Para o povo nada, para o militarismo tudo

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Se um país quiser investir em habitação, saúde, educação, transportes, infraestruturas, se quiser apoiar a actividade produtiva ou o desenvolvimento científico e tecnológico, se quiser aumentar salários e pensões ou combater a pobreza e a exclusão social, isso só pode ser feito desde que não sejam ultrapassados os limites do défice orçamental e da dívida pública fixados pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento (na formulação revista e reforçada pelos diversos mecanismos de controlo económico e orçamental que estão hoje ao dispor da União Europeia).

Se quiser investir em equipamento militar, armas, munições, tecnologia militar ou no prolongamento de uma guerra aprovada pela UE - nomeadamente a guerra na Ucrânia - não precisará de se preocupar com os limites do Pacto porque a Comissão Europeia vai criar uma excepção para esses gastos.

É este absurdo político que resulta das palavras da presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, quando afirmou recentemente que irá propor a ativação da cláusula de derrogação (do Pacto de Estabilidade e Crescimento) para os investimentos em Defesa.

Vinte anos depois da aprovação do Pacto, a racionalidade económica e orçamental dos seus critérios continua por explicar. Mas estão bem à vista as consequências e os fins da sua aplicação. E é também evidente que essa aplicação não é a mesma para todos nem para tudo.

As consequências dos critérios do Pacto estão à vista na queda do investimento público, na degradação dos serviços públicos, no agravamento do atraso relativo de Portugal face às principais potências da UE, na crescente dependência externa, na contenção dos salários.

Os fins a que se destina a aplicação do Pacto ficaram especialmente à vista com as políticas dos PEC e das troikas em Portugal, entre 2008 e 2015. Foi em nome dos seus critérios que se impuseram medidas draconianas de controlo político e económico, de entrega de empresas e sectores económicos estratégicos a multinacionais, de drenagem de recursos nacionais para as grandes potências da UE, de aprofundamento da exploração dos trabalhado- res em benefício dos grandes grupos económicos e financeiros.

Quando se tratou de aplicar o Pacto de Estabilidade a Portugal, Irlanda, Grécia ou Espanha para satisfazer os interesses dos megabancos e especuladores internacionais não se poupou nada. Quando são as potências da UE, como a França, a assumir abertamente que não vão cumprir os seus critérios, nada acontece.

As declarações de Von der Leyen sobre a excepção para os gastos com o militarismo mostram que a prioridade da UE é a aventura belicista e militarista. Esse é o ponto de partida para novas medidas de favorecimento dos grupos económicos e das multinacionais, apresentando a guerra como motor de uma economia concebida como economia de guerra.

A resposta aos problemas dos povos fica para trás e nem como excepção é considerada.

Quem não aceitar este caminho que levante a voz contra o Pacto!

Eurodeputado

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