou deslocando alegremente neste mundo enigmático a que chamam de “férias”. E adapto-me. Adapto-me de tal forma, que quando for a altura, não vou querer sair deste desenho labiríntico e imaginário do Piranesi e, então, regressar ao mundo real.