Opinião pessoal (LXXXIII) sobre um cronista

Publicado a

Começo por declarar que não conheço o cronista-comentador-jornalista Miguel Sousa Tavares. Para além de uma curta entrevista, há quase 20 anos atrás, no jornal da tarde da TVI, nunca o encontrei nem falei com ele pessoalmente.

Nessa época, os seus comentários e opiniões, tanto refletidos em textos escritos para jornais ou emitidos em intervenções diretas nos canais de televisão, com demasiada frequência não defendiam o interesse da Saúde Pública. Não eram, por isso, do meu agrado. Refiro-me, especialmente, ao tempo do início da preparação da Lei do Tabaco. Ora, na altura, eu desempenhava o cargo de diretor-geral da saúde. Sei bem o prejuízo que causaram os seus comentários do “contra”, incluindo os efeitos em líderes políticos, sempre preocupados sobre as opiniões negativas publicadas por jornalistas que influenciavam o sentido das setas para cima ou para baixo. Foram lamentáveis as posições que assumiu em relação à prevenção do tabagismo. Sublinho lamentáveis.

O “nosso” cronista considerava, então, que o fumador tinha a liberdade de fumar onde entendesse, uma vez que para ele era um direito individual protegido pela Constituição e que nenhum “fascista sanitário” podia limitar...

Passados tantos anos das posições que assumiu sobre a regulamentação da Lei, provavelmente já terá percebido que as restrições que foram impostas aos fumadores visavam proteger os não fumadores que frequentam os mesmos espaços públicos fechados, designadamente cafés, restaurantes, recintos desportivos, etc. As crianças que acompanham os pais, tal como os respetivos trabalhadores dos estabelecimentos passaram a respirar ar não poluído. Há que reconhecer que a mudança conseguida foi socialmente aceite. Unanimemente elogiada.

Vencido, nunca mais voltou a escrever sobre o assunto ao ter percebido o aplauso geral das medidas preventivas de 2007.

Por mera associação de ideias, lembrei-me do tema porque, em férias, li uma belíssima crónica de Miguel Sousa Tavares no Expresso de 8 de Agosto, intitulada “Vergonha”. Desenvolve a evolução dos acontecimentos recentes protagonizados por líderes europeus sobre Gaza com impressionante clareza. Como é possível ver tamanha desumanidade sem uma resposta firme dos governantes do Ocidente? Afinal são eles que têm o poder de impor sanções comerciais, financeiras, políticas e até desportivas aos países que ultrapassam as linhas ditas “vermelhas” que eles próprios balizam. Decidem a aplicação de penas, de confiscos, a suspensão em jogos da UEFA ou Olímpicos ou até em concursos da Eurovisão, mas só para os outros.

Hipocrisia sem vergonha.

Ex-diretor-geral da Saúde

franciscogeorge@icloud.com

Diário de Notícias
www.dn.pt