Opinião pessoal (XCII) sobre a segurança da vacinação

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Também para festejar os 60 anos comemorativos do início da Programa Nacional de Vacinação, consagro a prosa de hoje à segurança das vacinas na perspetiva de poder contribuir para a desmistificação da propaganda negacionista.

Ainda como estudante, na Faculdade de Medicina de Lisboa, percebi a importância social que representa a tendência das pessoas para elaborem perceções, em termos de pensamento, sobre as causas relacionadas com o aparecimento de uma doença aguda, em si mesmo ou em membro da família. Essa ideia é, quase sempre, baseada na relação temporal: essas pessoas são levadas a encontrar uma explicação mental relacionada com o que sucedeu pouco tempo antes.

Já este ano, a esse propósito, encontrei o pai de uma jovem, a quem tinha sido diagnosticada a síndrome de Guillain-Barré (polinevrite periférica sensitiva e motora), três semanas depois de ter sido vacinada contra a infeção do vírus do papiloma humano. Insistiu comigo que tinha sido a vacina a causar a doença da filha. Para ele, a relação causa-efeito era claríssima. Pacientemente, respondi-lhe que não tinha razão, uma vez que a determinação da causa de uma doença impunha a demonstração do mecanismo fisiopatológico capaz de a provocar. Disse-lhe que era necessária a comprovação científica do processo causal, muito para além da mera relação temporal. Só assim seria possível afirmar o nexo de causalidade. A seguir, mencionei que a referida doença existia, em níveis de frequência idênticos, muito antes do começo da vacinação e que, portanto, a relação com a vacina não seria estatisticamente admissível.

Como se sabe, relatos de episódios semelhantes são, frequentemente, reproduzidos nas redes sociais na tentativa de “alertarem” pais e mães para os “riscos” da vacinação dos filhos.

Mas, recentemente, a comunidade negacionista foi abalada pela publicação dos resultados de um estudo científico que demonstra a segurança, inequívoca, das vacinas. Cientistas dinamarqueses, liderados pelo médico Niklas Worm Andersson (facilmente acessível pelo Google), analisaram os registos correspondentes aos nascimentos de mais de 1,2 milhões de crianças, nascidas entre 1997 e 2018, na Dinamarca, que foram vacinadas durante os dois primeiros anos de vida. Depois dos registos terem sido cotejados com os dossiers clínicos respetivos de cada criança, concluíram que não havia sinais de toxicidade causada pela vacinação (vacinas adjuvadas pelo alumínio). Ficou, assim, comprovada a ausência de relação causal com 50 doenças neurológicas, alérgicas e autoimunes.

Nota final: Que diria Donald Trump das conclusões do estudo dinamarquês?

(Continua)

Ex-diretor-geral da Saúde

franciscogeorge@icloud.com

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