Os sucessores

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Frank Di Fulvio fez recentemente uma análise cruzada das duplas Giorgia Meloni-J D Vance e Berlusconi-Trump; Meloni como sucessora de Berlusconi e Vance como possível sucessor de Trump. São duplas muito diferentes em quase tudo – personalidade, história de vida, formação cultural, e até ideias – mas vale a pena compará-las no que têm também de paralelo.

Trump é uma réplica americana de Berlusconi. São os dois politicamente incorrectos, fizeram toda a sua vida nos negócios, nas empresas, e entraram na política depois dos 60 anos. São grandes oradores e provocadores e conseguiram vencer, unindo as direitas – Berlusconi em coligação, uma coligação de nacionalistas, liberais e identitários; Trump tomando de assalto o Partido Republicano, tornando-o mais nacional-populista e identitário, “contra” o liberalismo-conservador de Reagan.

Também as histórias de vida de Meloni e de Vance são, de certo modo, paralelas. Vêm os dois “de baixo”: Meloni foi criada pela mãe, numa família que o pai abandonou; Vance, com pai alcoólico e mãe drogada, foi criado por uma avó como que saída do wild west americano. Meloni fez um caminho de militância política na Frente da Juventude da Alianza Nazionale, Vance teve um percurso militar e universitário.

Meloni vem da direita revolucionária, popular, de uma direita bem diferente da de Silvio Berlusconi, um dos homens mais ricos de Itália, virado para a liberdade económica e com grande irreverência e capacidade de provocação perante a esquerda e as ideias da esquerda.

Vance, ao contrário de Trump, vem de uma família pobre e desagregada e fez uma comissão de serviço nos Marines, no Iraque. O encontro com Peter Thiel, um multimilionário conservador e cristão, alterou o seu preconceito em relação aos crentes, que então considerava “básicos” (contra os descrentes, os oficialmente inteligentes). As universidades do Ohio e Yale e a sua conversão ao catolicismo em 2019 mudaram-no de vez.

No início, Vance reagiu muito mal a Trump, como muita gente na Direita, quando “the Donald” apareceu em 2016 em todo o seu excêntrico esplendor para neutralizar políticos sólidos como Jeb Bush, Ted Cruz e Marco Rubio. Mas, no exercício da presidência, o empresário arrogante que provocava e atacava políticos consagrados com graças e remoques, acabou por conseguir conquistar o “povo da Direita”, pelo esforço e o empenho em cumprir o programa prometido. Porque actuou dentro dos princípios e valores que interessavam à Direita, a Direita seguiu-o.

Meloni foi ministra de um governo Berlusconi; depois saiu e criou o seu próprio partido, os Fratelli d’Italia, um partido que começou por ter 3 ou 4% do eleitorado e que foi crescendo. Em 2022, consegue ser primeira-ministra de Itália, fazendo uma coligação com a Força Itália de Berlusconi e a Liga de Salvini. Hoje as expectativas de voto dos Fratelli passam dos 30%.

Meloni tem sido uma medida de equilíbrio na linha nacional-conservadora: é inteligente, é coerente e é realista, juntando o idealismo da “direita social” ao tradicionalismo cristão.

Vance não tem a verve de Trump ou a sua forma (única…) de captar o eleitorado, mas, se se apresentar como candidato republicano, pode ganhar a eleição e suceder a Trump, como Meloni sucedeu a Berlusconi na chefia da direita italiana. No caso dela, para melhor.

Politólogo e escritor

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

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