Opinião pessoal (LIX)
Volto aos episódios guardados nas minhas memórias associadas a Campo de Ourique, onde vivi o terceiro quartel do século XX.
Os liceus mais frequentados pelos filhos dos residentes no bairro eram, antes de mais, o Pedro Nunes e depois o Passos Manuel. O primeiro ficava a uma distância acessível, sem necessidade de transportes públicos, e o Passos Manuel era servido pelo número 28 dos carros elétricos da Carris que saía do largo fronteiriço ao Cemitério dos Prazeres e fazia o itinerário até à Rua da Conceição. Ou pagando o bilhete amarelo de 8 tostões ou pendurado atrás, os alunos liceais rapidamente faziam o percurso desde o bairro até à Calçada do Combro e de regresso, daqui para casa.
Ambos os liceus tinham sido inaugurados logo no início da República. Eram instalações modelares para a época.
Eu, aos 10 anos de idade, tinha sido colocado no Pedro Nunes e meu irmão gémeo no Passos Manuel.
Analisemos os patronos desses estabelecimentos do Ensino Secundário.
1 Sobre Pedro Nunes a unanimidade pelo reconhecimento da sua imensa grandeza como cientista e matemático eminente explica a decisão tomada para aplicar o seu nome ao liceu. Pedro Nunes nasceu em Alcácer do Sal, em 1502, e morreu em Coimbra aos 76 anos de idade. Foi cosmógrafo-mor e catedrático de Matemática. Além de outros tratados, nomeadamente sobre navegação, em 1567, publicou a obra-prima Libro de Álgebra, Aritmética e Geometria para ensinar a outros as suas descobertas.
2 Passos Manuel (1801- 1862) marcou a política nacional no período da Monarquia Liberal que se seguiu à aprovação da Constituição de 1822. Compreende-se que o seu nome tenha sido destinado ao liceu, uma vez que a sua ação política fora determinante na Reforma da Educação que criou o ensino liceal e que estabelecera a criação de um liceu em cada sede de distrito e dois em Lisboa (1836).
Porém, eu, ao estudar a personagem considerei muito curiosa a bizarria sobre o seu nome de batismo. Ora, ele mesmo, por sua autorrecreação, trocou o seu verdadeiro nome de Manuel Passos para “Passos Manuel”. Quando descobri o trocadilho adivinhei que iria ganhar o Quiz a meu Pai.
Assim aconteceu. No tal sábado, pela manhã, meu Pai chamou os gémeos para perguntar se já sabíamos quem eram os patronos dos nossos liceus.
Foi então que perguntei:
- Ó Pai, sabe que “Passos Manuel” afinal não existiu?
- Fiquem a saber que foi um ministro do Liberalismo que reformou o nosso ensino ao estilo francês.
- Ó Pai, repare que, na altura, o seu irmão José era também deputado e acontecia uma confusão quando o presidente do Parlamento dava a palavra ao deputado Passos. Para evitar irem os dois à tribuna, o Manuel resolveu dar a volta ao seu nome!
Ex-diretor-geral da Saúde
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