Parecer da DGS para quê? Afinal quem decide são os pais, diz Marcelo!*

*E na Madeira é o Governo Regional que tem boa ciência. Que é como quem diz, aquela que estabelece o que dá jeito aos políticos.
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Começo com uma espécie de declaração de interesses: sou totalmente a favor da vacinação (seja ela qual for, desde que aprovada pelas autoridades competentes); estou eu próprio vacinado contra a covid-19 (vacina da Moderna); de tudo o que já li sobre o assunto, as vacinas de RNA mensageiro (como as da Pfizer e da Moderna) são uma maravilha científica com um potencial de aplicações que ainda agora começámos a explorar no combate a várias doenças.

Dito isto...

É absolutamente inacreditável o que se está a passar na Madeira com a vacinação aos adolescentes.

Não que nada disto verdadeiramente surpreenda. Afinal, depois de o primeiro-ministro ter afirmado, preto no branco, durante o debate do Estado da Nação, no Parlamento, que a vacinação destes jovens iria mesmo ter lugar, pouca gente duvidou que tal não aconteceria. Isto independentemente do que dissesse a Direção Geral da Saúde -- e a ciência na qual os seus pareceres (supostamente) se baseiam.

Apesar de tudo, na sexta-feira, a declaração de Graça Freitas foi bem mais cautelosa do que cheguei a prever: recomenda as vacinas para os jovens apenas quando estes sofram de doenças graves, desaconselhando para todos os outros.

A diretora-geral da Saúde, aliás, reconheceu que são "precisos mais dados" para que seja tomada uma decisão mais definitiva.

Dito de outra forma, a ciência pura e simplesmente não sabe ainda dar boa resposta a esta questão. Os jovens de 12 anos estão em crescimento, o seu sistema imunológico está em evolução e existe um risco (muito provavelmente reduzido) de a vacina, ao mexer no seu ADN relacionado com esta área, ter efeitos ainda imprevisíveis a longo prazo.

Tendo em conta o baixo risco de doença grave de covid deste grupo etário (a não ser que o indivíduo em causa tenha uma doença grave associada), a vacina não é -- pelo menos até ver -- aconselhada. Faz sentido, é de elementar bom-senso.

Este sábado, no Brasil, Marcelo Rebelo de Sousa, do alto da sua sapiência científica adquirida nas cadeiras de Direito, virou o argumento ao contrário: a DGS não proibiu, logo é permitido.

Assim, cabe aos pais decidirem se querem que os seus filhos sejam ou não vacinados, disse o sr. Presidente. Porque, como é claro de ver, os pais sabem muito mais de ciência e de medicina do que os técnicos da DGS que emitiram o parecer -- e do que todos os pediatras que têm vindo a mostrar reservas nas últimas semanas sobre a vacinação massiva de crianças nesta altura, tendo em conta o que se sabe!

Entretanto, os mesmos pais veem o Arquipélago da Madeira simplesmente a ignorar a DGS e a avançar com as vacinas para os miúdos. E com muitos elogios pelo "sinal de maturidade" que estes deram por terem ido à pica.

Ok, vamos lá ser sérios...

Quase de certeza que não vai nascer nenhum terceiro olhinho na testa ou coisa que o valha a estes jovens por levarem a vacina da covid.

Mas na realidade ninguém sabe exatamente que consequências a 10 ou 20 anos este fármaco pode ter na vida deles. São necessários mais testes, é preciso mais tempo.

O que eu sei é que não são os políticos que podem tomar estas decisões, e muito menos os pais, ouvindo aqueles.

E também sei que Marcelo Rebelo de Sousa e a maioria dos responsáveis madeirenses que agora assim decidiram já não estarão cá para ver se alguma coisa vier de facto a correr mal com os jovens vacinados. Mas é pena. Porque caso haja um grande azar, deveriam poder ser julgados pelas decisões de hoje.

Jornalista

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