Quando alguém chega a um cargo para o qual não tem um pingo de familiaridade é chamado de "paraquedista"..Depois de dois médicos à frente do ministério da saúde que se demitiram por estarem fartos do presidente, Jair Bolsonaro nomeou como ministro interino da saúde em plena pandemia o general Eduardo Pazzuelo, que é, literalmente, paraquedista de formação..O paraquedista decidiu passar a ocultar os números de casos e óbitos com Covid-19, mudando os critérios de contagem adotados pelos dois antecessores e por todos os ministérios da saúde do mundo democrático..Antes dos fake data, foram as fake news. Elas ajudaram a eleger o atual presidente e são elas que vão mantendo animados os alucinados que ainda o sustentam..Em campanha, entre milhares de outras aldrabices, foi atribuída ao rival Fernando Haddad a ideia de comercializar biberons em forma de pénis para combater a homofobia; no poder, Bolsonaro vem proferindo duas afirmações falsas ou imprecisas por dia, de acordo com o site Aos Fatos..Como, conforme o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, corrupção se define por "tornar algo desonesto, injusto ou imoral", usar fake data e fake news é uma forma de corromper a sociedade. "As fake news são a corrupção eleitoral do século XXI", disse nesta semana, aliás, o juiz Marlon Reis, idealizador da elogiada Lei da Ficha Limpa..Da mesma forma, ao colocar na Fundação Palmares, organismo que visa preservar e promover a cultura afro-brasileira, alguém que classifica o movimento negro de "escória maldita", que chama as mães de santo de "macumbeiras" e considera o Zumbi dos Palmares, líder anti-escravatura que dá origem ao nome da fundação a que preside, de "filho da p***", o presidente da República comete, segundo juristas, o crime de "desvio de finalidade", isto é, uso indevido do poder que lhe é conferido..E, de acordo com o jurista Elias da Costa Farias em artigo publicado no site jurídico Jus.Com.Br em 2017, "o desvio de finalidade é a semente de toda a corrupção"..Esse desvio de finalidade no governo Bolsonaro também pode ser demonstrado no ministério do ambiente, cujo ministro é um notório anti-ambientalista (e, porque não, no ministério da educação, ocupado por um cidadão que incorre numa média de um erro ortográfico a cada 280 caracteres)..Segundo o psicanalista Christian Dunker, entretanto, "a fonte primeira da corrupção é a proteção da família"..Sobre esse tema, vejamos o que disse o próprio presidente sobre a atribuição da embaixada de Washington a Eduardo Bolsonaro: "Pretendo beneficiar o meu filho, sim (...) Se eu puder dar um filet mignon ao meu filho, eu dou". .E a propósito das mudanças que realizou no comando da polícia: "Eu não vou esperar f**** a minha família toda"..Quem vai decidir se essa interferência do inquilino do Planalto na polícia federal resultará em denúncia é Augusto Aras, o procurador-geral da República (PGR)..Como está nas mãos do PGR, Bolsonaro agiu imediatamente: disse que pretende oferecer a Aras uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) - se se portar bem naquele caso, subentende-se..Oferecer um cargo a alguém em troca de uma vantagem qualquer é uma forma de corrupção - também está nos livros..Mas corrupção à antiga, daquela de desviar dinheiro público, tipo Petrolão ou Mensalão, não há no governo, dizem os seus cada vez menos, mas cada vez mais alucinados, apoiantes..Desde logo, Bolsonaro está a cometer um Mensalão a céu aberto: caso Aras se revele impermeável à oferta de uma vaga no STF e avance com uma denúncia contra o presidente, serão os deputados a decidir o seu futuro..Para ter a maioria dos parlamentares na mão, o governo ofereceu no último mês cargos na máquina pública a deputados, parte deles condenados no Mensalão, com orçamento de 66,5 mil milhões de reais [em torno de 11 mil milhões de euros]. Nas últimas horas ainda os presenteou com a criação de um novo ministério, o das comunicações, para se lambuzarem..No entanto, prosseguem os poucos, mas alucinados, bolsonaristas, nos governos de antigamente caíam ministros por suspeita de corrupção - agora não..Aí têm razão. Apesar de ser acusado pela polícia de liderar um esquema milionário de desvio de fundos públicos em torno de candidaturas femininas fantasma às eleições de 2018, o ministro do turismo Marcelo Álvaro Antônio, que já teria sido demitido de qualquer governo sério, continua no cargo..O governo Bolsonaro é uma aula de corrupção..Ah, e a propósito o próprio presidente também é paraquedista de formação..Correspondente em São Paulo